O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu, na semana passada, acabar com a fome até o final de seu mandato, em 2026. Atualmente, cerca de 33 milhões de brasileiros estão em situação de insegurança alimentar grave, segundo dados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Pessan) — representa 15% da população, é quase o dobro de 20 anos atrás, quando era 9,5%. O Correio conversou com especialistas para tentar confirmar se é possível que a promessa do presidente seja cumprida no prazo que estipulou.
Para Sandra Chaves, professora de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e coordenadora da Pessan, a meta é "ousada", mas não é impossível. "Temos gente para trabalhar, solo, água para produzir alimentos. A gente não depende de tantos fatores externos. Há potencial, mas os desafios são imensos. É uma meta que pode ser alcançada", afirma.
A pesquisadora salienta que, se observada a história recente do Brasil, após o lançamento do programa Fome Zero, em 2003, "conseguimos reduzir a proporção de população faminta em torno de 10 pontos percentuais entre 2009 e 2013". "Reduzimos bem naquela época, com o Fome Zero, com Bolsa Família. Começou com 9,5% de população em insegurança alimentar grave e chegou-se a 4,2%. Por isso, o Brasil saiu do Mapa da Fome, da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), em 2013 e 2014", lembrou.
O Mapa da Fome considera um país "livre" da fome quando o percentual da população nessa condição é abaixo de 5%, por quatro anos consecutivos. O resultado é divulgado anualmente em julho, mas, em 2024, o Brasil ainda deve consta da relação divulgada pela FAO.
"Os dados de 2021 e 2022 não mudam mais. Fechamos 2023 com queda, reduzindo o número de pessoas passando fome. Não são mais 33 milhões. Acho que tem chance de ter reduzido e chegado perto de 20 milhões de pessoas que foram protegidas contra a miséria", explicou o ministro Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), em 13 de janeiro, ao Podcast do Correio.
Ele destaca que o reajuste no valor do Bolsa Família, para R$ 686,10, e as novas regras para as famílias monoparentais com crianças e bebês ajudam 13 milhões de pessoas. Por conta disso, crê que o cronograma pretendido por Lula seja factível.
Conjunto de fatores
Maitê Gauto, gerente de Programas, Incidência e Campanhas da Oxfam Brasil, concorda com a percepção do ministro de que as ações de governo alicerçam a meta estabelecida pelo presidente. "Uma coisa que sempre é importante lembrar é de que o Brasil, depois de todo o movimento de saída do Mapa, em 2014, virou referência internacional de políticas de combate à fome", salienta.
Para ela, a pretensão de erradicar a fome no Brasil até 2026 "retoma aprendizados". E ela enumera fatores que facilitam atingir tal objetivo.
"Há a articulação entre programas de aquisição de alimentos, do programa de alimentação escolar, investimento na agricultura familiar, a reconstituição da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e a possibilidade de voltar a fazer estoques públicos de alimentos. Tudo isso vai dando indícios de que a gente está no caminho certo", observa Maitê.
Dados da Rede Pessan mostram que as formas mais severas de insegurança alimentar (moderada ou grave) atingem, majoritariamente, as populações das regiões Norte (45,2%) e Nordeste (38,4%).
Maitê salienta, ainda, que tornar o combate à fome um dos assuntos defendidos pelo Brasil junto à comunidade internacional traz reflexos para dentro do país. "A discussão, no âmbito do G20, da Aliança Global de Combate à Fome e a Pobreza, tende a ser uma cooperação relevante entre países, tanto de troca de experiências no Sul Global, quanto de conseguir captar investimentos dos países mais ricos", frisa.
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