No Dia Internacional da Mulher, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, criticou a criminalização do aborto no Brasil. O tema, um dos mais controversos no país, está paralisado na Corte. Na avaliação do magistrado, a atual lei "não serve para nada". Ele pregou respeito à liberdade reprodutiva feminina.
A declaração foi dada nesta sexta-feira, durante aula magna na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Barroso esclareceu que o posicionamento não é para incentivar a prática, mas, sim, garantir os direitos da mulher.
"Precisamos lutar e conquistar o direito à liberdade sexual e reprodutiva das mulheres. É preciso explicar para a sociedade que o aborto não é uma coisa boa. O aborto deve ser evitado e, portanto, o Estado deve dar educação sexual, contraceptivos e amparar a mulher que quer ter filho", defendeu o ministro, sob aplausos.
Segundo ele, o trabalho tem de ser multi-integrado. "Essa é uma campanha de conscientização que precisamos difundir pelo Brasil para que a gente possa votar isso no Supremo, porque a sociedade não entende do que se trata", frisou.
O magistrado enfatizou que "não se trata de defender o aborto". "Trata-se de enfrentar esse problema de uma forma mais inteligente do que criminalizar o aborto, porque prender mulher não serve para nada."
No início do evento, Barroso se descreveu como um "feminista de longa data" e fez uma homenagem pelo Dia Internacional da Mulher.
"Apesar de ser do sexo masculino, sou um militante feminista de longa data. Quem acompanha minha vida no STF saberá que minha secretária-geral é uma mulher, que a minha secretária-geral no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) é uma mulher, minha chefe de gabinete é uma mulher, portanto na minha vida e no meu gabinete nós vivemos um matriarcado, e tem dias que eu me sinto oprimido", brincou.
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Julgamento travado
Pouco antes de se aposentar, em setembro, a ministra Rosa Weber, do STF, votou pela descriminalização do aborto nas primeiras 12 semanas de gestação. Ela é relatora da ação protocolada pelo PSol que tramita no tribunal desde 2017. O julgamento foi suspenso por pedido de destaque de Barroso. Com isso, prosseguirá em sessão presencial do plenário, sem data definida.
No voto, Weber argumentou que, apesar da competência do Congresso Nacional para legislar sobre o tema, o Judiciário é obrigado, constitucionalmente, a enfrentar qualquer questão jurídica a ele apresentada sobre lesão ou ameaça a direitos, seja da maioria, seja das minorias.
A ministra ressaltou que a decisão pela interrupção deve ser um direito delas. "A mulher que decide pela interrupção da gestação nas 12 primeiras semanas de gestação. Tem direito ao mesmo respeito e consideração, na arena social e jurídica, que a mulher que escolhe pela maternidade", avaliou.
Segundo a magistrada, "essa questão envolve uma das mais íntimas escolhas que a mulher pode fazer ao longo de sua vida, decisão fundamental para a construção da sua dignidade e autonomia pessoal". "O Estado não pode julgar que uma mulher falhou no agir da sua liberdade e da construção do seu ethos pessoal apenas porque sua decisão não converge com a orientação presumivelmente aceita como correta pelo Estado ou pela sociedade, da perspectiva de uma moralidade", acrescentou.
Conforme Weber, a criminalização do aborto perpetua o quadro de discriminação com base no gênero, pois a conduta do homem diante da sua responsabilidade sobre a gravivez não é questionada pela socidade.
"Tanto que pouco — ou nada — se fala na responsabilidade masculina na abordagem do tema. E, mesmo nas situações de aborto legal, as mulheres sofrem discriminações e juízos de reprovação moral tanto do corpo social quanto sanitário de sua comunidade", criticou.
O aborto induzido é crime, com penas previstas de 1 a 3 anos de detenção para a gestante, e de 1 a 4 anos de reclusão para o médico ou qualquer outra pessoa que realize o procedimento. No entanto, em três situações específicas o aborto provocado não é punível pela lei. São elas: gravidez que representa risco de vida à mulher; gestação resultado de um estupro; e se o feto for anencefálico (sem cérebro). Esse item foi julgado pelo STF em 2012 e declarado como parto antecipado com fins terapêuticos.
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