Congresso

Frentes e lobbies do setor privado atuam em GTs paralelos da reforma tributária

Com o argumento de que foram excluídos pela Fazenda dos grupos oficiais, dirigentes de empresas privadas usam estrutura da Câmara, como plenário e até transmissão da TV da casa, para defender suas posições

Setores privados diversos se uniram às frentes parlamentares, com o discurso de que foram deixados de fora pela área econômica do governo do debate sobre a regulamentação da reforma tributária, e criaram o que chamam de Grupos de Trabalho Paralelo (GTs) da reforma. Eles usam a estrutura da Câmara dos Deputados, como plenário de comissão e microfones, e as reuniões chegam a ser transmitidas pela TV oficial da Casa.

Nas duas reuniões que ocorreram até agora na semana passada, pouquíssimos deputados compareceram — na de sexta (23), nenhum deles foi — e a condução da discussão e dos debates fica por conta de representantes de entidades do agronegócio, da mineração, do transporte, do biodiesel e de outros segmentos.

Vários desses participantes são diretores de relações institucionais de seus setorers, que atuam dentro do Congresso Nacional em contato permanente com parlamentares, nas ações de lobby, prática que ocorre há décadas dentro da Câmara e do Senado. Nos discursos nesses GTs há críticas ao Ministério da Fazenda por não tê-los incluídos nos grupos técnicos oficiais da discussão da regulamentação da rerforma, defesa da isenção tributária para os setores, falas sobre convencer os deputados de suas causas e ganhar adesão aos projetos que eles irão apresentar, em concorrência às propostas do governo.

Os encontros dentro do Congresso por esses setores vão se dar sempre às quintas e sextas-feiras, toda semana, até a votação final do complemento da reforma tributária. Estão sendo criados mais de 20 GTs paralelos, cada um com um tema específico, equivalentes aos oficiais instituídos pela equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. São grupos que tratam de imunidades, isenções, biocombustíveis, Zona Franca, entre outos temas.

GT paralelo de imunidades tributárias

As frentes parlamentares de deputados garantiram esse espaço, que está sendo usado pelos setores. Na abertura, por exemplo, compareceram menos de 10 deputados, entre os quais Joaquim Passarinho (PL-PA), coordenador da Frente do Empreendedorismo, e Pedro Lupion (PP-PR), da Frente Parlamentar da Agropecuária. É raro segmentos da sociedade obterem a cessão desse espaço dentro do Congresso por esse tempo, de duração da votação e uma matéria.

O GT paralelo que inaugurou a série de reuniões foi o das imunidades tributárias. O setor privado entende que, pelo resultado de seus negócios e geração de emprego que promove, esses benefícios são uma obrigação do Estado para garantir os bons números da economia.

A advogada tributarista Marcela Guimarães, da Associação Industrial e Comercial de Uberlândia (MG), afirmou na reunião que é fundamental preservar as imunidades tributárias existentes, já previstas na Constituição, segundo afirmou, e falou de sua preocupação com as exportações do agro.

"Nossa grande preocupação é com os resíduos tributários. Não adianta ter imunidade de exportações apenas, quando se fala que o agro é desonerado na saída. Mas tem que se verificar o custo para produzir, desde a energia elétrica aos insumos. Se não tivermos a manutenção do crédito não adianta ter imunidade. É muito caro produzir no Brasil", disse.

A referência é ao ressarcimento de créditos tributários às empresas, como incentivo às exportações. Os setores querem do governo esse ponto bem regulamentado, com estabelecimento de prazo — de até 60 dias — e com punições se não for cumprido.

"Não estamos pedindo favor"

O diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Proteína Animal (Abpa), Marcelo Osório, entidade que representa 130 associados, apresentou números do setor, que gera quatro milhões de emprego em toda a cadeia e 500 mil no chão de fábrica de frigorífico. Ele afirmou que das 10 cidades com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) no país, três acolhem essas indústrias: Lajeado (RS), Toledo (PR) e Concórdia (SC). Osório disse que é uma falácia dizer que a produção de aves, suínos e ovos privilegia a exportação.

"O foco principal é o interno. O externo subsidia, porque paga e remunera muito bem. Ajuda a pagar um peito de frango aqui a preço mais acessível", disse. Segundo ele, a cada 10 quilos de aves comercializada no mundo, 3,7 quilos são produzidas no Brasil.

E cobrou o governo: "Precisamos muito desse reconhecimento do governo. Não estamos pedindo favor, mas reconhecimento. E que as leis complementares sigam dando força ao setor". E falou ainda da necessidade de "influenciar nossos parlamentares, que façam a defesa do setor". O diretor da Abpa disse também que muita vezes o "faturamento é alto, mas o balanço é negativo".

Bruno Toledo, diretor Instiuto Brasileiro de Mineração (Ibram), se referiu à preocupação com exportação, à imunidade, e que, aprovada a reforma, a lei complementar é o maior desafio.

"Agora tem uma lei em branco a ser elaborada e precisamos endereçar esses pleitos. A mineração é dos maiores interessados na desonerarção da exportação. Em termos de minério de ferro só perdemos para China e Austrália (como exportadores). É essencial na balança comercial", disse.

Segundo Toledo, no Brasil se paga entre 4% e 6% de tributos a mais que os concorrentes e é o país com maior carga de exportação em 12 produtos minerais, como bauxita, ouro, nióbio, entre outros. E cobrou regras para o ressarcimento das exportações.

"O discurso do Appy (secretário a Reforma Tributária) sempre foi de garantir a restituição para os exportadores quando não darem vazão ao crédito. Vai estar na lei complementar 60 dias (para pagar), e não cumpriu. E aí? Não tem sanção? Qual será a sanção se não for ressarcido?"

O diretor da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), Fabrício Rosa, também presente, afirmou que o agro precisa ter tratamento diferenciado, e lembrou que o setor representa 24% do PIB do país. Além disso, elencou números e grandes exportações. E lembrou que o agronegócio chegou a esse patamar graças às políticas de incentivo do passado, e citou, entre essas, a Lei Kandir, que reduziu impostos.

"E não podemos derrapar agora, na hora de construir nossa regulamentação da reforma tributária. Tivemos queda de commodities na pandemia, depois voltou ao normal. O cenário não é animador para o setor de grãos, com a crise climática. Digo que R$ 160 bilhões vão deixar de circular na economia. É um ano muito ruim para mexer em tributo."

A exigência de ressarcimento imediato, e no menor prazo possível, pelo governo do crédito de exportação foi também citado por Dalton Miranda, diretor da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). "Um ressarcimento rápido, sem travas", comentou.

A representante da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Andréa Cavalcanti, por sua vez, falou da necessidade da manutenção do Sistema S vinculado à entidade para garantir o atendimento, como de saúde, em locais onde, disse, não chega o Sistema Único de Saúde (SUS).

"O Sistema S é o braço do estado no atendimento, como odontologistas, fisioterapeutas e ações psicológicas. É necessário que isso seja mantido no texto", afirmou.

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