O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli determinou, nesta segunda-feira (5/2), a abertura de investigação sobre a organização não governamental (ONG) Transparência Internacional e a força-tarefa da Operação Lava-Jato. O magistrado solicitou à Procuradoria-Geral da República (PGR) que encaminhe à Corte as investigações do Ministério Público Federal (MPF) a respeito da entidade.
Toffoli considerou que houve possível repasse irregular de R$ 2,3 bilhões para a organização a ONG por meio do acordo de leniência firmado entre o MPF e a empresa J&F, investigada por supostos pagamentos de propina. De acordo com o ministro, deve ser apurada "eventual apropriação indevida de recursos públicos" por parte da Transparência Internacional. Nas redes sociais, a ONG negou ter recebido o repasse e declarou já ter "desmentido" a afirmação "diversas vezes".
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"Verifico que fatos gravíssimos e que não passaram pelo crivo do Poder Judiciário e do Tribunal de Contas da União foram descritos na decisão proferida nestes autos pelo Ministro Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça. Sob o pretexto de desenvolver ações de combate à corrupção, o Ministério Público Federal, de forma ilegal, concedeu à TI (Transparência Internacional) poderes de gestão e execução sobre recursos públicos sem que se submetessem aos órgãos de fiscalização e controle do Estado brasileiro, de modo que existem circunstâncias a ser esclarecidas", conforme trecho da petição do ministro.
O texto ainda estabelece que os documentos enviados pela PGR ao STF sejam repassados também ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Controladoria-Geral da União (CGU). "Tal providência faz-se necessária, especialmente, para investigar eventual apropriação indevida de recursos públicos por parte da Transparência Internacional e seus respectivos responsáveis, sejam pessoas públicas ou privadas", acrescenta Toffoli.
Desde 2014, a Transparência Internacional, sediada em Berlim (Alemanha), tem uma parceria com o MPF para desenvolver ações de "combate à corrupção".
"Febre do desmonte"
Na última semana, a ONG publicou um relatório com o Índice de Percepção da Corrupção (IPC), em que o Brasil apresentou piora na avaliação. A informação gerou uma série de críticas por parte do governo.
O ministro da Controladoria Geral da União (CGU), Vinícius Marques de Carvalho, caracterizou o índice da TI como um "termômetro desregulado". "A própria Transparência Internacional reconhece o desafio de se reconstruir o que foi destruído nos últimos anos. Mas, se a febre do desmonte passou, como é possível que o Brasil tenha piorado? Onde está o problema: no paciente ou no termômetro?", questionou Carvalho, nas redes sociais.
A CGU divulgou uma nota oficial em que argumenta que os resultados da pesquisa devem ser "vistos com cautela", uma vez que "estudos internacionais discutem as limitações metodológicas de índices baseados em percepção".
A presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) e deputada federal, Gleisi Hoffmann, foi mais incisiva nas críticas. "A ONG Transparência Internacional tem longa trajetória de desinformação sobre os governos do PT, mas, no relatório anual divulgado ontem, passaram dos limites. Acusar de retrocesso a indicação dos ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino ao STF, além da escolha de Paulo Gonet para a PGR, revela apenas a má vontade e a oposição política a Lula e ao PT", escreveu no X (antigo Twitter). Segundo o relatório da Transparência Internacional, a indicação desses três aliados da Presidência da República teria contribuído para aumentar a percepção de corrupção no país.
A petição de Toffoli ainda menciona que a entidade teria sido responsável por gerir parte do valor pactuado entre o MPF e a holding J&F, em 2017. A empresa comprometeu-se a pagar R$ 10,3 bilhões como ressarcimento aos cofres públicos, após desvios constatados pela Operação Lava-Jato. O pagamento foi dividido: R$ 8 bilhões para entidades lesadas e R$ 2,3 bilhões à execução de projetos nas áreas da educação, saúde, meio ambiente, pesquisa e cultura. É essa segunda parcela do montante da multa que teria sido destinada à ONG.
Transparência: "Informações falsas"
A ONG Transparência Internacional, em pronunciamento nas redes sociais, afirmou que "são falsas as informações de que valores recuperados através de acordos de leniência seriam recebidos ou gerenciados pela organização".
A ONG ainda disse que "jamais recebeu ou receberia, direta ou indiretamente, qualquer recurso do acordo de leniência do grupo J&F ou de qualquer acordo de leniência no Brasil". "A organização tampouco teria - e jamais pleiteou - qualquer papel de gestão de tais recursos", acrescentou.
"Através de acordos formais e públicos, que vedavam explicitamente o repasse de recursos à organização, a Transparência Internacional-Brasil produziu e apresentou estudo técnico com princípios, diretrizes e melhores práticas de transparência e governança para a destinação de 'recursos compensatórios' (multas e recuperação de ativos) em casos de corrupção. O relatório incluía recomendação de que o Ministério Público não deveria ter envolvimento na gestão destes recursos. O estudo e as recomendações não tiveram e não têm qualquer caráter vinculante ou decisório. O Memorando de Entendimento que estabeleceu esta cooperação expirou em dezembro de 2019 e não foi renovado, encerrando qualquer participação da Transparência Internacional", diz trecho da nota.
A TI ainda considerou as acusações "fake news" e disse que elas "vêm sendo utilizadas há quase cinco anos em graves e crescentes campanhas de difamação e assédio à organização".
"Reações hostis ao trabalho anticorrupção da Transparência Internacional são cada vez mais graves e comuns, em diversas partes do mundo. Ataques às vozes críticas na sociedade, que denunciam a corrupção e a impunidade de poderosos, não podem ser naturalizados", finaliza a nota.
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