O Congresso Nacional retorna nesta segunda-feira (5/2) às atividades com uma agenda cheia e um cronograma curto, por ser ano eleitoral e numa campanha que interessa diretamente a deputados e senadores. Na pauta, temas relevantes, como os vetos presidenciais, a medida provisória da reoneração da follha de pagamento e a regulamentação do uso das redes, caso da inteligência artificial. Mas há divergência entre os presidentes das duas casas. Rodrigo Pacheco (PSD-MG), do Senado, quer estabelecer mandatos para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), tema que Arthur Lira (PP-AL), da Câmara, está em desacordo absoluto.
A sessão solene está marcada para as 15h, e, até o momento, não há previsão da presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A mensagem do Poder Executivo deverá ser encaminhada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, há quem cabe essa missão. O Judiciário também envia sua mensagem, e ambas serão lidas no plenário.
Ausente de três eventos relevantes no mês passado — a solenidade de um ano do 8 de janeiro, a posse de Ricardo Lewandowski no Planalto e na reabertura do Judiciário —, o presidente da Câmara estará de volta ao Congresso. Sua ausência foi recebida como demonstração de "envio de recado", mas também como um gesto desnecessário de indelicadeza.
Insatisfeito com o Palácio do Planalto, Lira tem feito críticas pesadas à atuação do ministro Alexandre Padilha, da Secretaria de Relações Institucionais. Entre os 28 vetos presidenciais a serem analisados, está o que derruba trechos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e cortou R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão. O relator do Orçamento de 2024, o deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP), já trabalha para derrubar o veto de Lula.
No projeto enviado ao Congresso, o governo destinou R$ 11,3 bilhões para as emendas de comissão e, durante os debates, os parlamentares elevaram o valor para R$ 16,7 bilhões. As emendas parlamentares também foram turbinadas e, em ano de eleições municipais, tiveram montante recorde de cerca de R$ 53 bilhões na peça orçamentária.
O líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), afirmou ao Correio que será debatido o veto ao calendário de pagamento de emendas parlamentares, individuais e de bancada — que fixava o pagamento integral até 30 de junho de 2024 e que o parlamentar avaliou como "inadequado, porque estamos sob um regime presidencialista". "Não é possível o Parlamento definir o calendário de pagamento de emendas sem a devida expectativa de receita", disse.
"Outro veto (a ser debatido) é relativo aos (quase) R$ 6 bilhões do Orçamento. Nós temos uma circunstância, tivemos uma inflação menor, temos que discutir como se adequar. Vamos debater com o Parlamento que para a continuidade da organização do Orçamento público, da obra que o ministro Haddad está conduzindo, é necessária a manutenção desses dois vetos", declarou Randolfe.
Folha de pagamento
Além de vetos, 20 medidas provisórias (MP) aguardam a análise dos deputados e senadores, entre elas a que reonera a folha de pagamento de 17 setores da economia, editada no fim do ano passado. O impasse no tema veio desde a aprovação da prorrogação do benefício até 2027, em novembro do ano passado. Lula vetou integralmente o texto e, em dezembro, o Congresso ganhou a queda de braço e derrubou o veto.
Promulgada pelo presidente do Congresso, a lei beneficia empresas ao substituir o recolhimento de 20% de imposto sobre os salários por alíquotas que variam de 1% a 4,5% da receita bruta. Pacheco articulou junto a Lula e ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a revogação do trecho da MP que trata da questão. "A minha preferência foi pela saída através do diálogo e da construção política com o ministro Haddad e o presidente Lula. Há o compromisso do governo federal de reeditar a medida provisória para revogar a parte que toca a folha de pagamento. Esse é o compromisso político que fizemos", disse Pacheco.
Randolfe fez coro ao presidente do Senado e disse que o governo está "disposto a dialogar e fará todos os ajustes necessários para o diálogo". "Seja por medida provisória, por reedição de medida provisória, seja ajuste de projeto de lei. Todos os caminhos necessários para o diálogo estão dispostos."
A MP de reoneração da folha poderá receber emendas até esta quarta-feira. Depois, entra em regime de urgência e tranca a pauta de votações da Câmara ou do Senado a partir de 18 de março. Caso não seja prorrogada por mais 60 dias, ela perderá a validade no dia 1º de abril.
Metade das MPs a serem analisadas trata de créditos extraordinários para diversos órgãos públicos. Juntas, as matérias somam mais de R$ 96 bilhões e a maior parte dos recursos está concentrada em apenas uma proposição, que destina R$ 93,1 bilhões para a quitação de precatórios (1.200/2023). Os precatórios são ordens de pagamento expedidas pela Justiça após o trânsito em julgado de ações perdidas pelo poder público.
Outro destaque é a medida que prevê mais de R$ 879,2 milhões para compensação aos estados e Distrito Federal pela queda de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). As MPs têm vigência de 60 dias e podem ser prorrogadas por igual período. Elas deverão ser debatidas em comissões mistas, bem como pelos plenários da Câmara e do Senado. Após 45 dias contados da edição, se não tiver sido apreciada pelas duas casas, a MP tranca a pauta de votações de onde estiver sendo examinada.
Câmara tem 8 comissões 100% atingidas
Os vetos do presidente Lula à Lei Orçamentária de 2024 atingiram o montante de R$ 5,6 bilhões, recursos retirados das emendas de comissões temáticas da Câmara, do Senado e do Congresso. Esse valor corresponde a 33,5% do total de emendas propostas por essas comissões, que foi de R$ 16,6 bilhões.
Levantamento feito por consultores das duas casas mostram que oito comissões permanentes da Câmara tiveram a totalidade de suas emendas vetadas. São elas: Turismo (R$ 950 milhões), Minas e Energia (R$ 237,5 milhões), Trabalho (R$ 137,5), Previdência e Assistência Social (R$ 126 milhões), Indústria, Serviço e Comércio (R$ 14 milhões), Desenvolvimento Econômico (R$ 2,1 milhões), Defesa do Consumidor (R$ 800 mil) e Finanças e Tributação (R$ 600 mil).
Se considerar valor total, a Comissão de Desenvolvimento Urbano foi a mais atingida, com o veto de R$ 1,38 bilhão, montante que representa 99% do que foi aprovado pelo Congresso para esse colegiado, que ficou com apenas R$ 20 milhões.
Somente quatro comissões não tiveram um centavo sequer vetado pelo Executivo: Saúde (R$ 4,5 bilhões em emendas), Educação R$ 180 milhões, Amazônia (R$ 9 milhões) e Cultura (R$ 7,9 milhões).
Nas razões do veto, o Executivo argumentou, "em que pese a boa intenção do legislador no sentido de direcionar recursos a áreas de legítimo interesse das comissões autoras das emendas", que outros programas "relevantes e que demandam recomposição" ficariam comprometidos.
Há outros dois tipos de emendas parlamentares, que são as emendas individuais obrigatórias, previstas em R$ 25 bilhões, e as emendas de bancadas, do total de R$ 11,3 bilhões). Essas duas variações não sofreram modificação de valores. A Lei Orçamentária deste ano prevê valores totais de cerca de R$ 5,5 trilhões.
Lira retorna insatisfeito com Lula
As relações entre o presidente da Câmara, Arthur Lira, e o presidente Lula estão envenenadas. O pivô é o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), com quem Lira negociou a aprovação de matérias de interesse do governo. Os acordos não foram cumpridos por Lula e a insatisfação de Lira está se expressando por meio de gestos e não de declarações.
A ausência na posse do novo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, teve esse significado, assim como não ter comparecido à abertura dos trabalhos do Judiciário, um recado ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, de que há insatisfações na Câmara com decisões do ministro Alexandre de Moraes contra parlamentares, como a busca e apreensão no gabinete e na residência oficial do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ).
Lula e Lira não se encontram desde o ano passado. O veto presidencial de R$ 5,6 bilhões às emendas de comissão ao Orçamento da União não foi digerido pelo presidente da Câmara. A decisão teve boa repercussão na opinião pública, mas péssima no Parlamento. De igual maneira, o entendimento da Receita Federal de que as igrejas evangélicas têm que pagar tributos sobre a remuneração de seus ministros e pastores. A bancada evangélica tem mais de 200 deputados, contra 130 governistas.
Lira argumenta que o governo não tem do que se queixar, porque o Congresso aprovou a agenda econômica do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sobretudo a reforma tributária, o novo arcabouço fiscal, a transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para o Ministério da Fazenda (MP 1158/23) e o voto de minerva do governo no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
A narrativa de que a ampulheta de Lira virou, de parte dos deputados governistas, também incomoda o presidente da Câmara, que se queixa da antecipação de sua sucessão, desde o ano passado. Em resposta, Lira argumenta que a do governo também, pois terá muita dificuldade para aprovar medidas, como a regulamentação da reforma tributária e a mudança no Imposto de Renda, em meio a eventos que esvaziam o funcionamento do Congresso, entre os quais o carnaval, a Semana Santa, as festas juninas e as eleições municipais.
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