Ao se despedir, ontem, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o ministro Flávio Dino criticou o monitoramento irregular de autoridades. Tal como acusa a Polícia Federal (PF) de que o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o hoje deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), esteve por trás da espionagem ilegal de autoridades, a serviço do ex-presidente Jair Bolsonaro. Dino salientou que esse monitoramento "fere um direito fundamental" e é flagrantemente inconstitucional.
"Ninguém, absolutamente ninguém, de qualquer que seja a instituição, tem apoio normativo jurídico para escolher, arbitrariamente, quem vai ser investigado, vai ser perquirido, vai ser analisado, vai ter a sua privacidade invadida", criticou.
Ao ser indagado sobre os riscos de ter-se criado, na gestão de Ramagem uma Abin "paralela", que agiria de acordo com os interesses de Bolsonaro, Dino observou que monitoramentos de pessoas são permitidos no Brasil, mas desde que tenham autorização judicial. "Não estamos diante de um tema banal. Estamos diante de um tema crucial, porque fere um direito fundamental. Não sabemos, ainda, quantas pessoas foram monitoradas, se foram dezenas, centenas, milhares — isso a investigação vai dizer. Mas é importante considerar que isso é uma ilegalidade. Quando membros dessa instituição (Abin) se apropriam indevidamente dela para praticar ilegalidades, é algo realmente que merece reprovação", ressaltou, para acrescentar:
"Temos que lembrar que vigora no Brasil uma Constituição, que tem como um dos direitos fundamentais a privacidade. E há, em razão disso, uma série de instrumentos de preservação desse direito fundamental", frisou.
Dino elogiou o trabalho das instituições que conduzem a investigação sobre a atuação de Ramagem. "A Polícia Federal, o Ministério Público, o Supremo Tribunal Federal têm agido muito bem, com prudência, com responsabilidade, com fundamentos, para fazer as investigações necessárias. E, assim, separar o joio do trigo e preservar o direito de defesa", salientou.
Comércio
O futuro 11º ministro do STF fez questão de registrar que "o Brasil vive a plenitude democrática, amadurecimento das instituições, da Constituição". E alertou para a possibilidade de que empresas privadas estejam envolvidas em esquemas de bisbilhotagem e vendendo tais serviços.
"Por isso mesmo, não pode ser banalizada uma invasão de privacidade, uma espionagem, como se fosse algo próprio da política. Não é. A política não abrange o uso de ilegalidade dessa natureza", observou.
Pouco antes, na cerimônia de despedida do ministério, Dino atacou a facilitação ao acesso a armas de grosso calibre e munições implantada pelo governo Bolsonaro. Classificou a norma como "demagógica e irresponsável".
"Diziam que se acabasse com o armamentismo, a violência iria explodir. Não explodiu, muito pelo contrário. Mostramos que determinados crimes, infelizmente, foram alimentados, a exemplo do feminicídio. Mostramos, também, que as organizações criminosas foram fortalecidas, uma vez que se aplica a lei da oferta e da procura no acesso a esse instrumento de trabalho ilícito", lamentou.
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