Mesmo a um ano de deixarem os cargos de comando que ocupam no Congresso Nacional, os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), traçam planos e projetos para 2024, mas de olho num futuro que vai bem além. Ambos começam a cuidar também de suas sucessões nas duas presidências e, no meio do caminho, tem a eleição de prefeitos e vereadores, que consome tempo e esfria os trabalhos e as votações parlamentares.
Pacheco lista uma série de propostas que pretende colocar na pauta de votação do Senado e não economiza nas pretensões. O senador mineiro anunciou, em entrevista ao Correio em meados de novembro, que está no seu horizonte votar o fim da reeleição para cargos no Executivo. Ele também deseja pautar a emenda constitucional que limita e estabelece mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Ainda quer criar um "filtro" para impedir que partidos com composição inexpressiva acionem a Corte para alterar leis e projetos aprovados no Congresso Nacional. O parlamentar chama de "cláusula de barreira" contra legendas nanicas.
Desse "pacote" de Pacheco, Lira não concorda com todas as propostas. O presidente da Câmara é contra mandato para ministros do STF e considera não ser hora de mexer com o direito de chefes dos Executivos de se reelegerem. Há convergência sobre impor restrições a pequenos partidos de ajuizarem ação de grande vulto na Suprema Corte.
Lira quer priorizar outras temas, como a regulamentação da Reforma Tributária, um trabalho que, estima, vai ocupar boa parte do tempo neste primeiro semestre. E pretende mexer na reforma administrativa, para ele um "tema urgente".
O presidente da Câmara ainda é cobrado por parlamentares que o elegeram que vote propostas de suas autorias, para mostrarem resultado nas bases eleitorais num ano importante para garantir eleição de prefeitos, que formam suas redes de apoio na tentativa de reeleição em 2026.
Entre os temas prioritários para Pacheco, o que causa apreensão e críticas entre parlamentares governistas é sua disposição de acabar com a reeleição para chefes do Executivo, que atinge os cargos de prefeito a presidente da República, e dar-lhes um mandato único de cinco anos. O senador está empolgado com a ideia.
"Vou me dedicar muito a esse assunto em 2024, para se ter mandato de cinco anos para o Executivo. Se atingir isso, terei o sentimento de dever cumprido. Preservando os que estão no mandato. Considero o fim da reeleição uma grande realização para o país", ressaltou Pacheco ao Correio. "Acaba com o sentimento de que alguém entra no mandato sempre pensando na reeleição e deixa de tomar decisões corretas e devidas. Temos de acabar com este estado permanente de eleição que vive o Brasil. Termina uma eleição e começa outra."
- Congresso avança na ofensiva contra o Supremo Tribunal Federal; entenda
- Barroso após ofensiva do Congresso: "Não é hora de mexer no STF"
- Presidente do Senado aposta em reforma eleitoral mais ampla
Reeleição
Lira diverge de Pacheco sobre a reeleição. Não diz isso abertamente. Acha cedo para abrir a divergência em público. A quem o pergunta sobre essa meta do senador mineiro, de colocar fim à reeleição, responde com uma certa ironia: "Acho justo".
Quem não gostou da disposição de Pacheco em levantar essa pauta foi a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), que acumula querelas com o senador. Ela tinha criticado também a proposta de emenda à Constituição (PEC) que restringe decisões monocráticas de ministros do STF e acusou o parlamentar mineiro de "fazer o serviço da extrema direita". Sobre o fim da reeleição, a petista frisou que, mesmo que seja para valer só a partir de 2030, a proposta "é oportunista e representa um retrocesso na representação democrática da maioria da população".
Do outro lado do Congresso, Lira arrisca menos na ousadia das pautas que pretende votar e quer seguir usufruindo da decisão histórica que foi a votação da Reforma Tributária, pela primeira vez aprovada no regime democrático.
"Temos um Congresso reformista e liberal, ainda que tenha uma grande maioria conservadora. Construímos um texto de consenso, ainda que não seja perfeito, mas foi o possível" declarou Lira após a aprovação.
Ele anunciou que o tema seguirá relevante neste ano. "Temos a missão de fechar essa legislação, de calçar a lei para que entre em vigor e assegure que quem ganha mais, paga mais e quem ganha menos, paga menos", afirmou o presidente da Câmara. O deputado pretende criar um grupo de trabalho para regulamentar a reforma.
Limite
O STF vai voltar à pauta do Senado. Depois da aprovação da emenda constitucional que restringe ações isoladas de ministros — votada no Senado, mas longe de entrar na mira da Câmara —, Pacheco quer limitar mandatos na Corte. Ele acredita que a chance de ser aprovada é grande. Se, de fato, passar entre os senadores, difícil que Lira trate do tema no final de sua gestão. O presidente da Câmara não quer arestas com o tribunal.
Pacheco defende uma emenda do senador Plínio Valério (PSDB-AM) que tramita na Casa e prevê mandato dos magistrados de oito anos, sem direito à recondução. Lira é contra.
"Imagine uma pessoa que vá para o STF com 44, 45 anos, que sabe que vai sair com 55. O que é que vai se esperar de isenção de julgamento de alguém que sabe que, em 10 anos, vai sair com 55 anos, em plena atividade?", argumenta Lira.
O deputado está decidido a mexer com outro tema: a regulação que envolve a inteligência artificial. Pretende aprovar legislação capaz de colocar freio e determine regras no uso dessa tecnologia. O parlamentar relatou a interlocutores ter receio especial da difusão desse recurso técnico nas eleições deste ano, quando serão eleitos novos prefeitos e vereadores país afora.
Na avaliação do presidente da Câmara, IA é uma "evolução das fake news" e "uma terra sem lei", que precisa de um regramento muito duro. O temor é de que, na campanha eleitoral, o recurso desvirtue os fatos e até mesmo crie declarações e falas de políticos, por exemplo, não condizentes com a realidade.
Lira e Pacheco têm um ponto convergente. Ambos concordam que está muito flexibilizado o direito de um partido nanico recorrer ao STF contra uma lei aprovada pelo Congresso.
A respeito do assunto, o senador já anunciou: "É preciso restringir o acesso ao STF. Pensar que uma lei votada no Congresso Nacional pode ser questionada por um partido que representa uma minoria de poucos parlamentares?"
O deputado também defende a restrição. Desde 2019, ao menos 30 ações de iniciativas dessas legendas de menor expressão resultaram em decisões importantes, como o fim do orçamento secreto. "Temos que subir o sarrafo nas proposições dessas ações", enfatizou Lira.
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br