Entrevista

"Democracia exige constante vigilância", diz Luis Felipe Salomão

Ao analisar os ataques de 8 de janeiro, quase um ano depois, corregedor nacional de Justiça considera que a afronta fortaleceu ainda mais as instituições. Ele ressalta, porém, que existem limites muito claros para o posicionamento político de juízes

Juiz desde 1990, Salomão avalia que a grande maioria dos magistrados é vocacionada e dedicada, mas um pequeno número de colegas acaba, como ele diz, derrapando -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press)
Juiz desde 1990, Salomão avalia que a grande maioria dos magistrados é vocacionada e dedicada, mas um pequeno número de colegas acaba, como ele diz, derrapando - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press)
postado em 17/12/2023 03:55

Corregedor nacional de Justiça, o ministro Luis Felipe Salomão está à frente da correição da 13ª Vara Federal de Curitiba, por onde passaram os processos da Lava-Jato. Assim que assumiu o cargo, o magistrado herdou mais de 30 representações relacionadas a supostas falhas na instância que foi comandada pelo então juiz Sergio Moro.

Moro deixou a magistratura para ingressar na política em 2018, mas não está livre de eventuais punições, como explica Salomão nesta entrevista ao Correio. O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é discreto e evita fazer comentários sobre casos em andamento ou temas que considera que não estão na sua alçada, como debates travados no Congresso Nacional. Mas dá pistas do que pode acarretar punições na 13ª Vara de Curitiba: falta de controle de bens apreendidos e de recursos bloqueados; processos graves envolvendo homicídios e crime organizado deixados em segundo plano.

Juiz desde 1990, Salomão avalia que a grande maioria dos magistrados é vocacionada e dedicada, mas um pequeno número de colegas acaba, como ele diz, derrapando. O maior problema que chega à Corregedoria Nacional é a demora na solução de processos. Há casos mais graves, contudo, como venda de sentenças. E um dos temas do momento é a participação indevida de juízes em comentários e engajamentos políticos nas redes sociais.

O trabalho de corregedor no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também tem impactos sociais. Salomão participou de duas campanhas de cidadania, relacionadas aos cartórios: de registro civil, especialmente de pessoas em situação de rua; e de regularização fundiária. Em 2024, a meta é criar um aplicativo, em parceria com o Ministério da Saúde, para facilitar a doação de órgãos.

Para o ministro, o Judiciário tem cumprido seu papel, como defensor das garantias e direitos e da democracia. "Dizem que o lugar simbólico da democracia passou a ser o Poder Judiciário, porque é lá que você resolve os conflitos, é lá que você preserva muitas garantias, muitos direitos", argumenta. Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Pelas suas mãos passaram vários processos disciplinares, inclusive, com decisões de afastamento cautelares de juízes. O que o senhor viu de mais grave?

Eu já tenho uma larga trajetória na magistratura. Comecei como juiz substituto no Rio de Janeiro. Depois fui juiz titular, desembargador, ministro do STJ e ali eu passei também por várias funções. E sempre me vi muito participante desse sistema de justiça. Minha vida é dentro do Poder Judiciário. Sempre tive convivência também com a parcela muito significativa da magistratura que é muito idealista, muito engajada, muito participativa. A grande maioria está nisso por vocação, por ideal.

Não dá para ser juiz sem uma vocação…

Não dá, realmente. Aí quando você vem para a Corregedoria, que é uma experiência que estou tendo há pouco mais de um ano, é diferente. Porque você enxerga uma parte — muito pequena, na verdade — que não é tão boa da magistratura. Aprender a lidar com isso foi um aprendizado para mim, mas uma experiência também muito grande. Estou conhecendo todas as faces do Poder Judiciário, vamos chamar assim.

E quais são os principais problemas?

Como eu disse, a grande maioria, a estrondosa maioria, é muito engajada, muito participativa, muito vocacionada, muito produtiva. É só uma pequena parcela, ínfima, que compromete os seus deveres, que desliza, que derrapa.

O lado negativo acaba manchando trabalho que é muito maior?

Não chega a manchar, mas a causar uma decepção em algum sentido, porque a gente acreditava e acredita que 100% é engajado, 100% é idealista, 100% trabalha por vocação. Quando a gente descobre que outro não está nisso, a gente se decepciona um pouco. Mas é uma quantidade pequena de derrapagens. São 18 mil juízes no Brasil, 500 mil servidores só no campo judicial, fora o extrajudicial, fora todo o aparato que circunda o Judiciário. Nesse período, o CNJ abriu 50 procedimentos, afastou cerca de 20. É um número pequeno.

O que mais motivou esses afastamentos?

O grosso que chega de reclamação é por morosidade, atraso na aprovação de sentença, despacho, andamento dos processos, embora a nossa média de duração de processo no Brasil não seja tão fora da realidade do mundo. Esse tema da morosidade é do mundo inteiro. A gente não consegue dar a solução para o caso sempre que a gente quer.

Qual é o prazo razoável para
uma sentença?

Um parâmetro apenas: quando o processo fica mais de 100 dias sem uma movimentação efetiva, a gente passa a interferir e acompanhar de perto. Então, o marco seriam 100 dias. Mas a lei não fixa esse prazo, só diz que a sentença tem que ser num prazo razoável. Nas reclamações que a gente recebe, são muitas, a grande maioria quanto a morosidade. O que sobra são variadas as reclamações. Tem desde denúncia de venda de sentença até conduta irregular na rede social.

Qual é o limite da manifestação de magistrado nas redes sociais?

Nós fizemos uma pesquisa sobre o perfil do magistrado brasileiro, com o professor Luiz Werneck Viana. Basicamente o juiz é oriundo da classe média e convive em sociedade. Ele leva os filhos ao colégio, participa das festas do condomínio, tem uma vida de classe média normal. E, portanto, ele sofre essa influência da revolução que a gente está passando, que é a revolução tecnológica, a revolução das redes sociais, a revolução da comunicação instantânea. Ele participa disso como qualquer pessoa.

Inclusive, pode ser cooptado pelo poder que as redes sociais dão, de falar para muita gente ao mesmo tempo e influenciar o pensamento dessas pessoas?

Aí já é outra questão, porque o modelo de negócio das redes sociais é a polarização. Mas o juiz integrante dessa comunidade, parte dessa vida social, acaba se manifestando também, tendo rede social, tendo participação na sociedade. O que se espera do juiz? Que ele tenha atuação na rede social igual à vida real dele. Você não imagina juiz participando de comício ou de uma atividade política. Se ele não pode na vida real, também não vai poder na vida virtual.

Há limites, portanto.

A lei impõe alguns parâmetros para ele se comportar na vida diária dele. E no campo virtual, a mesma coisa. Ele não pode agir de forma diferente porque está atrás de uma máquina. Não vai mudar a autoridade dele, não vai deixar de ser juiz, não vai deixar de ter a responsabilidade. Então, por exemplo, quando, na rede social, ele se manifestar politicamente, está incidindo numa vedação. Há uma vedação para ele atuar politicamente, há uma vedação para ele se manifestar sobre casos que estão sendo submetidos ao julgamento dele. Então, tem toda uma regra que a Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) proíbe.

Houve casos concretos.

Tivemos um caso nesta semana que foi emblemático, muito simbólico, porque o juiz se engajou numa campanha eleitoral na última eleição presidencial. Fez postagens a favor de candidato, postagens bem pesadas, de apoio a esse candidato, sendo ele desembargador do Tribunal Trabalhista. O CNJ aplicou uma pena dura, que foi a de colocá-lo em disponibilidade por 60 dias. Ele fica afastado, já teve as redes sociais bloqueadas. Foi um recado muito simbólico que o CNJ deu, à unanimidade, para dizer que, na campanha eleitoral, juiz que se manifestar, que tiver posição política, vai sofrer uma punição severa.

No Tribunal Regional Eleitoral do DF, um desembargador criticou o ministro do STF Alexandre de Moraes e defendeu o então presidente Bolsonaro…

Nesse caso, nós instauramos o procedimento, e o fato também de ele se aposentar ou se exonerar da carreira não impede o prosseguimento do processo administrativo. Senão seria fácil. O sujeito se aposenta e deixa de responder ao processo. Não é assim. Ele continua responsável pelos atos que praticou durante o exercício da função de juiz.

Uma das críticas da sociedade é de que a punição mais severa para um juiz é a aposentadoria compulsória. O magistrado se aposenta, mas continua recebendo os vencimentos, independentemente do que ele fez… Qual a sua opinião?

Há muita desinformação porque, primeiro, essa regra está prevista numa lei. É o Parlamento que faz a lei, não é o juiz. É a Loman. Nada impediria que se alterasse a lei. Mas ainda assim, o que a sociedade acaba não compreendendo direito é que a aposentadoria é uma decorrência do que o juiz contribuiu. Ele vai se afastar da magistratura, não vai poder mais trabalhar, além de ter a pecha de ter sido aposentado forçadamente. A pensão que ele vai receber é porque ele contribuiu. Você já imaginou o réu lá na Justiça Criminal é condenado por roubo, por assassinato e aí cassam uma pensão dele do INSS… E se houver uma ação judicial, penal, por exemplo, pode sim haver perda do cargo. Quem é que pode mover essa ação? O Ministério Público.

A democracia brasileira está garantida pelo Poder Judiciário?

O Poder Judiciário que emergiu da Constituição de 1988 é considerado paradigma no mundo todo. As garantias da magistratura, o orçamento próprio, autonomia administrativa, as promoções são feitas internamente, você não depende politicamente de praticamente nada para a subida na carreira. Isso tudo vai conferindo uma estrutura de independência muito grande. A estrutura do Poder Judiciário confere uma estabilidade muito grande para esse período da democracia. Então, não é à toa que toda essa disputa que acontece nas questões políticas, da vida social, foi levada para o Judiciário. Alguns sociólogos, filósofos dizem que o lugar simbólico da democracia passou a ser o Poder Judiciário, porque é lá que você resolve os conflitos; é lá que você preserva muitas garantias, muitos direitos. O guardião desses direitos é o Poder Judiciário. Por isso também, o reverso da medalha é que você tem 81 milhões de processos tramitando. É um pouco vítima do sucesso que a Constituição de 1988 promoveu. Temos 30 milhões de processos novos por ano. Nenhum outro país tem uma carga dessas de processo.

Parte da sociedade vê o Supremo poderoso demais. Como avalia esse movimento?

Com o movimento que a Constituição de 88 fez, de entregar ao Poder Judiciário a tarefa de resolver uma série de conflitos de interesse, é mais do que natural o protagonismo do Poder Judiciário, que não é característica só do Brasil. No mundo inteiro, depois da Segunda Grande Guerra, quando não se resolveram os conflitos na base dos tribunais internacionais, resolveu-se com uma guerra. A partir dali você tem uma guinada no mundo todo de protagonismo do Poder Judiciário. Tanto que vários autores falam que esse é o século do Poder Judiciário. Teve o século do Legislativo, o século do Executivo. Esse é o século do Poder Judiciário, dada essa emergência de solução de conflitos. Então, esse espaço, esse protagonismo que o Judiciário ocupa é natural.

O 8 de janeiro vai completar um ano, o Supremo Tribunal Federal foi um dos Poderes mais atacados. Como avalia a reação a esse golpismo?

As instituições funcionaram. Prova disso é que um mês depois, o tribunal abriu. O ano do Judiciário funcionou, a Justiça não parou um dia sequer. Foi uma demonstração inequívoca da força das nossas instituições. O parlamento também não parou. O Executivo abriu no dia seguinte. Claro que foi uma nota triste o evento do dia 8. Uma nota trágica dentro da retomada democrática, mas não implicou nenhuma vírgula em retrocesso. Ao contrário, fortaleceu o sistema da democracia.

Qual foi sua reação ao ver aquelas imagens?

Como corregedor do CNJ, acompanhei essa situação. E antes, como corregedor na Justiça Eleitoral, acompanhei de perto a eleição e a campanha eleitoral. O que aconteceu ali, na minha visão, é que a Justiça Eleitoral teve papel importantíssimo de guardiã da democracia. Realizou as eleições sem uma linha de impugnação, diplomou os que foram eleitos e na sequência foram empossados. A partir dali, pelo menos de boa parte dos integrantes do Poder Judiciário, nossa missão estava cumprida e bem cumprida. Então, nós ficamos relativamente tranquilos. Foi nesse período que essa turma radical se aproveitou e realizou aqueles atos trágicos que, como eu disse, não implicaram em nenhum momento retrocesso, mas fortaleceram e deram visibilidade para o nosso sistema, que ainda se mantém vigilante o tempo todo. Não podemos relaxar um minuto. A defesa da democracia exige uma permanente vigilância.

Em algum momento o nosso país correu risco de golpe?

Como eu disse, estávamos numa situação com as instituições cumprindo bem o seu papel. A questão política fica para os partidos. Eu procuro não me meter como juiz. O que eu vi foram as instituições fortes, sobretudo o Poder Judiciário, garantindo o papel da democracia.

Os ministros do Supremo reagiram ao projeto que trata das decisões monocráticas que suspendem leis. Qual a sua avaliação?

Esse é tema entregue ao Parlamento. É o Parlamento que tem que resolver.

E a questão dos mandatos para os ministros do STF?

Complexo esse tema. Acho que é debate que o Parlamento tem que fazer ouvindo o Judiciário.

Como o senhor vê a ainda pequena participação das mulheres na estrutura de decisões do Judiciário?

Esse ano, foi a primeira vez que o CNJ em Números, que é uma radiografia do Judiciário, teve um levantamento somente sobre participação de mulheres, no passado. Detectou que, na década de 1990, houve um crescimento de ingressos de mulheres na estrutura via concursos. A curva era ascendente. Já nessa última pesquisa, 20 anos depois, percebemos que aquela curva que estava subindo já não está subindo tanto. As mulheres não estão ingressando no concurso da magistratura como ingressaram antes.

Por quê?

Variados são os motivos. Tem outras carreiras que estão atraindo mais, sem tanta responsabilidade, sem tanta mobilidade. Porque também tem que ir para o interior. Quem tem filhos, marido, tem uma situação toda peculiar. Então, (as mulheres) não estão ingressando tanto. Não está havendo o que eles chamam de uma feminilização da magistratura. E um outro aspecto, o estudo detectou lá atrás, nos anos 1990, a chamada juvenilização da magistratura, ou seja, muita gente nova entrando. Essa curva também não está na mesma situação. Não tem mais uma alta em nenhum dos dois.

E a progressão na carreira?

Ainda há ingressos pela via do concurso, de mulheres, já não tão intenso quanto antes, mas ainda existe ingresso. O que não está acontecendo é a subida para os tribunais. Em postos de comando nos tribunais. E aí entra o CNJ, com as suas políticas públicas para facilitar esse acesso, até que haja uma paridade. Veio a resolução recente tratando desse tema. O CNJ contribuiu decisivamente para vários outros aspectos dentro dessa política de valorização feminina. Por exemplo, políticas que agora impõem uma composição igualitária dentro dos servidores do CNJ. Temos políticas de enfrentamento como nos casos de violência doméstica. Primeiro, o CNJ traçou uma meta para julgamento das questões que envolvem violência doméstica dentro do Judiciário. E, agora, a corregedoria abriu um canal para facilitar a denúncia de violência doméstica dentro do próprio Poder Judiciário.

Sobre a Lava-Jato. Quais são as falhas na operação?

Existiam várias representações aqui envolvendo personagens lá da atuação na 13ª Vara Federal (de Curitiba) e também na turma julgadora. Tinha a representação contra o juiz que atuou, o juiz que estava atuando, o juiz que passou por lá antes. Desembargadores que participaram da Turma Recursal. Tinham aproximadamente 30 representações como essas envolvendo diversos personagens. Nós nos reunimos aqui, quando assumi. Tudo estava ali para ser encaminhado, para ser resolvido. Eu falei: 'Olha, antes de resolver as representações como um todo, é melhor eu fazer uma correição na vara para identificar o que está acontecendo e encaminhar soluções da vara e desses procedimentos internos'. Evidentemente, eu não vou analisar as decisões que foram tomadas, que delas cabem recursos. Do recurso, cabe outro recurso. Esse não é o meu papel.

Qual era o propósito, então?

Meu papel era ver o funcionamento anterior; se teve algum deslize administrativo, falha administrativa. Meu papel é apurar, responsabilizar quem praticou e corrigir para que a vara funcione bem. Essa é a minha participação. Então, resolvi fazer a correição. Fazendo a correição, eu já divulguei um relatório. Ele é público. Foi meu primeiro relatório, parcial ainda. Mas ali são apontadas várias falhas administrativas da vara, especificamente, e da própria secretaria das turmas julgadoras também.

Que tipo de falhas?

Eu aponto o que estava acontecendo, como, por exemplo, a questão dos bens que foram apreendidos. A questão dos valores que foram destinados. Tudo aquilo estava sendo feito sem um controle efetivo, sem uma fiscalização mais de perto. E valores muito expressivos, que ainda estão depositados lá e que precisam ser examinados. Então, por isso que eu também estou continuando com a correição para apurar.

Como está a situação agora?

A vara está caminhando bem melhor. Foram sanados vários processos que estavam atrasados. Dois júris que estavam para ser realizados, que não tinham nada a ver com Lava-Jato, envolviam homicídios dentro do presídio federal de lá. Júris que eram atribuídos ao PCC. Crimes entre facções que os julgamentos não eram realizados; centenas de processos que aguardavam julgamento das sentenças. Houve uma força-tarefa de servidores para a vara. Estamos fazendo toda esse levantamento de cooperações internacionais e, ao final disso, vamos verificar se alguém cometeu a falha funcional e aplicar a penalidade.

Mas Sergio Moro não é mais juiz.

Se, ao tempo do fato, ele era juiz, vai responder pelo fato. Eu não estou dizendo que vai ser aplicada a pena ou não vai ser aplicada. Se ele se aposentou voluntariamente, a pena pode ser convertida em aposentadoria compulsória, com a redução de valores. Se, eventualmente, foi uma exoneração, isso pode gerar inelegibilidade ou cassação, dependendo das circunstância.

Cassação de mandato?

Se houver uma punição administrativa, pode ter consequências na esfera eleitoral.

Como o senhor explicaria ao cidadão comum como deve ser a relação entre juiz, advogado
e o Ministério Público?

Não sou eu quem diz. É a lei quem diz como o juiz deve agir. E a lei diz que ele deve manter, na vida pública ou na vida privada, discrição, ponderação, equilíbrio. Essa é a imagem que se espera de um magistrado. É a imagem que se tem do magistrado. Então, por isso que a lei proíbe ele de dar entrevista sobre um caso que está sob a jurisdição dele. Ele pode falar sobre o Judiciário, como nós estamos conversando aqui, sobre as ações da corregedoria, mas eu não posso falar sobre um processo que está sob a minha apreciação. Então, quando se extrapola esse ideal, dessa imagem ideal do magistrado, se comete ou se pode cometer uma infração disciplinar.

E frente ao Ministério Público, como deve ser essa relação, mais formal?

Com todos, né. A lei quem diz que tem que manter distância, equilíbrio, ponderação.

Conversas por aplicativo entre procurador e juiz, por exemplo, sobre um processo, pode ser uma infração disciplinar?

Aí eu não posso falar, pois pode ter desdobramento disciplinar.

Mas no geral, qual a regra?

Não posso falar no geral. Somente no caso concreto.

A inteligência artificial é uma alternativa para desafogar o Judiciário?

Ela vai ser uma ferramenta importante no futuro. Mas, agora, ela só faz triagem de processos. Eu fiz uma pesquisa e levantei todas as ferramentas de inteligência artificial dentro do Poder Judiciário. Um dado muito positivo é que todas elas são manejadas por gente interna. Mas, por outro lado, a gente ainda não avançou a ponto de utilizá-la em modelos de decisões.

A corregedoria realiza ações sociais?

A visibilidade das ações sociais tem nos deixado muito orgulhosos na Corregedoria. Temos dois programas que a gente desenvolveu recentemente bem interessantes. O primeiro deles diz respeito ao combate a esse sub-registro, focado na questão da população mais vulnerável que é a população de rua. Como a gente sabe, morando na rua, você fica sem identidade, sem documento. Então, nós fizemos a campanha envolvendo os registradores de prefeituras nas redes de apoio social. Foi um esforço concentrado no Brasil todo, movimentamos a questão nas TVs, noticiários, rádios, conseguimos entregar documento de registro de nascimento para as pessoas que não tinham e estavam em situação de rua, sem cobrar um centavo. O garoto-propaganda foi o padre Júlio Lancellotti.

E o segundo programa?

Fizemos o programa Solo Seguro. Primeiro, na Amazônia Legal, que é o maior centro de conflitos envolvendo garimpeiros, posseiros, fazendeiros. Entregamos cerca de 30 mil títulos só na primeira rodada da Amazônia Legal. Foi um movimento bem interessante que a corregedoria fez, pois temos a fiscalização dos cartórios. Tinha gente esperando 20 anos, 30 anos para receber um título de propriedade porque o registro não avançava, não conversava com a prefeitura.

E os projetos para 2024?

Em primeira mão, vamos lançar no ano que vem um programa de doação de órgãos. A campanha se chama Um Só Coração, em parceria com o Ministério da Saúde. É um aplicativo para doação de órgãos, pois a maior dificuldade que temos é a declaração. A família não concorda, ou a pessoa não trata disso em vida. Então, vamos estimular isso por meio dos cartórios.

 

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