Na tensão entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Senado, os dois lados subiram o tom, nesta quinta-feira, um dia depois da aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita os poderes dos ministros da Corte. Magistrados criticaram duramente o aval dos parlamentares ao texto, o que provocou a reação do presidente da Casa legislativa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Ele disse não permitir agressões gratuitas por parte de integrantes do tribunal.
As críticas à PEC partiram do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, e dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Eles classificaram a aprovação da proposta como "intimidação" e "retrocesso". Também destacaram que a atuação do tribunal é protegida pela própria Constituição.
Barroso abriu a sessão desta quinta-feira com o assunto. Ele afirmou que as mudanças "não são necessárias" e que as determinações individuais são prerrogativas do Judiciário. O ministro ressaltou a missão constitucional do STF, que não deve sofrer interferência de outros Poderes. "Trazer uma matéria para a Constituição significa, em alguma medida, tirá-la da política e trazê-la para o direito. Vale dizer: retirá-la do domínio das decisões discricionárias para o espaço da razão pública do Judiciário. Não é uma vontade do tribunal, é o arranjo institucional brasileiro", frisou.
O magistrado disse ser inevitável que o STF desagrade segmentos políticos, econômicos e sociais importantes "porque ao tribunal não é dado recusar-se a julgar questões difíceis e controvertidas". E ressaltou que os tribunais "não disputam torneios de simpatia".
"Num país que tem demandas importantes e urgentes, que vão do avanço do crime organizado à mudança climática que impactam a vida de milhões de pessoas, nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no Supremo Tribunal Federal", enfatizou.
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Ele também lembrou da atuação decisiva da Corte recentemente. "Nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal enfrentou o negacionismo em relação à pandemia, salvando milhares de vidas; o negacionismo ambiental, enfrentando o desmatamento da Amazônia e a mudança climática; bem como funcionou como um dique de resistência contra o avanço autoritário", enumerou. "Por esse papel, o tribunal sofreu ataques verbais e a criminosa invasão física que vandalizou as instalações da Corte. Após esses ataques verbais e físicos, o tribunal vê com preocupação avanços legislativos sobre sua atuação."
O ministro ainda frisou: "Em todos os países que, recentemente, viveram o retrocesso democrático, a erosão das instituições começou por mudanças nas supremas cortes. Os antecedentes não são bons".
"Estranha prioridade"
Já o decano Gilmar Mendes afirmou que a Corte "não é feita de medrosos" e que não admitirá "intimidações". "(O STF) está preparado para enfrentar uma vez mais, e caso necessário, as investidas desmedidas e inconstitucionais, agora, eventualmente, provenientes do Poder Legislativo", destacou.
Segundo Mendes, essa é uma "estranha prioridade" do Parlamento. "Nenhuma resposta para temas que são urgentes para a democracia. O problema é o STF e suas liminares. Estranha prioridade", comentou. "Este Supremo Tribunal Federal não admite intimidações. Cabe lembrar a esses propagadores do caos institucional que os processos de responsabilidade dos ministros desta Corte hão de estar submetidos ao crivo judicial garantidor do devido processo legal, impedindo que acusações mambembes turvem a independência judicial", completou.
Por sua vez, Moraes disse que a discussão de ideias e o aprimoramento das instituições são importantes instrumentos da democracia. "Mas não quando escondem insinuações, intimidações e ataques à independência do Poder Judiciário." Ele também mencionou a atuação do STF na crise sanitária. "Várias decisões urgentes durante a pandemia foram dadas por decisões monocráticas dos relatores, e isso salvou inúmeras vidas durante a pandemia. O nosso decano lembrou a defesa da democracia no dia 8 de janeiro. Decisões liminares referendadas pelo Supremo", recordou.
A PEC foi aprovada na quarta-feira, em dois turnos. A emenda veda os ministros do STF de emitirem decisões monocráticas. O placar se repetiu nas duas votações: 52 x 18. O texto, agora, segue para tramitação na Câmara. Nos bastidores, a aprovação do projeto é vista, também, como o rompimento da lua de mel entre o Planalto e o Supremo, pois a proposta teve três votos a mais do que o necessário, com o apoio de parlamentares da base governista.
No fim da tarde, Pacheco convocou a imprensa e rebateu as críticas dos ministros. Ele frisou que não vai admitir que seja criada uma polêmica sobre a PEC, porque a proposta é "puramente técnica" e "não constitui nenhum tipo de enfrentamento, nenhum tipo de retaliação". "Não podemos admitir que a individualidade de um ministro do STF declare inconstitucional uma lei sem a colegialidade do Supremo Tribunal Federal", argumentou.
Confronto
Para Pacheco, a decisão de um ministro do Supremo não se sobrepõe ao Congresso, e, por isso, a aprovação da PEC se fez necessária para promover "uma busca de equilíbrio entre os Poderes". "Por mais importância que tenha como ministro do STF, não se sobrepõe ao Congresso Nacional, não se sobrepõe ao presidente da República e não se sobrepõe ao colegiado da sua própria Casa", emendou.
O senador enumerou as defesas que fez, na Casa, da democracia e do próprio STF. "Mas isso não significa que as instituições sejam imutáveis ou intocáveis em razão de suas atribuições."
Ele alfinetou o teor das declarações dos magistrados. "Eu não me permito debater ou polemizar nada dessas declarações de um ministro do Supremo Tribunal Federal, porque eu considero que o Supremo não é palco nem arena política", sustentou. "Não me permito fazer um debate político, tampouco receber agressões que, gratuitamente, eu recebi por membros do Supremo Tribunal Federal em razão de um papel constitucional que eu cumpri, de buscar aprimorar a Justiça do nosso país através dessa emenda." (Colaborou Renato Souza)
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