O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu investigação sobre a presença da advogada Luciane Barbosa — com supostos vínculos com o Comando Vermelho — nas dependências do Ministério da Justiça, onde ela participou de audiências com auxiliares do ministro Flávio Dino.
O subprocurador-geral do MP no tribunal, Lucas Furtado, pediu a abertura de apuração para "investigar possíveis condutas atentatórias à moralidade administrativa e eventual desvio de finalidade no uso das dependências do Ministério da Justiça". Luciane é casada com Clemilson dos Santos Farias, vulgo Tio Patinhas, chefe da facção criminosa no Amazonas.
O caso foi revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo. Para o subprocurador, o fato macula a reputação do ministério responsável pelo combate ao crime no país e "abala a confiança da sociedade brasileira em importantes instituições que promovem a segurança pública e a justiça no país".
Para Furtado, o argumento do ministério de que não tinha conhecimento do possível vínculo da advogada com a facção criminosa e até de sua condenação por associação ao tráfico, entre outros crimes, não pode ser considerado.
"Qualquer que fosse o interesse público alegado para justificar o encontro, certamente não se tratava da única via disponível, cabendo ao órgão público selecionar interlocutores que respeitem a moralidade pública exigida das instituições oficiais", registrou o procurador, na peça.
Autoridades do ministério receberam Luciane, conhecida como a "dama do tráfico" amazonense, em audiência. Foram duas visitas neste ano. A advogada e o grupo que a acompanhava estiveram com dois secretários e dois diretores da pasta, encontros que não foram registrados nas agendas oficiais dessas autoridades.
Luciane e Clemilson foram condenados em segunda instância por lavagem de dinheiro, associação para o tráfico e organização criminosa. Tio Patinhas cumpre 31 anos no presídio de Tefé (AM). A advogada foi sentenciada a 10 anos e recorre em liberdade.
O Ministério Publico do Amazonas aponta Luciane como o "braço financeiro" do grupo comandado por seu companheiro e que "exercia papel fundamental, também, na ocultação de valores oriundos do narcotráfico, adquirindo veículos de luxo, imóveis e registrando 'empresas laranjas'".
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Em 19 de março, Luciane esteve com Elias Vaz, secretário Nacional de Assuntos Legislativos de Flávio Dino e ex-deputado federal. Em 2 de maio, ela se encontrou com Rafael Velasco Brandani, titular da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen). Esses encontros foram registrados por ela nas redes sociais, nas quais justificou que levava ao governo "denúncias de revistas vexatórias" no sistema prisional amazonense.
Vaz, em entrevista ao Correio, assumiu toda a responsabilidade pela presença de Luciane no ministério. Ele admitiu o erro e disse que não fez checagem prévia. Contou, ainda, ter sido repreendido por seu superior, Flávio Dino.
"O ministro está muito contrariado com tudo isso. Lógico que me chamou a atenção", frisou Vaz. Ele falou em mudar o comportamento, de agora em diante, e que fará um "filtro" quando for receber convidados para audiência em sua sala.
Nem será mais preciso. Com o episódio, o secretário-executivo da pasta, Ricardo Cappelli, baixou portaria que restringe o acesso e a circulação de pessoas nas dependências do Palácio da Justiça, sede da pasta. A partir de agora, só será autorizada a presença da pessoa que, 48 horas antes da data prevista da audiência ou reunião, comunique formalmente por e-mail nomes de todos os participantes e acompanhantes, com inserção dos respectivos CPFs.
E mais: a entrada no ministério será precedida também do contato da recepcionista com o "ponto focal" da unidade de destino, que autorizará ou não o ingresso da pessoa.
Série de requerimentos
Em dois dias, bolsonaristas apresentaram 13 novos requerimentos de convocação de Dino e pedidos de explicação ao ministro sobre a presença da advogada em seu ministério.
Os parlamentares querem levá-lo à Comissão de Segurança Pública, onde o ministro já se recusou a ir, argumentando riscos à sua integridade física — o colegiado é formado quase na sua totalidade por integrantes da bancada da bala —, e também à Comissão de Fiscalização e Controle, também dominada por aliados de Jair Bolsonaro e presidida por Bia Kicis (PL-DF).
O deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP), autor de um dos pedidos de convocação de Dino, postou nas redes sociais: "Bolsonaro ficou inelegível por receber embaixadores. Qual é a punição para Lula, que permite que integrantes do CV (Comando Vermelho), condenados por tráfico, façam reuniões com o Ministério da Justiça?".
Autor de outro requerimento, Evair de Melo (PP-ES) disse que a notícia mostra o descompasso entre a realidade do crime organizado e a capacidade da pasta de lidar com ameaças de forma eficaz.
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