CONGRESSO NACIONAL

Marco temporal: bancada ruralista diz que veto de Lula será derrubado

Em nota divulgada após o anúncio do Planalto, Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) informa que vetos de Lula no projeto de lei do marco temporal "serão objeto de derrubada"

Após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seus ministros anunciarem, nesta sexta-feira (20/10), a decisão de vetar a tese do marco temporal do projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional no mês passado, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) informou em nota que os vetos "serão objeto de derrubada” em sessão do Congresso Nacional, “respeitados os princípios de representatividade das duas Casas Legislativas, com votos suficientes para a ação”.

A bancada ruralista no Congresso é constituída por 303 deputados federais e 50 senadores em exercício, ou seja, tem contingente para aprovar ou derrubar a maioria dos projetos das duas Casas do Legislativo e só esbarra na emenda constitucional, que precisa de 308 votos na Câmara e de 49 no Senado.

“Diante das decisões recentes responsáveis por estimular conflitos entre a população rural brasileira — indígenas ou não, em desrespeito à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, a FPA não assistirá de braços cruzados a ineficiência do Estado Brasileiro em políticas públicas e normas que garantam a segurança jurídica e a paz no campo. Buscaremos a regulamentação de todas as questões que afetam esse direito no local adequado, no Congresso Nacional”, informa a nota enviada ao Correio

Depois de uma reunião com os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Sonia Guajajara (Povos Indígenas) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), no Palácio da Alvorada, o presidente decidiu seguir a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e vetar o trecho do projeto lei que Instituía o marco temporal para a demarcação de terras indígenas até a data da promulgação da Constituição Federal, em outubro de 1988.

De acordo com o comunicado da FPA, a discussão de temas dessa magnitude “exige um compromisso inabalável dos Três Poderes da República, com a devida lisura dos processos legislativos, garantindo que todas os brasileiros sejam ouvidos nesta legislação que pode retirar a dignidade de milhares de famílias brasileiras, responsáveis pela produção de alimentos para o Brasil e para o mundo”.

A nota ainda lembrou que, após 16 anos de debates, no dia 30 de maio deste ano, o plenário da Câmara aprovou a matéria por 283 votos favoráveis contra 155 contrários. Em 27 de setembro, foi a vez do plenário do Senado Federal fazer o mesmo por 43 votos a favor contra 21. “A decisão dos dois plenários é soberana e deve ser respeitada pelos demais Poderes da República, em reconhecimento às atribuições definidas na Constituição Federal. O Parlamento Brasileiro representa a pluralidade da sociedade em sua amplitude de Estados, partidos e ideais”, finalizou o comunicado.

Palavra de especialista

De acordo com o advogado constitucionalista Camilo Onoda Caldas, sócio do escritório Gomes, Almeida e Caldas Advocacia, na realidade, o Poder Legislativo sabe que não poderia criar uma lei estabelecendo o marco temporal, já que o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a tese de que, nos termos da Constituição Federal, não há o marco temporal e, portanto, o direito dos indígenas à terra não é garantido apenas aos que já estavam de posse dessas áreas em 1988, que é a tese do marco temporal.

"O que o Poder Legislativo fez foi simplesmente marcar uma posição política, criando uma legislação que estabelece o marco temporal como uma forma de agradar aos interesses dos ruralistas que têm uma bancada muito forte no Poder Legislativo", afirmou. 

Na avaliação do especialista, o presidente Lula agiu corretamente ao vetar o marco temporal, "porque como presidente da República, notando que existe uma inconstitucionalidade em uma lei, é dever dele realizar o veto naquilo que se reconhece a inconstitucionalidade".

"É possível que o veto venha a ser derrubado pelo Poder Legislativo e, nesse caso, caberá ao STF uma nova manifestação para o reconhecimento da inconstitucionalidade desse projeto de lei, o que certamente ocorrerá", acrescentou. Portanto, no entender do advogado, a atitude do Poder Legislativo "acaba apenas atrapalhando o funcionamento dos três Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que acaba tendo que se debruçar novamente sobre uma questão já ultrapassada para atender a um capricho de alguns que não se conformam com o entendimento do STF".

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