O Ministério Público de Contas junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu, nesta segunda-feira (23), que seja aberta investigação para apurar o suposto esquema de grampos ilegais realizados pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Na semana passada, uma operação da Polícia Federal foi deflagrada para desmontar o esquema.
A representação junto ao TCU foi realizada pelo subprocurador-geral Lucas Furtado. No documento, ao qual o Correio teve acesso, Furtado cita alguns dos nomes que seriam alvos da espionagem, como o jornalista Glenn Greenwald e o ex-deputado David Miranda.
“A meu ver, há claro abuso e deturpação das finalidades do órgão quando utilizado para realizar monitoramento de desafetos políticos do ex-presidente da República. Na qualidade de membro do Ministério Público junto ao TCU, tenho o dever funcional de, por delegação, ‘promover a defesa da ordem jurídica, requerendo, perante o Tribunal de Contas da União as medidas de interesse da justiça, da administração e do Erário", escreveu o subprocurtador.
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Ele destacou ainda que o "acesso indevido à localização e movimentação de cidadãos sem qualquer motivação oficial devidamente registrada poderia se prestar apenas a atender um eventual interesse pessoal de agentes e autoridades, caracterizando flagrante desvio de finalidade, uma vez que utiliza-se indevidamente de recursos e ferramentas de trabalho e tratamento de informações no intuito de supostamente atender interesses privados, com evidente dispêndio indevido e injustificado de recursos públicos".
Entre os alvos, de acordo com diligências iniciais, estavam servidores do Supremo Tribunal Federal (STF), advogados, jornalistas, especialmente os que atuam no tribunal, enviados por veículos de comunicação para a realização de coberturas, e ministros da mais alta corte do país.
Na ação da semana passada, a PF prendeu dois diretores da Abin e cumpriu 25 mandados de busca e apreensão. As buscas foram realizadas em diversas unidades da federação, sendo 17 no Distrito Federal, uma em Goiânia (Alexânia), duas em São Paulo (São Paulo e São José dos Campos), duas no Paraná (Curitiba e Maringá), três em Santa Catarina (Florianópolis, São José e Palhoça). Os mandados foram expedidos pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo. Parte dos suspeitos prestaram depoimento ontem, na sede da PF, em Brasília.
Também foram afastados cinco diretores que estavam no cargo na gestão de Jair Bolsonaro e foram mantidos no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um deles é Paulo Maurício Fortunato Pinto, que era diretor do Departamento de Contrainteligência da Abin até 2008. Em abril, o Correio revelou que a intenção de colocar ele em cargo de gestão na Abin estava travando a sabatina, pelo Senado, de Luiz Fernando Corrêa, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para diretor-geral da agência.
Em uma residência ligada a Fortunato, a PF encontrou U$ 171 mil (R$ 855 mil) em espécie.
O montante foi recolhido e a origem das cédulas será apurada. Os investigadores querem saber de onde veio o dinheiro e por qual motivo ele estava armazenado em casa, sem circulação pelo sistema bancário.
A espionagem tentou fazer um cerco ao Supremo, com monitoramento em massa de quem circulava pela corte. Ocorreram mais de 33 mil acessos da localização telefônica dos alvos. No entanto, apenas 1,8 mil dados dos acessos realizados, inclusive identificando os alvos, foram obtidos pela corporação até o momento.
O software First Mile foi adquirido em 2018, durante a gestão do ex-presidente Michel Temer. Ele foi colocado em operação quatro dias antes de Jair Bolsonaro assumir o poder, em um período em que o governo de transição já estava em pleno funcionamento. Em nota, a Abin afirmou que a ferramenta foi utilizada até maio de 2021.
A entidade afirmou ainda que instaurou, neste ano, um procedimento interno para avaliar o caso e que as informações foram repassadas para órgãos de investigação e ao Poder Judiciário. “A partir das conclusões dessa correição, foi instaurada sindicância investigativa em 21 de março de 2023. Desde então, as informações apuradas nessa sindicância interna vêm sendo repassadas pela ABIN para os órgãos competentes, como Polícia Federal e Supremo Tribunal Federal”, afirma um trecho da nota.
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