Como acontece em toda guerra, são inevitáveis as comparações. No caso do brutal ataque de surpresa do Hamas a Israel, a comparação com o ataque da Al-Qaeda às Torres Gêmeas, em Nova York, no 11 de setembro de 2001, serve de argumento para o apoio incondicional dos Estados Unidos à implacável retaliação do Exército de Israel à Faixa de Gaza, onde a maioria das vítimas são crianças, mulheres e idosos, como também aconteceu no ataque de surpresa do Hamas ao território israelense.
Estou entre os que preferem comparar o ataque do Hamas à ofensiva do Tet Lunar (ano novo) dos vietcongues e do Exército do Vietnã do Norte, que surpreendeu o Exército dos Estados Unidos em 30 de janeiro de 1968. Durante sete dias, os guerrilheiros comunistas ocuparam Saigon. A ofensiva foi um desastre militar, não provocou um levante popular nem destruiu o Exército do Vietnã do Sul. Mas teve um efeito devastador na opinião pública dos Estados Unidos e mundial, decidindo o destino da guerra.
Entretanto, quem acompanha as imagens na Faixa de Gaza, do ponto de vista estritamente militar, o chamado teatro de guerra tem muito mais a ver com a Batalha de Stalingrado, na Segunda Guerra Mundial, do que com a sangrenta batalha de Hué, durante a Guerra do Vietnã, vencida pelos mariners. Manobrar em campo aberto, encostas e zonas rurais é muito diferente do combate numa cidade destruída por bombardeios, mas na qual a resistência se mantém rua por rua, prédio a prédio, andar por andar, dentro dos porões e galearias subterrâneas, como aconteceu em Stalingrado. Esse é o cenário que o Exército israelense encontrará pela frente se entrar em Gaza antes de um cessar-fogo ou da rendição do Hamas.
Como na Faixa de Gaza, em Stalingrado, os civis passaram sede, fome e frio, sem energia e combustível, mas o Exército soviético foi orientado a resistir até o último homem. No final, o cercou o Exército alemão, que se rendeu, fazendo 200 mil prisioneiros. Mas morreram 2 milhões de pessoas. Em Stalingrado, o major-general Vassily Chuikov adotou uma "defesa ativa", ou seja, nunca perdeu a iniciativa.
O que mais aterrorizava as tropas alemãs eram pequenas unidades de combate, que denominou de "porco espinho", com um franco-atirador e equipada com um morteiro e uma metralhadora. Essas unidades se escondiam nos escombros, deslocavam-se à noite e atacavam de surpresa e se evadiam, quando possível. Não existe a menor possibilidade de derrota militar de Israel pelo Hamas, mas esse é o tipo de combate que o Exército israelense encontrará nas ruínas de Gaza, se invadi-la.
Por que a guerra?
A reação de Benjamin Netanyahu, na Faixa de Gaza, até agora obedece a objetivos estritamente militares, e não humanitários. Isso fará com que os ânimos se acirrem ainda mais no mundo árabe e cresçam os questionamentos na opinião pública mundial e israelense quanto à escala da retaliação. Metade da população da Faixa de Gaza tem menos de 17 anos, qual será o futuro das crianças e dos jovens que sobreviverem à nova tragédia palestina?
Albert Einstein e Sigmund Freud entram nessa história porque uma famosa troca de cartas entre o autor da Teoria da Relatividade e o criador da psicanálise circula nas redes sociais. Em 1932, Albert Einstein, em nome do Instituto Internacional para a Cooperação Intelectual, pertencente à Liga das Nações, enviou uma carta para Freud, na qual fez a seguinte pergunta: existe alguma forma de livrar a humanidade da ameaça da guerra?
Einstein tinha esperança de que Freud sugerisse métodos educacionais que promovessem a paz. Em vez de dar soluções, Freud preferiu destrinchar o problema. Destacou a relação entre direito, poder e violência. Assinalou que a dominação sempre esteve em poder daquele que detivesse um poder maior, seja pela violência bruta, seja pela violência apoiada no intelecto. Detentores de poder se colocam acima dos demais, e os oprimidos tentam se pautar em uma justiça igual para todos, argumentou. Para Freud, as guerras somente serão evitadas se a humanidade se unir para estabelecer uma autoridade central a que lhe será conferido o direito de arbitrar todos os conflitos, tese que hoje fundamenta a existência da ONU.
"Por que o senhor (diz Freud), eu e tantas pessoas nos revoltamos tão violentamente contra a guerra? Penso que a principal razão por que nos rebelamos contra a guerra é que não podemos fazer outra coisa. Somos pacifistas porque somos obrigados a sê-lo, por motivos orgânicos, básicos", escreveu. "Ora, a guerra se constitui na mais óbvia oposição à atitude psíquica que nos foi incutida pelo processo de civilização, e por esse motivo não podemos evitar de nos rebelar contra ela; simplesmente não podemos mais nos conformar com ela", completou Freud.
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