STF

Contagem regressiva para saída de Weber aumenta pressão por ministra negra

Esforço de entidades é para que a cadeira a ser aberta com a aposentadoria de Rosa Weber não seja ocupada por um homem (e branco). E cobram de Lula a promessa de campanha de promover a paridade nos espaços de poder

Com a aproximação do 2 de outubro, quando a ministra Rosa Weber se aposenta compulsoriamente, cresce a pressão para que uma jurista negra ocupe a cadeira que ela deixará no Supremo Tribunal Federal (STF). Além das articulações políticas que envolvem padrinhos e preferências, circulam vários documentos — elaborados por entidades de classe e movimentos sociais — cobrando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva que não se deixe levar pela tendência de indicar um homem, possivelmente branco. E, dessa forma, ele mantenha a promessa de promover a ocupação de postos decisivos, nos Três Poderes, com mulheres e negros, que compõem a maioria da população brasileira.

Nomes de juristas negras, com currículo, história e reconhecimento entre os pares, não faltam (veja no quadro quais são as principais citadas). "É importante começar a fazer um movimento intencional de transformação do Judiciário pelas cortes superiores, que têm uma baixíssima representação (de mulheres e negros)", explica Tainah Pereira, mestre em Ciência Política e coordenadora do movimento Mulheres Negras Decidem.

O coletivo que ela coordena é um dos que estão na linha de frente da pressão para que uma negra suceda Rosa Weber, o que não parece ser a tendência de Lula. Três homens disputariam a predileção do presidente: o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino; o advogado-geral da União, Jorge Messias; e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas.

"Ele tem mulheres perto dele com capacidade jurídica e relação próxima", aponta Kone Prieto Cesário, professora da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, sobre a "dificuldade" de Lula em indicar uma jurista negra. "É necessário implementar práticas de paridade de gênero nas instituições brasileiras. Várias instituições têm falado sobre isso, mas não vêm cumprindo os objetivos de paridade", salienta. Para ela, se o presidente não escolher uma mulher, estará "traindo os compromissos" assumidos na campanha.

Maioria delas

Atualmente, 51% dos advogados filiados à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) são mulheres. Entretanto, jamais uma mulher ocupou a presidência da entidade. No Judiciário, apenas 23% são desembargadoras e, no STF, sem Rosa Weber, restaria a ministra Cármen Lúcia entre 10 magistrados.

Sobre a ausência feminina nos altos cargos do país, Tainah Pereira lembra que "nas carreiras públicas, os vieses da seleção não consideram fatores de gênero, raça ou origem. Para fazer essas avaliações, caem no mito da universalidade, de que todos são iguais. Isso não é verdade, tem os fatores sociais. A gente vem trabalhando muito nessa ideia de que, agora, temos um governo que é progressista. Então, é importante que essa decisão seja tomada a favor da população". Por sinal, um evento com as mulheres negras cotadas ao STF com juristas está marcado para amanhã, em São Paulo.

Uma negra ministra do STF tem o apoio, inclusive, do chefe em exercício da Defensoria Pública da União (DPU), Fernando Mauro Oliveira Júnior. "Seria importante trazer essa questão do gênero aliada à questão racial para o STF oxigenar as ideias", propôs.

Entretanto, das pressões para que uma jurista negra ocupe uma das 11 cadeiras do STF correm risco de serem infrutíferas, pois Lula não tem a obrigatoriedade de indicar o substituto de Rosa Weber logo a seguir à aposentadoria da ministra. Não é raro que o sucessor do magistrado que deixa Corte demore para ser escolhido.

Isso, aliás, aconteceu com o ministro Edson Fachin, que será o vice-presidente do STF na gestão de Luis Roberto Barroso. Ele só tomou posse (em 2015) quase um ano depois que o ministro aposentado Joaquim Barbosa deixou o Supremo. À época, a então presidente Dilma Rousseff disse que aguardaria o transcurso do processo eleitoral para fazer a indicação, só que demorou mais de um semestre para formalizar sua escolha.

Para reforçar a pressão sobre a discussão da igualdade de gênero, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) retoma, amanhã — e ainda sob o comando de Rosa Weber —, a votação uma resolução que institui que tribunais de segunda instância adotem a política de paridade nas promoções para as cortes. Três conselheiros votaram a favor da norma — o colegiado, porém, é composto de 15 membros e ainda faltam cinco votos para que haja maioria pela aprovação.

Vera Lúcia Santana Araújo

Minervino Júnior/CB/D.A.Press - A advogada Vera Lúcia Santana Araújo, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD)

Foi advogada na esfera pública e ocupou a chefia de serviços jurídicos nos níveis federal e distrital. Foi diretora da Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura, e presidiu a Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso do Distrito Federal. Atualmente, é integrante da Executiva Nacional da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia. É uma das signatárias do manifesto que sustenta a necessidade da nomeação de uma mulher preta para o Supremo — documento que tem o apoio de entidades como o grupo Prerrogativas e a Coalizão Nacional de Mulheres.

Soraia da Rosa Mendes

Pedro França/Agência Senado - Advogada Soraia da Rosa Mendes.

A doutora pela Universidade de Brasília (UnB) também é mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pós doutora em Teorias Jurídicas Contemporâneas pela Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ) e pós-graduada em Direitos Humanos pelo Instituto de Filosofia Berthier (IFIBE). Com apoio de movimentos sociais, centrais sindicais, associações de professores e estudantes, coletivos de categorias profissionais, ela teve o nome indicado em uma “anticandidatura” à de André Mendonça, escolhido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para a Corte.

Livia Sant’Anna Vaz

Reprodução/X (antigo Twitter) - Advogada Livia Sant'Anna Vaz

Promotora de Justiça, é doutora em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, mestra em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia e especialista em Estudos Afro-latinos-americanos e Caribenhos do Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales. No Ministério Público do da Bahia, atuou nas pautas de combate ao racismo e à intolerância religiosa em Salvador, na coordenação do grupo de proteção dos direitos humanos e combate à discriminação e na coordenação do grupo de defesa dos direitos das mulheres e da população LGBTQIA+.

Adriana Alves dos Santos Cruz

Ana Araújo/Agência CNJ - Adriana Alves dos Santos Cruz, Juíza Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) e Auxiliar na Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é mestra em Direito Constitucional e Teoria do Estado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), doutora em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e professora de Direito Penal da PUC-RJ. É juíza titular da 5ª Vara Criminal do Rio de Janeiro e integra os comitês executivos do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário e do Fórum Nacional do Poder Judiciário para a Equidade Racial, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Chiara Ramos

Reprodução/LinkedIn - Advogada Chiara Ramos

É procuradora federal e doutoranda em Ciências Jurídico-políticas pela Universidade de Lisboa, em co-tutoria com a Universidade de Roma — La Sapienza. É mestra e graduada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Também é membro da Escola Superior da Advocacia e da Escola da Advocacia-Geral da União, e preside a Abayomi Juristas Negras e da Comissão da Verdade sobre a Escravidão Negra. Atua ainda na luta pelo combate ao racismo institucional e desenvolve ações para a instrumentalização de mulheres negras e indígenas — para que possam ocupar cargos com poder decisório no Judiciário.

Edilene Lobo

Jair Amaral/Estado de Minas - Ministra do TSE, Edilene Lobo

Apesar de ter sido empossada como ministra substituta no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em agosto, é uma das apostas para o STF. Graduada em Direito pela Universidade de Itaúna (UIT), é mestra em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutora pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Atua nas pautas de direitos humanos, tecnologias, sexualidade e inclusão, além de ser professora do curso de Direito na UIT. Faz parte da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).

Dora Lúcia de Lima Bertúlio

Sucom/UFPR - Jurista Dora Lúcia de Lima Bertúlio

Natural de Itajaí (SC), a procuradora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) é mestra em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). É especialista e direito público na área de racismo, direito e relações raciais, discriminação racial, ação afirmativa e história do direito brasileiro. Trabalhou na apresentação das intercorrências entre o Direito, raça e racismo, e pesquisas envolvendo questões raciais no meio jurídico — e como isso repercute na atuação do Poder Judiciário. Recebeu o título de Cidadã Honorária de Curitiba, concedido pela Câmara Municipal.

Flávia Martins de Carvalho

Divulgação/TJMG - Jurista Flávia Martins de Carvalho

Juíza auxiliar no STF, é graduada e mestra em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
doutoranda em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e graduada em Comunicação Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). É diretora de Promoção da Igualdade Racial da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e juíza de Direito no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP). Atua nas áreas de filosofia e teoria do direito, gênero e questões raciais.

Jaceguara Dantas

Redes Sociais/Reprodução - Desembargadora Jaceguara Dantas, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul.

Desembargadora do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJ-MS), é de Guajará Mirim (RO) e foi cofundadora do Grupo TEZ — Trabalho Estudos Zumbi, primeira entidade do grupo negro do Mato Grosso do Sul. Foi a primeira promotora titular da Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos da comarca de Campo Grande. Hoje, dirige a Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do TJ-MS e é Ouvidora Auxiliar Regional da Mulher da Região Centro-Oeste — designada pela ministra Rosa Weber. Um grupo de magistrados e de mulheres do Centro-Oeste defende o nome da desembargadora.

Manuelita Hermes Rosa Oliveira Filha

Reprodução/Linkedin - Procuradora Manuelita Hermes Rosa Oliveira Filha

Procuradora na Advocacia-Geral da União (AGU) desde 2007, é doutora em direito pela Università degli Studi di Roma Tor Vergata, na Itália. Natural da Bahia, passou um longo período na assessoria da ministra Rosa Weber e atuou como secretária de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da Informação do STF. Enquanto secretária de Altos Estudos, foi coordenadora das atividades de restauração do prédio do STF e uma das responsáveis por restabelecer, em pouco mais de 20 dias, a integridade da sede do Judiciário após o 8 de janeiro. Além de professora, pesquisadora e escritora, assumiu recentemente o cargo de coordenadora-geral de Assuntos Judiciais e Administrativos da Consultoria Jurídica do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, comandado pelo ministro Silvio Luiz de Almeida

*Colaborou Marina Dantas, estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi

 

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