Seis diretórios nacionais de partidos comprovaram menos de 10% dos seus gastos do ano eleitoral de 2022 na prestação de contas que devem apresentar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). PL, Novo, PCdoB, PCB, PMB e PSTU entregaram documentos que representam uma parcela muito pequena daquilo que dizem ter gasto ao longo de todo o ano passado. O levantamento foi feito pelo Movimento Transparência Partidária, a partir das informações disponíveis no Portal de Dados Abertos da Corte, nos dias 21 e 22 de agosto.
A legislação estabelece que todas as legendas são obrigadas a prestar contas anualmente em prol da transparência do uso dos recursos públicos. O PCdoB não comprovou nem um real dos R$ 121 milhões que afirma ter gasto. PCB comprovou 2% da despesa total declarada; Novo, 6%; PMB e PSTU, 7% cada; e PL, 8%. O partido do ex-presidente Jair Bolsonaro informou ter desembolsado R$ 491 milhões em 2022, mas juntou comprovantes que, somados, dão R$ 41 milhões.
Cada agremiação precisa declarar os gastos e as receitas do ano todo no Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA), uma plataforma do TSE, até o dia 30 de junho. O que eles colocam no sistema dá origem a um processo judicial de prestação de contas, no qual os ministros do TSE avaliam se a contabilidade está correta.
'Consertos'
O que o movimento constatou a partir da análise técnica é que vários partidos declaram despesas sem comprovação. As siglas têm a possibilidade de ir "consertando" as declarações no curso do processo, sem que sofram sanções por isso - a ponto de milhões de reais não terem uma destinação clara. Parte desse dinheiro vem, inclusive, dos fundos Partidário e eleitoral, que são recursos públicos.
"A Justiça Eleitoral tem cinco anos para julgar as contas dos partidos", afirmou a advogada eleitoral Izabelle Paes, sócia do escritório Callado, Petrin, Paes e Cezar. "Mas a não apresentação da documentação não causa prejuízo na análise da prestação de contas." Em outras palavras, os partidos não sofrem sanções por não apresentarem todos os comprovantes dos seus gastos nesse primeiro momento.
Ao longo do processo de prestação de contas - que pode durar anos - os partidos podem mudar o que declararam como receita e despesa. "É possível que, a partir do momento em que o processo é autuado e a Justiça comece a análise, o partido apresente o que sabe que ficou faltante, ou que faça isso quando for convocado pela equipe técnica do TSE", disse a advogada. É como se as siglas pudessem "trocar a asa do avião" durante o voo, sem prejuízo para o trajeto.
Punições
Uma eventual punição vai ocorrer só no fim do processo judicial de prestação de contas, se o partido for intimado e, mesmo assim, não corrigir a sua contabilidade. "As siglas podem ser punidas com a devolução dos recursos irregulares (vindos do Fundo Partidário ou não) e receber uma multa de até 20% sobre esse valor que foi considerado irregular", disse Izabelle.
Há, ainda, a possibilidade de suspensão do recebimento do Fundo Partidário por um a 12 meses, dependendo da irregularidade nas contas. Mesmo quando a questão não for relativa a verbas públicas, como é o caso do Fundo Partidário, as siglas precisam provar que aquele gasto teve a ver com as suas atividades.
Questionado pela reportagem, o TSE confirmou que os dados que os partidos cadastram no Sistema de Prestação de Contas Anual, o SPCA, podem ser alterados mesmo depois que o processo judicial começa. "Esses dados são atualizados diariamente/semanalmente e estão sujeitos a alterações decorrentes de diligências solicitadas pela Justiça Eleitoral durante o exame das contas." Os números ficam disponíveis no site do tribunal.
O advogado e cientista político Marcelo Issa, diretor executivo do Movimento Transparência Partidária, destacou que, apesar de não haver sanções para os partidos que apresentem depois as provas das suas despesas, o procedimento prejudica a transparência que as siglas devem ter com a sociedade. "A obrigação de prestar contas e apresentar os respectivos documentos comprobatórios existe, embora - lamentavelmente - não exista previsão específica de sanção quando essa obrigação não é integralmente cumprida."
Segundo ele, o propósito do levantamento é tanto mostrar a postura dos partidos quanto "evidenciar que o marco regulatório e a sistemática operacional envolvidos nesses processos merecem ser aprimorados, para que, efetivamente, se consiga fazer com que os partidos políticos prestem contas de modo cada vez mais fidedigno e oportuno".
Ajustes
As seis legenda mencionadas na reportagem foram procuradas pelo Estadão, por meio de suas assessorias e dos canais fornecidos por elas no site do TSE. Apenas o Novo e o PSTU responderam aos questionamentos.
O PSTU disse que, por causa da cláusula de barreira, não recebe recursos do Fundo Partidário e que declarou, no sistema de prestação de contas, um gasto de R$ 3.971.498,30. "Sendo que, deste valor, R$ 3.100.949,86 são recursos do fundo eleitoral e o restante são receitas próprias, ou seja, advindas das contribuições e doações de pessoas físicas." Fundo eleitoral e Fundo Partidário são verbas públicas diferentes.
Segundo a sigla, as despesas foram "lançadas e especificadas" e a agremiação está com prazo aberto no processo de prestação de contas para apresentar novos documentos, a pedido da Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias (Asepa), divisão técnica do TSE. "A agremiação não recebe recursos do Fundo Partidário e, apesar de o relatório técnico da Asepa não ter solicitado, o partido irá apresentar, dentro do prazo processual, toda a documentação." O PSTU apresentou ao Estadão uma pasta com notas de despesas.
O Novo afirmou que "armazena todos os comprovantes fiscais internamente, sendo que estão todos disponíveis para a Justiça Eleitoral assim que requisitados". Em nota, o partido disse que a Justiça Eleitoral está apreciando as contas de 2019, 2020 e 2021 e que "está apresentando os comprovantes fiscais conforme demandado pelo tribunal". As contas de 2016, 2017 e 2018, segundo o Novo, "foram completamente aprovadas".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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