Ministros aposentados do Supremo Tribunal Federal (STF) dispararam críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva por sugerir que os votos dos magistrados da Corte sejam secretos.
O ministro Celso de Mello emitiu uma nota na qual enfatizou que a sociedade deve acompanhar os fundamentos do voto dos magistrados, e a democracia não tolera o mistério.
"Não se pode negar ao cidadão, em uma sociedade estruturada em bases democráticas, o direito de conhecer os motivos que levam um magistrado a proferir seu julgamento, pois, nesse domínio, há de preponderar, sempre, um valor maior, representado pela exposição ao escrutínio público dos processos decisórios em curso no Poder Judiciário", declarou.
Segundo o ministro aposentado, a transparência dos atos do poder público só é quebrada em regimes totalitários. "Os estatutos do poder numa República fundada em bases democráticas não podem privilegiar o mistério, porque a supressão do regime visível de governo, que tem na transparência a condição de legitimidade dos próprios atos, sempre coincide com tempos sombrios e com o declínio das liberdades fundamentais. A Constituição da República não privilegia o sigilo! Ao contrário, ela dessacralizou o mistério como 'praxis' governamental, notadamente no âmbito do Poder Judiciário", acrescentou, em nota.
Ao Correio, o também ministro aposentado Marco Aurélio Mello ressaltou não haver possibilidade de voto sigiloso na Constituição Federal. Quando presidiu a Corte, uma de suas ações foi a criação da TV Justiça, em 2002, justamente para aumentar a transparência e veicular os julgamentos do STF. O ministro, porém, disse não acreditar que Lula realmente defenda a possibilidade do voto secreto.
"Atribuo essa fala a um ato falho, e ele se expressou como se expressou. É um conceito básico da Constituição Federal que o serviço público se baseia na publicidade. Não se coaduna com a nossa democracia, com a Constituição, o voto sigiloso", frisou.
O magistrado ainda comentou a afirmação do ministro da Justiça, Flávio Dino, de que a Suprema Corte norte-americana não divulga os pareceres individuais de seus integrantes, apenas o resultado final do julgamento. O argumento de Dino teve por objetivo justificar a fala de Lula.
Marco Aurélio Mello, porém, rebateu: "A Suprema Corte é norteada pela Constituição. A nossa Constituição prevê a publicidade. Se nos Estados Unidos o sistema é outro, o sistema é deles. Enquanto estivermos com essa Constituição, não há voto sigiloso", apontou. "Não há espaço para uma era de trevas", emendou.
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"Animosidade"
Lula deu a declaração, nesta terça-feira, na live Conversa com o Presidente. Ele sustentou que a medida diminuiria a "animosidade" e as pressões contra os integrantes da Corte. "Se eu pudesse dar um conselho, é o seguinte: a sociedade não tem que saber como é que vota um ministro da Suprema Corte. Acho que o cara tem que votar, e ninguém precisa saber. Votou a maioria 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. Aí, cada um que perde fica com raiva, cada um que ganha fica feliz", ressaltou.
Na opinião de Lula, os magistrados do Supremo sofrem hostilidades na rua em razão dos votos que proferem. "Para a gente não criar animosidade, acho que era preciso começar a pensar se não é o jeito de a gente mudar o que está acontecendo no Brasil, porque do jeito que vai, daqui a pouco, um ministro da Suprema Corte não pode mais sair na rua, não pode mais passear com a sua família, porque tem um cara que não gostou de uma decisão dele", completou.
O presidente não esclareceu como seria o modelo que está sugerindo, mas não deixou dúvidas de que trata-se dos votos individuais dos magistrados, e não de uma alteração na transmissão das sessões, difundidas ao vivo pela TV Justiça e pela internet.
O petista defendeu o voto secreto em meio a críticas contra o ministro Cristiano Zanin, recém-empossado na Corte por indicação do petista, de quem foi advogado na Lava-Jato. Zanin vem sendo atacado, até mesmo pelo PT, por seus votos conservadores, como o contrário à descriminalização da maconha.
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