A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura os atos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ouviu três ex-assentados do movimentos, na tarde desta terça-feira (8/8). O segundo depoimento foi de Vanuza dos Santos de Souza, ex-assentada do Acampamento São João, que afirmou ter sido expulsa da própria casa em um assentamento e acusa o Valmir Assunção (PT-BA) de ser o mandante da ação.
Desde o início do depoimento, Vanuza demonstrou emoção ao falar. Chorando, ela gritou que sentia “vergonha de ser brasileira” e afirmou diversas vezes que não gostaria de estar ali, mas que estava pela “honestidade” e que não queria “difamar o movimento”. Ele ainda contou que por anos votava no Partido dos Trabalhadores (PT) por acreditar, não por pedido do MST.
“Anos e anos fazendo campanha para o Valmir Assunção” diz Vanuza. De acordo com ela, o deputado teria entregado o lote a ela no assentamento há 16 anos. Chorando, a depoente conta que foi expulsa de casa durante a madrugada e mostra vídeo de uma casa, que seria dela, com todos móveis, janelas e até telhado quebrados.
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Vanuza também mostrou alguns vídeos dela falando, no dia em que teria sido expulsa, e da casa bagunçada com coisas quebradas, com imagens sem áudio.
Logo após o depoimento, o membro do MST Cássio Souza Santa, filho de Vanuza, publicou um vídeo desmentindo a versão dita pela mãe na CPI. "Infelizmente, minha mãe foi cooptada", disse.
Pelo X, o deputado Valmir Assunção negou as acusações de Vanuza e disse que a CPI é "um palanque bolsonarista que não ajuda em nada a reforma agrária". Confira o vídeo:
Os parlamentares da base governista acusaram Ricardo Salles (PL-SP) de atuar como se fosse advogado da depoente. A deputada Silvia Waiãpi (PL-AP) protagonizou momento de “defesa” da mulher. Acusando deputadas como Sâmia Bomfim (Psol-SP) e Talíria Petrone (Psol-RJ), defensoras dos movimentos sociais, de se “vitimizarem” e não “respeitarem” a depoente. De longe foi possível ver que as duas deputadas do Psol conversaram sobre abaixar o tom para não seguir adiante com o desentendimento.
Mais depoimentos
Além de Vanuza, também prestaram depoimento os ex-militantesElivaldo da Silva Costa e Benevaldo da Silva Gomes, ex-participante do Acampamento Egídio. Benevaldo contou que foi convidado a participar do movimento e que ficou 5 anos no acampamento e 7 meses no lote que lhe foi dado. No entanto, ele recebeu ordem para desocupar o local em três dias. De acordo com o depoente, o movimento não teria dito o motivo. Ele reforçou diversas vezes ser “trabalhador e honesto”.
Os três depoentes acusam o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT-BA), que na época dos relatos era governador da Bahia. Eles afirmam terem pedido auxílio ao político, mas dizem ter sido ignorados. Após ter sido convocado por votação dos parlamentares, o ministro irá prestar declarações à CPI do MST nesta quarta-feira (9/8).
MST se pronuncia sobre ações atribuídas ao movimento na CPI
Após o término da CPI, o MST emitiu uma nota rebatendo todas acusações feitas ao movimento durante a sessão desta terça-feira. Leia abaixo trechos:
"Em pauta, uma série de acusações infundadas que, além de evidenciarem o ataque sistemático à luta pela terra naquela Comissão, também trazem à tona a articulação do bolsonarismo em áreas rurais.
A principal figura usada para atacar a luta pela terra foi Elivaldo da Silva Costa, conhecido como Liva do Rosa do Prado. Liva é militante bolsonarista e foi candidato a deputado estadual nas últimas eleições apoiando o ex-presidente Bolsonaro. Morando no assentamento Rosa do Prado, conquistado a partir da luta do MST, Liva é parte de um grupo que, desde 2020, utiliza de métodos violentos para ameaçar e aterrorizar famílias da região.
Tal grupo, durante a gestão Bolsonaro, valia-se da promessa de titulação dos lotes nos assentamentos para cooptar famílias e tensionar a relação delas com o MST. No entanto, em todo o estado da Bahia, a gestão Bolsonaro entregou somente 400 títulos definitivos.
Ao longo da tarde, diversos ataques ao MST e à luta pela terra foram proferidos: ameaças de morte, extorsão, lesão corporal, etc. No entanto, em nenhum deles foi apresentado algum tipo de comprovação dos fatos e das autorias. Nenhum boletim de ocorrência, inquérito ou processo criminal foi entregue à Comissão.
Contra os militantes do MST atacados, não corre nenhum inquérito ou processo criminal. Inclusive, estes já ingressaram com denúncia junto à Polícia Civil da Bahia pelos crimes de calúnia e difamação praticados durante a sessão. Os ataques de invasão à domicílio apresentados na sessão desta terça-feira foram denunciados à época pelo próprio Movimento Sem Terra, o qual exigiu investigação e elucidação dos crimes praticados.
O MST reafirma seu compromisso na luta de quase 40 anos pela terra e pela Reforma Agrária. É a luta realizada pelas famílias Sem Terra em todo país, que garantiram o assentamento de mais de 450 mil famílias em 24 estados.
A organização do MST na Bahia permitiu o assentamento de 13 mil famílias, em 168 assentamentos, presentes em 121 municípios. Estas conquistas sintetizadas em números permitem hoje a organização de 15 cadeias produtivas principais, entre elas, arroz, café, frutas, cacau, leite e mandioca. Na pandemia, as famílias Sem Terra do estado doaram 342 toneladas de alimentos e mais de mil litros de leite à população baiana mais carente.
[...]
O MST lamenta o baixo nível e a falta de legitimidade desta CPI, que é usada por setores do agronegócio e da extrema direita para atacar a legitimidade da luta pela terra e a moral das famílias Sem Terra. Usar a Comissão como palco para agitar sua base social e deslegitimar a luta pela terra, na tentativa de encontrar um caminho para a criminalização da Reforma Agrária é um desserviço à sociedade brasileira".