O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, nesta quarta-feira (30/8), o julgamento do marco temporal. A tese restringe as demarcações das terras indígenas àquelas ocupadas em 5 de outubro de 1988, dia da promulgação da Constituição Federal. A proposta é criticada por lideranças indígenas e ambientalistas — pois afirmam que além de dificultar o processo demarcatório, essa medida libera a exploração econômica dos territórios. O placar no STF está 2 x 1 contra o marco temporal.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) está organizando uma mobilização nacional contra a tese. São esperados cerca de 650 indígenas em Brasília. "As organizações que compõem a Apib, mobilizaram no período de maio e junho mais de 129 manifestações em 21 estados, incluindo o Distrito Federal", informa a Apib. O julgamento está previsto para ser retomado no STF às 14h.
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O STF reservou espaço para que 60 lideranças indígenas acompanhem o julgamento dentro do plenário da Corte. Além disso, na parte externa do prédio haverá um telão para que outros povos originários acompanhem a transmissão da votação. “Empresários e parlamentares do agronegócio estão pressionando, mas o movimento indígena não irá recuar. Estamos convocando todos os parentes e parentas, não indígenas, organizações parceiras e artistas para juntos construirmos uma grande mobilização permanente em Brasília. Vamos ocupar todos os espaços e pressionar para que o marco temporal seja derrubado de uma vez por todas”, diz Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib.
O julgamento
O julgamento do marco temporal no STF está paralisado no STF desde 7 de junho, quando o ministro André Mendonça pediu vista, isto é, mais tempo para analisar. Até então, os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes votaram contra a tese, enquanto o ministro Nunes Marques se manifestou a favor. Entretanto, há diferenças nos votos de Fachin e Moraes. Isso porque o ministro Alexandre apresentou uma “tese meio termo’’ que pressupõe que proprietários rurais poderiam receber indenização do Estado pela terra, diante da desapropriação para demarcação. Esse aspecto do voto do magistrado foi criticado por entidades e lideranças indígenas. "Direitos não podem ser negociados", pontua a Apib.
Outro fator que causa preocupação é o voto do ministro Cristiano Zanin — recém indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso porque o magistrado votou contra a descriminalização do porte de maconha para consumo próprio e também se manifestou contrário ao reconhecimento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) sobre violência policial contra os povos guarani e kaiowá no Mato Grosso do Sul.
Na terça-feira (29/8), a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, se encontrou com Zanin para conversar sobre o marco temporal. "Durante o encontro, conversamos sobre o que vem sendo feito desde o início do ano pelo ministério, os desafios encontrados e as ações previstas para os próximos meses. Também declarei minha preocupação com a votação sobre o Marco Temporal, expondo os motivos pelos quais o tema é tão prejudicial aos direitos dos povos indígenas. Reforcei, ainda, que o STF é fundamental para a defesa e garantia dos direitos constitucionais dos povos indígenas", escreveu a ministra, nas redes sociais.
O que é marco temporal?
No STF, a análise sobre a demarcação de terras indígenas começou em 2019, com o reconhecimento da existência de repercussão geral do Recurso Extraordinário 1.017.365, que discute uma reintegração de posse movida contra o povo Xokleng, em Santa Catarina. A decisão tomada no julgamento do recurso terá consequência para todos os povos indígenas do país.
"A Apib aponta que a tese é inconstitucional e anti-indígena, pois viola o direito originário dos povos ao território ancestral – previsto na própria Constituição – e ignora as violências, em especial da ditadura militar, e a tutela do Estado a que os povos foram submetidos até 1988. Antes disso, inúmeros povos foram forçados a sair dos seus territórios e não tinham autonomia para lutar judicialmente por seus direitos", ressalta a Apib.
Setores do agronegócio defendem a tese, pois afirmam que ela poderia garantir maior área para atividades econômicas. Em junho, o relator especial da Organização das Nações sobre Direitos dos Povos Indígenas, José Francisco Calí Tzay, se manifestou pela rejeição do marco temporal. De acordo com ele, a validação da tese poderia “colocar todas as 1.393 terras indígenas sob ameaça direta”.
O coordenador do setor jurídico da Apib, Maurício Terena, foi a Genebra, na Suíça, para reforçar o posicionamento da ONU sobre o tema. “Solicitamos uma manifestação das Nações Unidas para que qualquer tentativa de conciliação que restrinja o direito dos povos indígenas à terra seja ressaltado que isso é uma violação aos tratados internacionais de direitos humanos aos quais o Brasil é signatário", disse.
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