Nas Entrelinhas

Análise: Ciro Nogueira é o espinho que impede acordo de Lula com Lira

Centrão articula um manifesto de apoio à reforma administrativa por meio de frentes parlamentares ligadas a setores empresariais

O senador Ciro Nogueira é presidente do PP -  (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
O senador Ciro Nogueira é presidente do PP - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Luiz Carlos Azedo
postado em 24/08/2023 03:55

O espinho nas mãos do PT que impede o acordo entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chama-se Ciro Nogueira, o presidente do PP. Lira pleiteia o Ministério do Desenvolvimento Social para o deputado Fufuca (PP-MA), mas a mudança de posição do ministro Wellington Dias (PT-PI) enfrenta resistência na bancada do Senado, principalmente do líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), solidário com o ex-governador do Piauí, que é um senador licenciado. Isso fortaleceria Nogueira num estado onde Lula obteve uma das suas maiores vitórias.

Entretanto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aposta na manutenção do entendimento entre Lula e Lira e destaca o novo arcabouço fiscal. "Encontrou-se um denominador comum entre forças que pareciam antagônicas na direção de um entendimento sobre uma regra fiscal que desse à sociedade brasileira como um todo — aos investidores, aos contribuintes — a certeza de que nós estamos com uma economia que caminha para um equilíbrio do ponto de vista fiscal", destacou.

Enquanto Haddad avaliava positivamente a aprovação do novo arcabouço fiscal na Câmara dos Deputados, Lira reiterava a intenção de promover uma reforma administrativa que estava no congelador desde 2020. A PEC da reforma administrativa foi enviada à Câmara em 2020, durante o governo Jair Bolsonaro, para mudar a estrutura da administração pública.

O projeto estava sendo articulado por Paulo Guedes, mas foi para o freezer após a ida de Ciro Nogueira para a Casa Civil do governo Bolsonaro. Agora, a proposta ressuscita. Centrão articula um manifesto de apoio à reforma administrativa por meio de frentes parlamentares ligadas a setores empresariais, entre as quais a do Empreendedorismo (FPE), do Comércio e Serviços (FCS), do Brasil Competitivo (FBC) e da Agropecuária (FPA).

"A reforma administrativa é fundamental, ainda mais depois da aprovação do marco fiscal, em que há muito mais esforço do governo em aumentar gastos do que em cortar custos", afirma o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA. Na segunda-feira, num evento em São Paulo, Lira disse que é preciso "discutir despesas, já que não podemos aumentar impostos". É música para os ouvidos do mercado.

A proposta de reforma administrativa está praticamente pronta, por meio da PEC 32, que manteve a estabilidade para servidores concursados, mas tem inovações como redução de jornada de trabalho e de remuneração em momentos de crise fiscal, avaliação de desempenho com possibilidade de perda de cargo e estágio probatório para recém-concursados. Essa proposta estressa as relações com o PT, que tem forte presença de líderes sindicais e parlamentares ligados a servidores públicos.

Equilíbrio fiscal

A aprovação do arcabouço fiscal foi uma grande vitória para o governo Lula e fortaleceu a posição do ministro Haddad, mas há uma correlação de forças majoritariamente conservadora na Câmara, principalmente nas questões fiscais e tributária. Haddad quer administrar o ritmo do reequilíbrio fiscal, o que dependerá do Orçamento da União. O equilíbrio das contas públicas, segundo o ministro, permitirá que o Brasil, na situação geopolítica que se encontra, possa fazer valer as suas vantagens competitivas em relação aos demais países e possa acelerar sua taxa de crescimento, que anda muito baixa há mais ou menos 10 anos. Na avaliação de Haddad, o Brasil precisa crescer acima da média mundial, com sustentabilidade. "Somos um país de renda per capita, medida por paridade de poder de compra, ainda muito baixa na comparação com países com igual potencial."

Com o objetivo de aumentar a arrecadação, o governo negocia com os presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, a aprovação de uma medida provisória para taxar as offshores. A ideia é instituir uma cobrança semestral de imposto de renda sobre os rendimentos dos fundos exclusivos. A expectativa é arrecadar cerca de R$ 10 bilhões por ano. Haddad quer elevar a arrecadação para cobrir a correção da tabela do Imposto de Renda e ajudar a zerar o deficit público em 2024.

O ministro pediu que o Congresso espere até dezembro, quando deverá estar aprovada a primeira fase da reforma tributária, para discutir a renovação da desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia, cuja relatora, deputada Any Ortyz (Cidadania-RS), está com o relatório pronto e deve ser votado na próxima terça-feira.

A reforma da Previdência impediu a renovação de incentivos fiscais que tenham impacto sobre a arrecadação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sem especificar a fonte de recursos que compensem as medidas. "Temos um problema aí, e eu pedi tempo para tentar resolver da melhor maneira possível", disse Haddad.

 

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