Réu numa ação penal na Justiça do Distrito Federal, acusado de cometer injúria racial contra a atendente de uma pizzaria em Brasília, fato em novembro de 2020, o advogado Frederick Wassef, até hoje, não foi sequer citado no processo. A citação é o início da ação propriamente dita, quando o acusado toma ciência de que é alvo da Justiça.
Essa operação virou uma saga para a Justiça e para o Ministério Público. Foi preciso sua citação por edital, publicado pelo Diário da Justiça, o que ocorreu em fevereiro deste ano, com vista dada ao Ministério Público há duas semanas. O advogado segue sem se manifestar a respeito do caso.
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O fato ocorreu em 8 de novembro de 2020. Frederick Wassef foi acusado pela funcionária Danielle da Cruz Oliveira, à época funcionária de uma pizzaria, no Píer 21, em Brasília, de tê-la ofendido, de ter sido chamada de "macaca" e de ouvir do cliente que "você come o que te derem". Ao menos uma testemunha, um gerente da loja, confirmou a acusação da mulher.
Wassef negou e também abriu um boletim de ocorrência, argumentando ter sido alvo de "denunciação caluniosa", que não mantinha boa relação com esse gerente e que era perseguido por "ser o advogado do (então) presidente da República", Jair Bolsonaro. No entanto, sua denúncia não prosperou.
Sem endereço
A Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra Frederick Wassef em 17 de fevereiro de 2022 e, desde então, houve uma mobilização para tentar citá-lo, mas sem sucesso. A ação penal registra diversas diligências de oficiais, feitas em vários endereços do advogado em São Paulo, para entregar a citação.
Diante de seu "paradeiro incerto e não sabido", segundo a Justiça e o MP, houve um pedido de uma promotora para que fosse vasculhado o sistema penitenciário para apurar se o advogado não estava preso, então.
Endereços dele foram buscados também nos registros da Receita Federal e na Justiça Eleitoral. Nem mesmo o escritório de advocacia que o defende na ação, o Lopes e Versiani Advogados, informou seus contatos. Em novembro de 2022, a empresa respondeu "não ter notícias de Wassef desde outubro de 2021".
O advogado de Bolsonaro foi candidato a deputado federal pelo PL, ano passado, e nem assim foi localizado. Ele obteve 3.628 votos e não se elegeu. "O réu é candidato a deputado federal, o que pode facilitar sua localização", acreditou o MP, em agosto de 2022.
As cartas precatórias emitidas pela Justiça para ouvi-lo em São Paulo voltavam sem sucesso. Os oficiais de Justiça que fizeram várias tentativas relataram: "localização não foi exitosa, evidando esforços a fim de apontar seu paradeiro para fins de citação", "diligência realizada sem sucesso" e certidão de "mandado cumprido negativo", e o "réu é ali desconhecido".
No relatório de diligências anexado ao processo, nem mesmo o número do aparelho celular de Wassef aparece como sendo ele. "Por meio do aplicativo WhatsApp, o atual proprietário do prefixo móvel (número tal), informou-me que esse número não pertence mais ao requerido", relatou o oficial. O número do telefone é sim o utilizado por Wassef, aparelho que pode ter sido alvo de busca e apreensão da Polícia Federal na semana passada.
Esgotado todos os meios de alcançar Wassef, o Ministério Público solicitou e o juiz Omar Dantas Lima, da 3ª Vara Criminal de Brasília, atendeu a solicitação de que seu nome fosse consultado entre a lista de presos. Isso ocorreu em fevereiro de 2023.
"Consulte o sistema Penitenciário do DF no intuito de verificar se o acusado encontra-se preso". E determinou também "dar um Google (uma busca) com aspas no seu nome para saber seu paradeiro". Certificou-se de que ele não estava detido. E a conclusão: "Frederick Wassef está em lugar incerto e não sabido".
Em fevereiro deste ano, então, o juiz publicou edital no Diário de Justiça citando Wassef e concedeu prazo de dez dias para sua manifestação, o que não ocorreu. Seu silêncio implica na suspensão do processo e do prazo prescricional. Há duas semanas, a justiça solicitou manifestação do Ministério Público. Na denúncia, o órgão acusa o advogado de injúria racial, da prática de discriminação e preconceito de raça, de injúria e violência.
Outro lado
O Correio entrou em contato com o escritório Lopes e Versiani Advogados, que informou não ter mais vínculo com Wassef, que o compromisso com ele era de atuar apenas na fase do inquérito e não na ação penal. De qualquer maneira, o nome dos advogados aparecem no edital de citação publicado pela Justiça.
A reportagem não conseguiu contato com Frederck Wassef. Foi enviada uma mensagem no seu aparelho de celular, número pelo qual o Correio já havia trocado mensagens com o advogado, mas não houve resposta. Foram encaminhados também e-mails para ele, nos seus endereços que aparecem no processo e feitas ligações para alguns números de telefones que constam nos autos. A espaço segue aberto para manifestações.
No início do caso, a defesa de Wassef apresentou uma petição colocando o cliente à disposição das autoridades, mas desde que ele fosse por carta precatória, em São Paulo. Numa de suas manifestações, a defesa afirmou que a denúncia que fez contra a funcionária da pizzaria "não mereceu qualquer atenção do delegado".
Nos autos, ele nunca apresentou sua defesa. A Justiça e o MP entenderam que seu proceder o tempo todo foi "protelatório". O argumento é que nem todas as testemunhas foram ouvidas, que não foram feitos esforços para serem ouvidas seis pessoas. E argumentou sua defesa, em petição de novembro de 2021. "O que está por trás de tudo isso é perseguição por ser advogado do presidente da República".
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