A frente partidária que elegeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma coalizão de centro-esquerda que propunha uma maior participação de mulheres e negros, e propunha uma gestão eminentemente técnica, aos poucos toma uma nova forma. Cede espaço a aliados de ocasião e, até mesmo, abre a possibilidade de incluir no time bolsonaristas recém-convertidos, que buscam desfrutar do bônus de estarem, novamente, próximos dos cofres da União. Quase oito meses depois, o governo se rende ao pragmatismo político em busca da maioria no Congresso — e do isolamento do radicalismo da extrema direita no Parlamento — e inclui representantes do Centrão no primeiro escalão.
No programa Conversa com o Presidente da semana passada, Lula foi explícito ao defender a entrada de mais partidos do Centrão no governo. Mas tenta manter algum limite no "toma lá (cargo) da cá (apoio)" ao avisar aos postulantes que "não é o partido que escolhe o ministério". "Não quero conversar com o Centrão enquanto organização. Quero conversar com o PP, quero conversar com o Republicanos, quero conversar com o União Brasil", afirmou.
Isso não quer dizer, porém, que o presidente prescindirá da presença do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), nas negociações que envolvem cargos e apoios. Na quinta-feira, o presidente conversou com o deputado e apontou que deve agilizar, nesta semana, na volta aos trabalhos do Legislativo, uma conversa com líderes do PP e do Republicanos sobre as trocas ministeriais. A pressa se justifica: além da votação, na Câmara, das alterações feitas pelo Senado no arcabouço fiscal e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo precisa aprovar a medida provisória que atualiza os valores da tabela mensal do Imposto de Renda e taxa os rendimentos no exterior das pessoas físicas residentes no Brasil.
Um parlamentar da base governista enxerga os movimentos de Lula como uma espécie de resposta às ofensivas do Centrão — que soltou vários balões de ensaio sobre os cargos que deseja ocupar no primeiro escalão. Segundo esta fonte, Lula estaria pretendendo mostrar que apesar de ceder cargos ao PP e ao Republicanos, e negociar novas vagas para PSD, União e MDB, manterá no governo aliados de primeira hora.
Ação e reação
Esse equilíbrio, porém, é precário e sujeito a ruídos. À ofensiva do Centrão, o PT recorreu à adaptação para a política da 3ª Lei de Newton da física — cujo enunciado diz que "a toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade". Dessa forma, conseguiu emplacar na presidência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística o economista Marcio Pochmann, ex-presidente da Fundação Perseu Abramo, que é ligada ao partido. O anúncio, feito pelo ministro da Secretaria de Comunicação, Paulo Pimenta, causou desagrado à ministra Simone Tebet, do Planejamento e Orçamento — pasta à qual o IBGE está subordinado. Apesar de ela dizer que "nada mais justo do que atender ao presidente", nos bastidores a ex-senadora reconheceu que a indicação foi, no mínimo, feita de maneira atrapalhada.
Também como forma de marcar território e equilibrar as forças diante do avanço do Centrão, o nome do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega voltou a frequentar as possibilidades de ser alocado em algum cargo de visibilidade no governo. Esta, porém, não é a primeira polêmica envolvendo o economista no atual governo: ainda durante a transição, deixou ruidosamente um dos grupos de trabalho porque, supostamente, estariam fazendo intrigas entre ele e outros então cotados para assumir postos no primeiros escalão — como a própria Tebet e o hoje ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
As especulações dão conta de que Mantega pode assumir a presidência da Vale. Apontado como um dos executores da chamada "pedalada fiscal" que serviu de pretexto ao impeachment da então presidente Dilma Rousseff, setores do Centrão vêm trabalhando com a insatisfação que a menção ao nome do ex-ministro provocou no mercado. E avaliam que o "cabo de guerra" contra os setores mais à esquerda do governo está apenas começando. (Colaborou Fabio Grecchi)
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