Atos antidemocráticos

Silêncio de Cid na CPMI será alvo de denúncia no Supremo

Tenente-coronel se cala na sessão da comissão, irrita governistas e deixa oposição aliviada. Mas a ida de altos bolsonaristas à cadeia para vê-lo — lista divulgada na comissão inclui ex-comandante do Exército exonerado por Lula — chama a atenção

O depoimento do tenente-coronel do Exército Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro — um dos mais aguardados da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga a tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro —, não foi mais frustrante porque, diante do silêncio total e a recusa em colaborar, será denunciado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo descumprimento da determinação da ministra Cármen Lúcia. Ele não estava obrigado a responder indagações que o incriminassem, mas não estava impedido de falar sobre outros assuntos.

A irritação da CPMI com Cid ficou explícita depois que ele se recursou até a dizer a idade à deputada Jandir Feghalli (PCdoB-RJ). Neste momento, o presidente da comissão, Arthur Maia, interveio e alertou-o de que o colegiado representaria contra ele no STF.

Logo no início da sessão, Cid deixou claro que não colaboraria. "Considerando a minha inequívoca condição de investigado, por orientação da minha defesa, e com base na ordem do habeas corpus concedido em meu favor pelo Supremo Tribunal Federal, farei uso do meu direito constitucional ao silêncio", anunciou. O gesto indignou governistas e aliviou bolsonaristas.

A sessão não foi mais infrutífera porque a CPMI obteve a lista de visitas que Cid recebeu desde que foi preso, entregue pelo Ministério da Defesa. O tenente-coronel foi confrontado com uma relação de 73 visitas, segundo a relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA). O militar está recluso desde 3 de maio por suspeita de fraude em cartões de vacinação contra covid-19 de Bolsonaro, dele e de sua própria família.

Além de parentes, políticos e advogados, estiveram com Cid o ex-comandante do Exército Júlio César de Arruda — exonerado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 21 de janeiro por se recusar a impedir a efetivação do tenente-coronel como chefe do 1º Batalhão de Ações e Comandos, em Goiânia, unidade estratégica da Força; o ex-ministro da Saúde e deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ); o ex-secretário de Comunicação e advogado de Bolsonaro, Fabio Wajngarten; o coronel do Exército Jean Lawand Júnior, que enviou a Cid mensagens pedindo o golpe e que depôs à CPMI em 27 de junho; e o general e ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, Ridalto Lúcio Fernandes.

Farda

Vestido com o uniforme de tenente-coronel, segundo ele por orientação do próprio Exército, Cid foi convocado a prestar depoimento devido à troca de mensagens golpistas com Lawand. Eliziane ainda tentou convencê-lo a colaborar com a CPMI lembrando o fato de que estava fardado e, portanto, na ativa.

"O senhor, até em nome da farda que está vestindo, deveria, minimamente, nos dizer quem eram essas pessoas, porque o senhor estaria fazendo algo importante para as Forças Armadas que o senhor diz representar", exortou, sem sucesso.

Depois da sessão, ela disse que "até o fato de o depoente não falar é um elemento que a gente precisa considerar. É bem verdade que ele não trouxe nenhum fato novo para a comissão, até por conta de seu silêncio. Mas, ao mesmo tempo, aprovamos muitos requerimentos", salientou.

Segundo a senadora, na volta do recesso parlamentar o primeiro depoente a ser ouvido será o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro, Anderson Torres.

Deputados governistas ainda tentaram fazer com que Cid rompesse o silêncio ao ameaçarem convocar a mulher do militar, Gabriela, porém não foi apresentado requerimento para que compareça. Na sessão, foi lida uma sequência de diálogos entre ela e Ticiana Villas Boas, filha do general Villas-Boas, ex-comandante do Exército — quando falam abertamente que deveria ser dado um golpe no país. Gabriela também é investigada por adulteração de dados no cartão de vacinação.

Da parte produtiva da sessão, uma série de requerimentos de informação foi aprovada. Entre eles, o pedido de quebra de sigilo de Cid e de George Washington de Oliveira Sousa, empresário condenado pela tentativa de atentado a bomba, em 24 de dezembro de 2022, nas proximidades do Aeroporto de Brasília. Já os pedidos de convocações para novas oitivas ficaram de ser analisados na volta do recesso.

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