Fetiche da extrema direita, a 26ª edição do Foro de São Paulo — que reúne partidos e organizações políticas de esquerda dos países da América Latina, começou morna, em um hotel do centro de Brasília. Promovida por PT e PCdoB, a edição deste ano teve início com um seminário sobre a integração latino-americana e caribenha e os desafios de países com governos progressistas, antes mesmo da solenidade oficial de abertura, no fim do dia, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ao longo do dia, delegados de vários países se revezaram ao microfone diante de um plenário esvaziado. Mais da metade das cadeiras disponíveis estava vazia. O seminário terminou com um discurso do representante do Partido Comunista da China, que apoia o foro há mais de duas décadas.
No acanhado hall de entrada da área de eventos, três bancas vendiam broches, camisetas e livros ligados ao PT e a pautas progressistas. Do lado de forma, apenas o policiamento reforçado no Setor Hoteleiro Sul e uma UTI móvel indicavam que havia algum evento no local. Mas as forças de segurança não tiveram trabalho nem com a pequena manifestação de ao menos 15 pessoas, no início da manhã, contra o governo da Venezuela, que durou poucos minutos.
Do lado de dentro, palavras de ordem como “fora o imperialismo ianque” ou “pela unidade da América Latina” davam o tom das cores ideológicas presentes.
Para a imprensa, poucas informações estavam disponíveis. Procurada pelos jornalistas após o seminário, a secretária-executiva do foro, Mônica Valente, não quis dar entrevista. Disse apenas que as informações estariam no site oficial do evento. Mas não foram disponibilizados dados sobre número de delegações, quantos países e partidos mandaram delegados ou os custos da organização. Nesta sexta-feira, estão previstos encontros de mulheres e de jovens, além de um “colóquio” sobre a situação brasileira e as políticas do governo Lula.
Saiba Mais
O Foro de São Paulo foi criado em 1990, por iniciativa do PT e do então presidente de Cuba, Fidel Castro. O objetivo era reunir agremiações de esquerda dos países da América Latina e do Caribe para promover ações articuladas de oposição ao neoliberalismo que orientava a maioria dos governos da época no continente.
A partir daí, o foro vem se reunindo periodicamente para reforçar a união das legendas progressistas. Como é um palanque em que governos, como os de Cuba, Venezuela e Nicarágua, têm voz e representatividade, o evento virou um dos alvos preferenciais de partidos e políticos ultraconservadores, não só do Brasil como de outros países.
Desde a campanha eleitoral de 2018, o Foro de São Paulo é definido pelo agora ex-presidente Jair Bolsonaro — e amplificado em redes sociais por seus apoiadores — como um “grupo totalitário de esquerda”, formado por “comunistas” e criado “para dominar a América Latina”.
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Abandono
Alguns partidos de esquerda do Brasil decidiram deixar o foro nos últimos anos, como o PSB (do vice-presidente Geraldo Alckmin) e o Cidadania (que herdou a estrutura do Partido Comunista Brasileiro).
No caso do Cidadania, a legenda mantém, na página principal do site, um texto que cita os motivos que levaram a agremiação a deixar o grupo, em 2004. Diz que houve supressão “cada vez maior do debate e do pluralismo de ideias no campo das esquerdas latino-americanas com o hegemonismo das concepções bolivarianas antidemocráticas e populistas, e com um excessivo, e para nós abusivo, protagonismo do trio Fidel Castro-Hugo Chaves-Lula”.
O PSB decidiu deixar o foro em 2019, manifestando “repúdio às violações de direitos humanos observados na Venezuela e descritas no relatório da Alta Comissária das Nações Unidas para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, como típicas de regimes autoritários”, segundo nota oficial da legenda, que apoia o fortalecimento de uma outra organização com fins semelhantes, a Coordenação Socialista Latino-Americana (CSL).
Em vídeo divulgado nesta semana, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), rebate as críticas e declara que o foro “é uma organização que nasceu para lutar pela democracia, soberania e justiça social na América Latina e no Caribe”. Para ela, o que há é uma campanha da extrema direita para desqualificar o grupo. “É por isso que o Foro de São Paulo é alvo, desde sempre, de uma permanente campanha de mentiras e desinformação movida por agentes da extrema direita e daqueles que se beneficiam da histórica desigualdade e injustiça em nossa região”, ressaltou a dirigente partidária.