Regulação redes sociais

'Sem as redes sociais, Trump e Bolsonaro não seriam eleitos', diz Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, Ian Bremmer faz alerta sobre necessidade de regulação nas plataformas de redes sociais e disseminação de informações para evitar autoritarismos de governantes

São Paulo – Os avanços tecnológicos deram grande poder às redes sociais e transformaram a disseminação das informações pelo mundo — independente delas serem verdadeiras ou falsas. Em países onde essas plataformas tecnológicas são controladas por governos autoritários, por exemplo, os governantes ficam mais fortalecidos, diz o cientista político norte-americano Ian Bremmer, presidente e fundador da consultoria de risco político Eurasia Group e da GZERO Media, empresa dedicada a fornecer cobertura independente de assuntos internacionais.

“Enquanto isso persistir, vamos ver as democracias enfraquecendo”, alertou o analista, nesta quarta-feira (28/6), durante o painel A geopolítica, os impactos socioeconômicos e o Brasil no cenário internacional, no segundo dia do Febraban Tech, em São Paulo, maior evento de tecnologia bancária da América Latina.

Bremmer defendeu a necessidade dos governos ficarem mais atentos a esse poder das plataformas de redes sociais e o tipo de informação que elas disseminam, porque, “se não fossem as redes sociais, nem o ex-presidente dos EUA Donald Trump, nem o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro teriam sido eleitos”. “Agora, estamos em um caminho para consertar isso e vamos precisar de uma nova forma para engajar os cidadão”, afirmou ele após ser questionado pelo mediador do painel Maurício Minas, integrante do conselho de Administração do Bradesco, sobre os riscos à democracia.

Incertezas geopolíticas

De acordo com Bremmer, as incertezas dos mercados por meio da geopolítica podem ser resumidas em três aspectos: 1) A Rússia não foi integrada no mundo ocidental após o fim a União Soviética e o fato é que a Rússia é muito poderosa e não gosta do ocidente. 2) A China foi integrada dentro das instituições globais e tornou-se mais poderosa e rica; e os Estados Unidos ainda não estão preparados para os conflitos com a China. 3) Estamos vendo líderes nas democracias que não representam a maioria das pessoas e, por isso, as democracias estão se enfraquecendo. “Por isso vimos eventos como o 6 de janeiro nos EUA e o de 8 de janeiro aqui no Brasil”, afirmou. “Estou vendo a democracia mais cautelosa”, emendou. Ele destacou que isso não tem a ver com os líderes atuais, mas com “desafios estruturais” vindo, há décadas, em vários países.

Uma certeza, na avaliação de Bremmer, diante do conflito com a Rússia na Europa, é que o preço das commodities e dos fertilizantes vão voltar a subir. Segundo ele, os países europeus e os Estados Unidos querem armar a Ucrânia para derrotar o presidente Vladimir Putin — que sofreu um abalo doméstico com a rebelião do Grupo Wagner, de mercenários, na semana passada — é que, após o aumento das sanções, haverá mais tensão na Europa até que a Rússia seja derrotada.

O presidente do Eurasia Group destacou que estamos vendo o mundo polarizado e as sociedades reclamam do status quo, pendendo para a extrema direita ou para a extrema esquerda. "O mundo precisa recuperar o poder para eleger pessoas que possam proteger e servir os cidadãos, mas que não sejam populistas”, afirmou.

Em relação à indignação de parte da população com o descaso ao meio ambiente, principalmente dos europeus mais jovens — que estão indignados por herdarem o risco climático por conta do desmatamento –, o analista afirmou que a transição energética ainda é bem compreendida entre os países G7 – grupo das sete economias mais industrializadas do mundo composto por Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Canadá e Itália – mas não é bem compreendida entre os integrantes do G20 – grupo das 19 economias mais desenvolvidas e emergentes do planeta mais a União Europeia. Ele disse que “a próxima geração da Europa está muito brava” com a essa realidade de que é preciso investir na transição para economia de baixo carbono. “A boa nova é que as novas tecnologias estão se tornando muito mais baratas e muitos subsídios podem permitir um impulso. Mas esse papo vai ser feio, porque o G20 não está alinhado. Mas o G7 sim”, disse.

O comentar sobre a mudança de governo e o aumento da confiança de investidores estrangeiros no Brasil, Bremen é categórico. Além de ser uma economia melhor estruturada entre os emergentes, o Congresso brasileiro não muda com a mesma velocidade do chefe do Executivo. “O investidor aposta mais no Brasil porque, mesmo que seja mais caro do que em outros lugares, o processo legislativo não se movimenta muito”, afirmou.

Globalização

Ian Bremmer não vê muitos avanços na globalização antiga, como era conhecida, mas em um novo processo, uma espécie de globalização 2.0. “A globalização atingiu um platô. Não é mais conduzida pelos Estados Unidos, independente se o comando do país é democrata ou republicano”, afirmou Bremmer. “A globalização continua andando, mas não é mais impulsionada pelos EUA e seus aliados”, afirmou.

E, nesse sentido, o nearshoring não será uma volta das indústrias aos seus países-sede, como era defendido pelo ex-presidente Donald Trump. “Não vamos ver muito nearshoring, mas políticas industriais. Não é preciso mão de obra como no passado. Temos a robótica, o e-learning e a Inteligência Artificial. Não precisamos estar mais onde o mercado está, e nem tantos empregos como é preciso no mundo em desenvolvimento”, destacou ele em referência à estratégia dos EUA. Bremmer citou dois fortes parceiros comerciais dos Estados Unidos, como o México e a Índia, que, hoje, tem mão de obra mais barata do que a dos chineses.

Inteligência artificial

O avanço tecnológico, na avaliação do presidente do Eurasia Group, vai ser importante para o desenvolvimento da bioeconomia e também da inteligência artificial (IA) – um dos principais temas dos debates no evento da Febraban – , que poderá ser mais benéfica do que maléfica, podendo gerar mais empregos do que roubar.

Na avaliação dele, a IA vai ser uma tecnologia transformadora se pegar modelos preditivos e aplicar os algoritmos de um conjunto de dados em ciência para medir, em tempo real, como o mundo funciona, e, no caso de desmatamento, descobrir onde está acontecendo, assim como o desperdício.

Contudo, ele faz um alerta sobre a falta de regulação para o uso dessa tecnologia que está deixando muitos governos intrigados, mas que estão chegando atrasados nessa tendência. O analista explica que acha que as crianças de até 16 anos não podem ter acesso a essa tecnologia sem supervisão de adultos. “As crianças vão ser criadas por algoritmos inumanos. Não serão criadas de forma natural. E os governos não estão preparados para isso”, alertou.

*A jornalista viajou a convite da Febraban

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