JUDICIÁRIO

Candidato a vaga no STJ inclui cardápio de drinks no currículo para o cargo

O advogado concorre à uma indicação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para o STJ. A entidade define a sêxtupla, nome dado a lista de indicados pela OAB para concorrer à vaga no STJ, nesta segunda

Um dos favoritos a uma das seis vagas na lista de indicação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o advogado Márcio Fernandes anexou, na ficha de inscrição que deveria comprovar o saber jurídico, um cardápio de drinks de um evento de uma empresa de "projetos culturais" que firmou contrato para prestar serviços. O cardápio estava entre a descrição dos contratos feito com essa e outras instituições e o advogado detalhou o cardápio em uma lista sobre as bebidas oferecidas na ocasião. Entre as bebidas estavam caipirinhas "nativas" com cupuaçu, graviola, jabuticaba, tamarindo, maracujá e outras frutas, nas opções com vodca, saquê, e cachaça. 

As informações são do O Estado de S. Paulo. Na seção do cadastro em que Márcio anexou o cardápio, o candidato deve incluir documentos que provem seu saber jurídico. Além do inusitado cardápio do evento, o advogado Márcio Fernandes exemplificou ter firmado contratos com a Souza Cruz, empresa especializada na fabricação de cigarros na qual ele foi diretor jurídico. Márcio Fernandes foi um dos 33 inscritos na disputa da OAB.

Desses, apenas dois candidatos tiveram o currículo impugnado formalmente antes do processo de votação. Fernandes foi um deles. Os documentos que ele anexou na inscrição provocaram estranhamento em conselheiros federais que vão votar a lista sêxtupla — e até mesmo em ministros do STJ que acompanham o processo. O currículo e a candidatura do advogado foi questionado por Roberto Aguiar Farias, advogado do DF e e dono de um escritório no Cruzeiro. Ele afirmou que o cardápio anexado por Márcio é "imprestável para fins de comprovação de atos privativos de advocacia”. O mesmo ocorre, para ele, com comprovantes de atas de reuniões de sócios quotistas do tabaco.

Ainda assim, o nome dele segue, nos bastidores, como um dos favoritos à lista sêxtupla. Esses seis nomes serão enviados, nesta segunda-feira (19/6), ao STJ pelo Conselho Federal da OAB. A corte, então, elegerá três nomes para ser encaminhados ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que definirá o futuro ministro da Corte.

O currículo de Márcio Fernandes

De acordo com informações do Estadão, que teve acesso à íntegra da documentação apresentada pelo advogado à OAB., há centenas de páginas em que ele assina como procurador em atas de movimentações societárias da Souza Cruz.

Em outros documentos, que dizem respeito a movimentações internas da empresa, por exemplo, assina como procurador da Molensteegh Invest, sediada na Holanda — a empresa é controladora da British American Tobacco (BAT) no Brasil, segundo ele explica ao Estadão.

Ele listou resumos semanais que encaminhava internamente na empresa sobre mudanças de lei, decisões judiciais e medidas de governos latinos que pudessem ter algum impacto nos negócios da empresa. Também mencionava medidas adotadas para combater estas ações ou acompanhá-las.

Márcio Fernandes também mostrou uma série de contratos com empresas de consultoria e assessorias de comunicação e eventos com terceirizadas. Um dos contratos, com uma empresa de "projetos culturais", no valor de R$ 49 mil, é seguido de um longo orçamento para um coquetel para 100 pessoas em um quiosque no bairro da Gávea, Rio de Janeiro, com vista para o Corcovado.

Além da graduação em Direito, Márcio Fernandes exibe oito artigos em uma revista especializada da área, que não é ligada a universidades. O advogado deixou a Souza Cruz no fim de 2022, quando abriu seu escritório em Brasília para atuar em causas empresariais. Desde o período, investiu pesado na candidatura ao STJ, viajou o país e, assim como os candidatos mais robustos à vaga, contratou assessoria de comunicação.

Fernandes Responde

Ao Estadão, Marcio Fernandes afirmou que o "pedido de impugnação é uma tentativa espúria de corromper o processo democrático de escolha de representantes para o Poder Judiciário, previsto na Constituição Federal". "Essa terrível prática, infelizmente, se tornou bastante comum antes da formação de listas para indicação aos tribunais brasileiros. Não há, nas supostas denúncias, fatos compatíveis com a verdade". "São somente ilações propagadas com interesses escusos e que tentam atacar a reputação de um profissional respeitado no Brasil e no exterior, que construiu sua carreira com base em princípios morais e éticos", diz.

O advogado argumenta que é formado pela Universidade do Estado do Rio e que "possui 35 anos de atuação na área do direito, tendo ocupado relevantes cargos de âmbito jurídico nos setores de Defesa Aeroespacial, Químico, da Construção civil e do Tabaco". E, que foi "diretor jurídico da British American Tobacco por 27 anos, sendo parte desse período trabalhando na sede da empresa em Londres".

Ele diz ainda que "possui uma atuação efetiva e destacada na Ordem dos Advogados do Brasil, construída ao longo de anos, tendo sido Presidente da Comissão de Combate ao Mercado Ilegal e conselheiro federal da OAB, representando a seccional do Rio de Janeiro". "Toda essa trajetória, sem fatos que desabonem sua reputação pessoal e profissional, legitima plenamente o advogado Márcio Fernandes a participar do processo seletivo para formação da lista sêxtupla do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil", conclui.

Procurado, Luis Claudio Chaves afirma que o advogado Roberto Aguiar Farias ignorou artigos do estatuto da advocacia. Ele argumenta que milita na OAB há 21 anos e tem 9 anos na Defensoria Pública, além de ter sido procurador municipal e Diretor Jurídico da Presidência do Senado. "As certidões comprovam mais de 10 anos de advocacia pública. Além disso, foram comprovados vários anos de advocacia privada", diz.

*Com informações da Agência Estado

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