Judiciário

Na corrida pela PGR, Aras vai de rejeitado a favorito

Antes visto com bolsonarista, procurador cresceu no conceito de Lula e do PT por ter se realinhado com o atual governo

Passada a indicação para o Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se debruça, agora, sobre um nome para comandar a Procuradoria-Geral da República. O presidente avisou que não seguirá a lista tríplice elaborada pelas entidades de classe, mas ainda não deu pistas sobre o perfil que deseja para a PGR. A recondução do atual procurador-geral, Augusto Aras, vem sendo defendida por alas influentes do PT.

No começo do governo, ninguém apostava as fichas em Aras por conta da atuação, durante o governo Bolsonaro, claramente em favor do ex-presidente. E foi justamente por causa dessa fidelidade, no caso atual voltada na direção de Lula, que fez com saísse da condição de carta fora do baralho para ás do jogo.

Os defensores da indicação de Aras dentro do PT e do governo o veem, hoje, como um moderado. Segundo fontes consultadas pelo Correio, o perfil "garantista pró-governo" é interessante na atual circunstância política. O atual PGR fez uma dobradinha, no governo anterior, com a sub-procuradora Lindôra Araújo, que jamais escondeu as simpatias que tinha pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.

Aras começou a subir no conceito de Lula, do governo e dos petistas também por protagonizar um episódio inusitado, na abertura do ano do Judiciário, poucas semanas depois da tentativa de golpe dos bolsonaristas em 8 de janeiro. No Supremo Tribunal Federal, surpreendeu ao lembrar de um poema para saudar a democracia — e, por extensão, se alinhar ao governo.

"Como dizia o poeta à sua amada, e tinha que repetir todos os dias, 'eu te amo, eu te amo e eu te amo', para não se esquecer nunca do seu amor pela amada. Nós, cidadãos do Estado Democrático de Direito, precisamos dizer todos os dias: 'Democracia, eu te amo, eu te amo, eu te amo', porque essa democracia conquistada a duras penas exigiu sangue, suor e lágrimas", disse.

Outro ponto a favor de Aras é a posição sobre a Operação Lava-Jato. Ele a criticou dura a publicamente, em 2021, durante sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Disse que "no enfrentamento à criminalidade, o modelo de forças-tarefas (do Ministério Público Federal) apresentava uma série de deficiências".

Perfil discreto

O mandato do PGR termina em setembro. Lula e seus auxiliares mais próximos buscam um nome também pouco midiático. O recado é óbvio: alguém que seja o extremo oposto de Rodrigo Janot, que deu todo apoio à força-tarefa da Lava-Jato, foi um tormento para o governo Dilma e disse, em entrevista à Veja, em 2019, "não ter dúvidas" de que o atual presidente fosse "corrupto".

"Aras faz uma espécie de blindagem para a classe política. Uma figura com o estilo dele, e pelo histórico nos últimos anos, é uma barreira de contenção de eventuais processos", destaca o cientista político André César.

O analista político Melillo Dinis acha que as chances de Aras são altas por conta de uma característica: apoiar o governo de turno. "A preferência de Augusto Aras pelo adesismo é um padrão que encanta o presidente Lula. A procura é por um nome com o perfil do atual PGR e em condições de impor uma maior presença ao corpo dos procuradores da República, algo tão difícil quanto ilusório", ressalta.

Por outro lado, Fabio de Sá e Silva, professor de estudos brasileiros da Universidade de Oklahoma (Estados Unidos), avalia que o presidente não deve reconduzir o atual procurador-geral. "Aras deve ter todo interesse em se aproximar de Lula também para tentar diluir um pouco a imagem de bolsonarista, lavando sua biografia. Para Lula, a equação é, ou ao menos deveria ser, inversa: aproximar-se de Aras significa atrair para si o peso da omissão e da complacência com os absurdos que marcaram a gestão do atual PGR. Custa crer que Lula venha a fazer isso e macular sua Presidência", adverte.

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