Cerca de dois mil indígenas de comunidades de vários estados ergueram acampamento no centro de Brasília para protestar contra o marco temporal, em julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que pode impor derrota histórica aos povos originários e abrir territórios a várias atividades.
A tese, considerada inconstitucional, afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras se estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.
O julgamento trata de uma ação envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina.
Norivaldo Kaiowá, coordenador executivo da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), fez críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "O presidente não se posicionou para impedir essa votação do marco temporal nem da PL 490. Então, a gente esperava uma promessa que ele falou no acampamento, que ia ajudar na portaria declaratória e na parte de territórios, e acabou não saindo. E nós saímos prejudicados. A gente esperava que Lula, primeiro, reestruturasse o MPI (Ministério dos Povos Indígenas) e a Funai, para depois decidir sobre a demarcação."
Ele ressaltou que a violência contra os Guarani Kaiowá tem sido intensificada. "Para nós e para todo o povo indígena fica ruim se for aprovado. Para nós, povo guarani, a situação agora já está ruim. A gente sofre pelo ataque dos fazendeiros, ataque de pistoleiros, massacre da polícia, tivemos uma redução do nosso território de 10% para 0,2%, e a redução é muito grande. Se o marco temporal for aprovado, será totalmente genocida. Para todos os indígenas do Brasil", afirmou.
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Em nota, a Apib destacou: "A tese do marco temporal vai contra a vida e a justiça, abusa de uma cláusula pétrea da Constituição e se reflete como devastação em nossas matas e extermínio sobre nossas vidas".
Samela Sateré Mawé, comunicadora indígena da Apib e ativista climática, disse que o marco temporal põe em risco as terras dos povos originários. "Esse marco é genocida e foi encomendado pelo setor ruralista", frisou.
Durante o ato, os indígenas entoaram cantos típicos e palavras de ordem contra o PL 490. Cerca de 250 deles acompanharam a votação na Praça dos Três Poderes e outros 50 puderam entrar no plenário da Corte.
O deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), comentou que a derrubada do marco temporal pode gerar um "passivo gigantesco" ao direito de propriedade no Brasil.
No Congresso, o estabelecimento do marco temporal é uma antiga demanda da bancada ruralista e do Centrão. "O fim do marco temporal representa, talvez, um dos casos mais graves de insegurança jurídica e quebra ao direito de propriedade previsto na Constituição", enfatizou Lupion, ao Correio.
*Estagiárias sob supervisão de Cida Barbosa