A Polícia Federal realizou buscas em endereços ligados ao senador Marcos do Val (Podemos-ES), nesta quinta-feira, inclusive no seu gabinete do Senado. A operação não surpreendeu o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que foi avisado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), responsável pelo inquérito que investiga os atos golpistas de 8 de janeiro. Em Brasília e no Espírito Santo, foram apreendidos documentos, computadores, pen drives e, também, o celular do senador. Como membro da Comissão Mista de Controle dos Serviços de Inteligência, Do Val teve acesso e divulgou informações de documentos sigilosos do SNI, com o objetivo de incriminar autoridades do novo governo nos atos de vandalismo.
Um dos protagonistas da convocação da CPMI dos Atos Golpistas, Do Val foi para o olho do furacão do inquérito quando divulgou, nas suas redes sociais e em entrevistas coletivas, que teria se reunido com o ex-presidente Jair Bolsonaro e o ex-deputado Daniel Silveira para tratar de uma operação de inteligência na qual gravaria uma conversa comprometedora com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes. O objetivo seria afastá-lo das funções.
Como diria o Conselheiro Acácio, excêntrico personagem do escritor português Eça de Queiroz no romance Primo Basílio, "as consequências vêm depois". Os fatos citados pelo senador naquela entrevista, obviamente, teriam de ser investigados pela Polícia Federal: primeiro, a troca de mensagens por celular entre Do Val e Silveira; segundo, o encontro com Bolsonaro e Silveira; terceiro, o suposto encontro de Do Val com o ministro Moraes, na sede do próprio Supremo, no qual teria relatado as intenções golpistas.
Parecia uma denúncia contra Bolsonaro, envolvendo-o diretamente no caso da minuta de intervenção encontrada em poder do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Depois, Do Val mudou a versão, disse que participara de uma suposta operação de inteligência. A história foi contada de muitas maneiras pelo senador. Do Val é uma espécie de elo perdido no enredo dos atos de vandalismo praticados no dia da diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 18 de dezembro, e a depredação dos palácios da Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro. O fato de Bolsonaro não reconhecer a vitória de Lula e confirmar o encontro só reforçou esse entendimento.
Uma das características do fascismo é a obsessão por atribuir todos os eventos da história a conluios secretos. Bolsonarista, Do Val difunde teorias conspiratórias sobre o 8 de janeiro e cultiva uma imagem de super-herói de histórias em quadrinhos. Criado por um mestre japonês de Aikido, arte marcial na qual é faixa-preta 2º dan, depois de prestar serviço militar no Exército, no início dos anos 1990, fundou a CATI, empresa de segurança voltada ao treinamento avançado de policiais para emprego proporcional da força. Por meio dessa empresa, ministrou cursos e palestras e se tornou instrutor de unidades da polícia de Dallas, Texas, nos EUA, as famosas SWAT, no final dos anos 1990. Isso lhe deu prestígio entre os capixabas.
Selva
Ex-superintendente da Polícia Federal em Roraima, no Maranhão e no Amazonas, o delegado Alexandre Saraiva participou, nesta quinta-feira, de uma roda de conversa na Universidade de Brasília (UnB) sobre crimes ambientais, na qual apresentou seu livro Selva: Madeireiros, garimpeiros e corruptos na Amazônia sem lei (Intrínsica). Saraiva liderou a operação responsável pela maior apreensão de madeira ilegal da história do país; depois, apresentou ao STF uma notícia-crime contra o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (PL-SP), hoje deputado federal.
Saraiva acusou Salles de obstruir a fiscalização. O ministro havia questionado o trabalho policial e exigido que a carga de 226 mil m3 fosse devolvida aos madeireiros investigados. A resistência de Saraiva resultou na sua exoneração do cargo de superintendente regional. Ele também passou a receber mais ameaças de morte. Em Selva: Madeireiros, garimpeiros e corruptos na Amazônia sem lei, em coautoria com Manoela Sawitzki, Saraiva relata os bastidores de sua demissão e oferece uma radiografia da cadeia de relações escusas que sustentam o crime ambiental no país, com suas ramificações na política, na polícia e no Judiciário.
Saraiva é formado em direito pela Universidade Federal Fluminense, com doutorado em ciências do ambiente e sustentabilidade na Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas. Delegado da Polícia Federal há 19 anos, coordenou as operações Euterpe (RJ-2006), a Arquimedes (AM-2017) e a Handroanthus (PA-2020) — esta última responsável pela maior apreensão de madeira ilegal da história do Brasil.
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