Nova York — Num talk show durante o Brazil Summit, promovido pelo Financial Times, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi incisivo ao dizer que, sem o novo arcabouço fiscal, o tema mais urgente que a Casa tem para votar, "o país não terá uma diretriz e ficará no limbo". Porém, isso não significa que o texto passará sem alterações no Congresso.
Lira afirmou que a proposta tem uma "espinha dorsal razoável", mas que a Casa fará alterações, "deixando mais claro os enforcements para quando as metas não forem cumpridas". Ele frisou que essas obrigações ou execuções, que devem ser incluídas no texto, não serão impostas ao CPF dos funcionários, mas ao CNPJ do governo.
"O governo terá obrigações claras para quando as metas não forem cumpridas, se não forem cumpridas, o que acontece. Então, todas as nossas tratativas são para entregar um arcabouço em que o país tenha responsabilidade fiscal, não esquecendo a possibilidade da diminuição das desigualdades sociais", frisou.
Ao mesmo tempo em que participa de uma série de eventos em Nova York, o presidente da Câmara organiza a próxima semana, em Brasília, para a retomada da discussão do projeto das fake news e do próprio arcabouço fiscal, cujo texto será apresentado em breve pelo relator Cláudio Cajado.
Segundo Lira, Cajado está tratando das modificações com o próprio governo e os partidos. Quanto à redução das desigualdades, ele afirmou ser "uma tese que o governo defende e é próprio de cada governo democraticamente defender as pautas que encaminha no período eleitoral". "Mas acho que é possível fazer com que as duas tenham convergência de atacar as necessidades de um país ainda muito desigual, como o Brasil, mas não desconhecer os aspectos fiscais, de responsabilidade, de nunca gastar mais do que arrecada. Você tem ali os seus parâmetros, e o Congresso vai contribuir para que esse texto seja aprimorado", afirmou.
Tributária
Além do arcabouço, Lira reforçou a prioridade da reforma tributária, que considera uma oportunidade única para o país. "Essa discussão está sendo tratada com muita transparência e boa-fé. Nunca vi o Congresso tão empenhado na discussão desses temas", ressaltou.
No entanto, está cada vez mais claro que alguns setores terão tratamento vip nesse debate, sob pena de não se conseguir avançar. "Alguns setores serão tratados com especificidades? Penso que sim. E outros setores vão ter de entender que têm alguns setores que, ou são tratados com especificidades, ou não teremos votos para aprovar a reforma mais branda ou mais complexa", destacou.
A reforma administrativa — reclamada pelos setores privado e financeiro, que temem descontrole nos gastos — ficará na gaveta por mais algum tempo, porque não há um clamor popular para que seja votada. "Com tantas pautas econômicas, entrar com mais uma, sem apoio popular, a gente pode ter o risco de não aprovar nenhuma", argumentou.
Embora o texto esteja pronto para ir a plenário, o presidente da Câmara lembrou que, todas as vezes em que o assunto é tratado, acaba "sequestrado" por um "lobby muito bem articulado de sindicatos". Porém, se houver apelo popular, a proposta irá a plenário. Caso contrário — sustentou Lira —, "não dá para comprar 10 brigas de uma vez, senão você leva um murro e vai ao chão".
Por isso, a prioridade será para a tributária: "Se conseguirmos fazer uma reforma mais dura, com um prazo de transição maior, ou uma possível, com um prazo de transição menor, o Brasil já terá dado um passo para atrair investimentos. O Brasil precisa demonstrar que é um país, principalmente, com segurança jurídica para investimento. E essa segurança há de vir com uma tributação simples e definida."
Ele também fez questão de elogiar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: "O governo tem uma ideologia própria. O partido majoritário do governo é o PT. O ministro Haddad tem tido um comportamento elogiável, tem conversado muito, feito interlocução política diretamente com o Senado, com a Câmara. A equipe econômica tem dado demonstrações de que não vai pelo caminho do sectarismo, porque isso não vai levar a nada".
O que Lira deseja é retomar o protagonismo do Congresso em relação ao orçamento da União. Nesse sentido, ele repetiu o que havia dito no evento do LIDE. "Embora Lula esteja no seu terceiro mandato, é uma realidade completamente diferente de quando ele foi presidente das outras vezes. O Brasil de 2002 não é o de 2023. O que penso que tem de ter é uma mudança de temperamento do governo como um todo", sugeriu.