A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, deu, na semana passada, um dos passos mais importantes até o momento para a retomada de acordos de combate ao racismo a nível internacional. Em Salvador, ela assinou a retomada do acordo do Plano de Ação Conjunta para Eliminar a Discriminação (Japer, na sigla em inglês) com os Estados Unidos. O governo norte-americano foi representado pela embaixadora na ONU, Linda Thomas-Greenfield, que esteve entre terça e quinta-feira no Brasil.
Desde que assumiu, Anielle vem tecendo uma rede de acordos de combate ao racismo em suas viagens internacionais. Além dos Estados Unidos, a ministra esteve ainda em Portugal e na Espanha, onde firmou o mesmo compromisso.
Salvador foi escolhida como palco para a assinatura do Japer por ser a cidade mais negra fora do continente africano, e por ter sediado a formalização da primeira versão do pacto, em 2008. Anielle lembrou que o documento "ficou sem avanços por anos".
Ao comentar o acordo, ela também destacou o trabalho que vem fazendo com outros países. "O Brasil, a partir de todas as articulações internacionais, também vem se tornando uma referência de políticas pela igualdade racial", pontuou. Segundo a declaração conjunta divulgada pelos dois países, representantes de Brasil e EUA farão uma reunião em Brasília, em 23 de maio, para discutir de forma mais aprofundada os termos do acordo.
O Japer abarca os seguintes itens: cooperação entre universidades historicamente negras; o reconhecimento, pelos EUA, da Rede Internacional de Cidades Anti-Racistas, lançada pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes; apoio norte-americano a projetos brasileiros; e um esforço conjunto pela preservação do Cais do Valongo, na zona portuária do Rio de Janeiro. O governo de Washington também anunciou, no âmbito do acordo, um aporte de US$ 500 mil para inclusão de comunidades marginalizadas e carentes do Brasil.
Ao Correio, Linda Thomas-Greenfield afirmou que estava ansiosa pela retomada do acordo de cooperação contra o racismo. A embaixadora esteve em Brasília, onde conversou com autoridades, incluindo o chanceler Mauro Vieira, o assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Celso Amorim, e a primeira-dama Janja Lula da Silva. O tema do combate à discriminação racial esteve presente em todos os encontros.
"Este é um acordo que a ex-secretária de Estado Condoleezza Rice assinou com o Brasil há quase 15 anos. E nós duas concordamos que está na hora de ser revitalizado", explicou a diplomata. "Estamos ansiosos para trabalhar com o Brasil nessa questão. Aprendendo com a experiência daqui, mas também compartilhando a nossa experiência em lidar com o racismo", acrescentou.
A retomada do acordo foi uma demanda defendida pelo movimento negro. Anielle tratou do resgate do Japer, pela primeira vez, durante visita aos EUA, em fevereiro, ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Antes do encontro, ela recebeu um documento assinado por 11 entidades que representam o movimento negro, compilada pelo Washington Brazil Office (WBO).
Expertise
Em agenda na Europa, novamente acompanhando Lula, Anielle firmou acordos com Portugal e com a Espanha, que incluem a troca de conhecimento entre universidades, como dados em relação à população negra nos países e sobre os resultados de políticas públicas já aplicadas.
Segundo a ministra, o país tem experiência no combate ao racismo, apesar das dificuldades, e deve assumir a posição de liderança. "O Brasil está sendo pioneiro no combate ao racismo e na articulação para promoção da igualdade racial no mundo. Temos uma alta produção de dados para a formulação de políticas públicas, cuja experiência vamos compartilhar e distribuir com outros países", explicou.
Questionada sobre o papel que o Brasil está assumindo nessa questão, encabeçado por Anielle, Greenfield comemorou. "Com certeza! Quem criticaria um país por estar tomando uma posição contra o racismo? O racismo é algo realmente trágico, que enfrentamos em todo o mundo. Sou afro-americana, tive minhas próprias experiências pessoais, crescendo com o racismo nos Estados Unidos. Estou muito feliz que o Brasil está enfrentando essa questão", exultou.