Na corrida ao cargo mais alto do Ministério Público Federal (MPF), novos nomes se movimentam para entrar na lista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Quem está na frente da disputa, até o momento, no entanto, é o atual procurador-geral da República, Augusto Aras. A permanência dele, que antes parecia improvável, vem sendo defendida por alas influentes do PT, principalmente na Bahia e em São Paulo, por acreditarem que o PGR é um moderador.
Por outro lado, a atual vice-procuradora-geral da República, braço direito de Aras, Lindôra Maria Araújo, também se movimenta. Ela acenou ao governo, recentemente, e apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer apontando que o senador Sergio Moro (União-PR), ex-juiz da Lava-Jato, teria cometido o crime de calúnia contra o ministro da Corte Gilmar Mendes — a quem acusou de vender habeas corpus.
Lula já afirmou que irá abandonar a tradição de seguir a lista tríplice elaborada pelas entidades de classe. Até agora, o governo não chegou a consenso sobre outros possíveis postulantes ao cargo. O PT tem imensa preocupação com o Ministério Público e busca um PGR garantista, moderado e pouco midiático.
Segundo fontes ouvidas pelo Correio, Augusto Aras é visto como um perfil garantista para o governo. Outro ponto positivo é o posicionamento dele a respeito da Operação Lava-Jato. Ele já criticou publicamente a força-tarefa. Em 2021, durante sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o PGR disse que, "no enfrentamento à criminalidade, o modelo de forças-tarefas apresentava uma série de deficiências".
Nessa mesma sessão, os petistas votaram em peso para que Aras fosse reconduzido à função. Atualmente, ele também conta com o apoio do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, e do líder do governo no Senado, Jaques Wagner, ambos do PT da Bahia.
Já Lindôra, segundo fontes, é vista pelos aliados do presidente como conservadora, sem habilidades políticas para resolver conflitos internos e ligada ao bolsonarismo. No STF, ela foi responsável por se manifestar em várias representações feitas contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), principalmente na época da pandemia da covid-19, mas não levou os casos adiante por "não ver indícios de crime".
Outro nome que desponta é o do subprocurador-geral da República, Carlos Frederico Santos. Ele ganhou projeção por ações a respeito dos atos golpistas de 8 de janeiro. No MPF, é considerado moderado e com grande destaque para as próximas disputas. O subprocurador-geral da República Nicolao Dino também tem se movimentado para se cacifar como candidato a procurador-geral da República. Mas, mesmo sendo irmão do ministro da Justiça, Flávio Dino, Nicolao corre o risco de repetir o fracasso das tentativas anteriores, já que é ligado a Rodrigo Janot e foi defensor da Lava-Jato.
Do lado das entidades, aparece a subprocuradora Luiza Frischeisen, que foi eleita, em 2021, para encabeçar a lista tríplice para a sucessão do comando da PGR. No entanto, seu nome não é cotado pelo governo, pois, nos bastidores, os assessores de Lula consideram o perfil dela como muito midiático. A ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge (2015-2019) é outro nome falado nos corredores do Ministério Público, mas não é cotada devido ao vínculo com o ex-presidente Michel Temer (MDB).
Na avaliação do cientista político Melillo Dinis, Aras não deve ser reconduzido ao cargo, mas o PT deve escolher alguém com o perfil similar. "Se a lista interna já está longe das preocupações do Planalto, o desafio momentaneamente é buscar nomes enquanto se passa a esperança para Aras, um velho conhecedor do jogo da sucessão. Em síntese, até setembro não se terá nada diferente que uma disputa entre entendedores e entendidos em torno de um cargo de muita importância e extrema relevância para qualquer governo", disse.
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Tradição abandonada
Para o cientista político Leonardo Queiroz Leite, doutor em administração pública e governo pela Fundação Getulio Vargas (FGV), Lula terá de ponderar bem a decisão. "O presidente da República ao decidir uma indicação de peso como essa, muito influente, ele tem que prezar pelos princípios republicanos de tecnicalidade, de isenção, de imparcialidade e não tomar decisões com base em rancores pessoais."
Augusto Aras, atual PGR, termina o mandato apenas em setembro de 2023. Tradicionalmente, o PT cultiva a tradição de acatar a lista tríplice elaborada pelos procuradores do órgão. Mas, desta vez, Lula já afirmou que será diferente. A elaboração não é prevista na Constituição, mas é bem vista entre as entidades de classe.
Depois de ser escolhido pelo chefe do Executivo, o indicado ao cargo também deve passar por uma sabatina no Senado para receber o aval dos parlamentares, por meio da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O cientista político Rafael Rodrigues Viegas, doutor em administração pública e governo pela FGV-SP, tece críticas à elaboração da lista. Ele aponta a iniciativa como corporativista.
"Trata-se de um projeto político de uma corporação para dar poder a um grupo de procuradores políticos que barganham com os candidatos todos os tipos de vantagens corporativas no eventual governo. A lista não está prevista na Constituição Federal de 1988 e faz todo sentido que não esteja", ressaltou.
De acordo com a Constituição, o chefe do Ministério Público Federal "representa os interesses da União e fiscaliza a execução e o cumprimento da lei em todos os processos sujeitos a seu exame". O cargo é, dentre as indicações privativas do presidente da República, um dos mais estratégicos. Ele autoriza o ocupante a questionar a constitucionalidade de leis, pedir intervenção federal, entre outros encaminhamentos.
“O MP da União (MPU) não é o MP dos Estados. São quatro ramos no MP da União, como o MP do Trabalho, Militar e do DF, sendo um deles o MPF. Importante ressaltar que os procuradores da República, que integram o MPF, atuam em toda a cadeia alimentar de poder na federação. O PGR, chefe do MPU e do MPF, também preside o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Estamos falando, portanto, de muito poder, que pode inclusive afetar a governabilidade não de um Estado, mas no âmbito da União”, explicou Viegas.
O especialista acredita que o atual PGR não deve ser indicado novamente ao cargo. "Avalio ser muito difícil a recondução de Augusto Aras e a indicação de um nome tão próxima dele, como Lindôra Araújo, especialmente por tudo que foi presenciado em relação à atuação da PGR em diferentes áreas, sendo justas as críticas quanto ao controle ou inoperância do controle em relação ao governo Bolsonaro, gestão da pandemia, genocídio ianomâmi, e à sequência eventos, muitos destes contando com cúpulas hierárquicas militares das Forças Armadas, que culminaram no 8 de janeiro, e que precisam de responsabilização", destacou.
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