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Lula reitera busca de solução para guerra na Ucrânia

Presidente repete que Rússia não tinha direito de invadir Ucrânia, mas diz que paz é possível

Com o mote de retorno do Brasil ao mundo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi capa do jornal espanhol El País de ontem. Na entrevista ao diário, o chefe do Executivo abordou diversos assuntos, especialmente a posição do Brasil ante a guerra entre Rússia e Ucrânia, o combate ao extremismo no mundo e a destruição de biomas, como a Amazônia.

Lula reiterou a necessidade de que países intercedam pela paz entre russos e ucranianos, colocando o Brasil no centro da mediação. "A primeira coisa que temos de entender é que esta guerra começou porque, há muito tempo, perdeu-se a capacidade de diálogo entre os dirigentes mundiais", destacou. "A Rússia não tinha o direito de invadir o território ucraniano."

O presidente admitiu, no entanto, não ter caminhos definidos para que se atinja a paz. "Cada lado quer ganhar e, muitas vezes, uma guerra não precisa de vencedor. É só parar, chegar a um acordo e que todos voltem à normalidade. Creio que é possível", frisou. "Depois da Segunda Guerra Mundial, a construção da União Europeia é a prova dessa capacidade, da inteligência dos seres humanos. É possível entre Rússia e Ucrânia e, por isso, trato de fazer minha parte."

Ele ressaltou que vem dialogando com diversos líderes mundiais, citando diretamente os presidentes Xi Jinping, da China; Joe Biden, dos Estados Unidos; Emmanuel Macron, da França; e o chanceler alemão, Olaf Scholz, para tentar colocar um fim ao conflito.

"Acredito que a Europa tem o papel de mediadora, a Europa deveria fazer uma espécie de 'caminho do meio', e não fez. Ela se envolveu muito rapidamente. Acho, então que nós temos de encontrar as pessoas que querem falar sobre a paz. (...) Temos que envolver os países que não estão envolvidos diretamente ou indiretamente na guerra", sustentou.

O chefe do Executivo contou que na visita a Scholz, o chanceler pediu que o Brasil enviasse mísseis de tanques comprados na Alemanha para que fossem usados na defesa da Ucrânia. "Disse a Scholz que não ia vender porque, se um míssil é lançado e a Rússia descobre que foi o Brasil que vendeu, o Brasil entra na guerra. E quando se entra, não é possível falar em paz", argumentou.

Nessa pregação pela paz, Lula defendeu a modernização da Organização das Nações Unidas (ONU), de forma que reflita melhor o contexto geopolítico atual. "Me preocupa que esta guerra esteja vinculada a interesses políticos-eleitorais. Isso já aconteceu outras vezes no mundo, e não acredito que seja justo que haja uma guerra sem que ninguém esteja construindo a paz", ressaltou. "Tratarei de fazer isso. Sei que o Brasil ainda não participa do Conselho de Segurança da ONU, mas os países que ocupam esses postos tampouco o fazem. A ONU tem a representação política de 1945. A geopolítica de 1945 não existe mais. É preciso adaptar a ONU a 2023."

Sobre meio ambiente, Lula lembrou que o Brasil "possui 30 milhões de hectares de terras devastadas" e reafirmou o compromisso assumido durante a campanha de combater desmatamentos e queimadas dos biomas, em especial a Amazônia.

"É importante melhorar nossa produção agrícola para alimentar nosso povo e povos de outros países, mas, sobretudo, cuidar do meio ambiente, das terras indígenas. É uma obrigação moral, ética, política e ambiental."

"Ele (Bolsonaro) tentou dar golpe"

Na entrevista ao El País, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse não ter dúvidas de que o ex-presidente Jair Bolsonaro planejava um golpe de Estado. Para o petista, o ex-chefe do Executivo é um dos responsáveis pelos atos terroristas do 8 de janeiro.

"Não tenho dúvida de que ele tentou dar um golpe. Estamos convencidos de que tudo foi organizado por Bolsonaro e sua equipe", afirmou. "Vi tudo pela televisão, invadiram o Palácio do Planalto, houve negligência por parte de quem vigiava, entraram no Planalto, Congresso Nacional e no Supremo Tribunal Federal. Agora, as pessoas estão presas."

Indiretamente, Lula citou o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e secretário de Segurança Pública do Distrito Federal na época, Anderson Torres, para dizer que o governo agora procura saber quem foram os financiadores dos atos golpistas.

"Buscamos, também, os que financiaram, os que pagaram, por exemplo, os ônibus que vieram (a Brasília). Agora, o (ex-)secretário de Segurança de Brasília está na cadeia", frisou. "(Bolsonaro) É acusado pela morte de mais 300 mil pessoas, porque, das mais de 700 mil que faleceram no Brasil (em decorrência da pandemia da covid-19), ele é responsável pela morte de mais da metade por não ter comprado as vacinas necessárias e por comprar remédios que não servem para nada."

Questionado se "a democracia estaria a salvo no Brasil", o presidente argumentou que esse deve ser um valor defendido por vários países. "Devemos salvar a democracia em todo o mundo, porque também existe a extrema direita na Espanha, em Portugal, na França, na Alemanha… A Espanha sabe o que é o autoritarismo", enfatizou.

Lula foi questionado, ainda, se estaria cogitando tomar a mesma atitude do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que recentemente anunciou a candidatura à reeleição. "Não posso pensar nisso agora. Faz só quatro meses que comecei meu mandato", disse. "O que tenho que fazer agora é entregar ao povo brasileiro um país mais democrático, com uma distribuição melhor de riquezas, com mais educação e mais feliz. É o que tentarei fazer e é o que peço a Deus todos os dias", concluiu.