Em meio ao enfrentamento dos diferentes pontos de vista e interesses do projeto de lei que pauta a regulamentação das redes sociais (PL 2630/2020), as definições do que são discurso de ódio, afronta à democracia, invasão de privacidade, e diversos outros conceitos que permeiam o contexto, também aparecem na pauta. Para exemplificar discurso de ódio, o deputado federal Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) citou um trecho da Bíblia.
“Quando a gente traz isso para o mundo real, o que é o discurso de ódio? Você precisa delinear. Eu posso citar um versículo da Bíblia que é um discurso de ódio. Anotem isso aí. Lucas, capitulo 19, versículo 27. Jesus fala assim: 'enquanto aqueles que não quiserem que eu reinasse sobre eles, trazeis aqui e matais diante de mim'. É discurso de ódio?”, ponderou o parlamentar, em evento que debateu a proposta, promovido pelo Comitê Gestor de Internet (CGI.br) em Brasília.
O deputado ressaltou que a questão dos direitos fundamentais é central no debate, pois todos buscam o mesmo interesse, de extinguir esse tipo de discurso das redes sociais. O texto da proposta deve ser apreciado na Casa nos próximos dias. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), deve incluir na pauta, para esta terça-feira (25/4), a votação do requerimento de urgência da proposta, de relatoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), o que possibilita a votação do mérito da proposta na sequência. A pauta é defendida pela base do governo na Casa, especialmente após os atos de 8 de janeiro, em Brasília, e dos sucessivos casos de violência nas escolas no país — ambos articulados por meio das redes sociais.
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Órgão regulador
Outro ponto de questionamento trazido por Andrada foi a necessidade de regulamentação, que consta no texto do projeto. Durante algumas discussões, a possibilidade do uso de Inteligência Artificial (IA) já foi levantado, o que foi questionada pelo parlamentar. “A questão é que estamos tratando de direitos fundamentais, e aí dizem: a inteligência artificial vai fazer essa moderação. Ela consegue? É algo muito subjetivo”, argumentou.
No projeto de lei, é determinado que exista um órgão independente de regulação das plataformas. Segundo a conselheira do CGI.br, Bia Barbosa, a discussão sobre a definição de um órgão regulador independente e técnico para regulamentar é fundamental. “Se não tivermos, das duas uma: ou a legislação não vai pegar e vamos inundar o Judiciário com essas questões, ou teremos uma legislação feita por órgãos não autônomos, o que pode ser perigoso. Na avaliação do terceiro setor, nós não temos um órgão regulador hoje no Brasil capaz de encarar esse debate. Precisamos criar um órgão regulador com profunda participação social, e que seja muito mais permeável do que temos hoje”, argumentou.
Segundo Barbosa, até a criação e estabelecimento de uma autoridade para regulamentação, o CGI pode ser considerado para tal papel, pois mesmo que essa autoridade autônoma seja feita de maneira rápida, isso levaria um tempo para seleção da composição de forma que garanta a multisetorialidade.
Consulta pública
O evento teve o mote da divulgação de uma consulta pública, aberta a toda a população, para opinarem sobre diferentes eixos debatidos na proposta que tramita no Congresso Nacional. A consulta pode ser acessada pelo link e permanecerá aberta por dois meses. Após a coleta dos dados, a primeira fase da análise será baseada em ampliar o entendimento dos riscos, e do objeto a ser regulado. Depois, será feira uma sistematização dos dados.
“Temos expectativa de que tenhamos uma consulta qualitativamente abrangente, que consiga trazer o olhar de diversos atores envolvidos no setor de internet no Brasil. Também esperamos conseguir mobilizar um setor mais amplo, mas o tempo da consulta é pequeno, porque de certa forma a conjuntura se acelerou demais”, salientou a coordenadora do CGI.br, Renata Mielli, relembrando fatos recentes que aceleraram o debate, como o 8 de janeiro e os recentes ataques às escolas.