Lisboa — A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Portugal tinha tudo para ser um marco na retomada das relações do Brasil com o país europeu. Afinal, desde 2016, não havia uma reunião de cúpula entre as duas nações e, nos últimos quatro anos, além do grande distanciamento, a gestão de Jair Bolsonaro foi marcada por grosserias ao presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa. Mas o forte crescimento da extrema direita em território luso, as declarações do petista de que a Ucrânia e a Rússia são culpadas pela guerra que travam há mais de um ano e que a União Europeia e os Estados Unidos estimulam o prolongamento do conflito abriram um campo minado para os dois países. O risco de confusão é grande.
Não por acaso, o governo português pediu reforço no sistema de segurança de todos os eventos que contarão com a presença de Lula. Teme-se uma onda de tumultos. Está certo que haverá um protesto liderado pelo Chega, partido de extrema direita comandado por André Ventura. Ele vem cooptando evangélicos e empresários brasileiros para tomarem as ruas de Lisboa e pode contar com apoio de cidadãos ucranianos.
Por outro lado, o diretório do PT na capital portuguesa também programou uma manifestação a favor do presidente, sinalizando um possível confronto. A determinação da Polícia de Segurança Pública (PSP) e da Guarda Nacional Republicana (GNR) é evitar conflitos.
Se nas ruas as autoridades portuguesas acreditam que garantirão a ordem, o mesmo não se pode dizer em relação à presença de Lula na Assembleia da República, dia 25, quando se comemora a Revolução dos Cravos — que sepultou o que ainda restava da ditadura de António de Oliveira Salazar. Está aí a origem de toda a crise em torno da visita de Lula.
Discurso
Numa viagem a Brasília, o ministro de Negócios Estrangeiros de Portugal, João Cravinhos, anunciou que o petista teria direito de fala na sessão solene do Parlamento na data histórica. A afirmação incendiou o ambiente político português pela surpresa e por não se ter histórico de discurso de um chefe de Estado estrangeiro em evento tão simbólico. O líder da extrema direita ameaçou disparar palavras violentas contra Lula, caso o convite fosse mantido.
Foi preciso um grande acordo para que o presidente brasileiro, convidado por Marcelo Rebelo de Sousa, não fosse descartado. Ele falará na Assembleia da República uma hora e meia antes da sessão solene do 25 de Abril, mas não se sabe se a ameaça de rebelião de ultradireitistas se consumará. Tanto o governo brasileiro quanto o português garantem que o fato está superado.
Contudo, quem acompanha a movimentação dos 12 deputados do Chega diz que surpresas desagradáveis podem acontecer. André Ventura tem se dirigido a Lula, sistematicamente, como "ladrão e corrupto", que não merece estar em Portugal. E chama de "maricas" quem apoia o petista.