“O Exército nos abandonou”, disse desolada a bolsonarista Tatiane Marques em um vídeo feito momentos depois de ser presa, em 9 de janeiro — um dia após a invasão e depredação de prédios das instituições democráticas do Brasil —, que viralizou nas redes sociais. Comerciante do Rio Grande do Sul e ex-candidata a cargos públicos pelo PSL e PL — partidos que Bolsonaro foi filiado nas eleições de 2018 e 2022 —, Tatiane é uma das 100 pessoas que começam a ser julgadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por envolvimento com os atos golpistas de 8 de janeiro.
Ela e outros 99 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) terão o envolvimento analisado pelos ministros da Corte em sessão virtual extraordinária convocada pela presidente da Corte, Rosa Weber, que também marcou uma segunda audiência para 24 de abril. De acordo com o STF, os denunciados ainda estão presos e, por isso, recebem prioridade de julgamento do que os que esperam em liberdade.
No plenário, os ministros decidirão se aceitarão a denúncia da PGR — nesse caso, os envolvidos nos atos golpistas irão responder por associação criminosa; abolição violenta do estado democrático de direito; golpe de Estado; ameaça; perseguição; incitação ao crime e dano qualificado.
Os investigados são os primeiros de 1.390 outros denunciados pela PGR pela ação que resultou na depredação de prédios das instituições democráticas.
Conheça alguns dos denunciados:
Tatiane Marques
Conhecida nas redes sociais após aparecer desolada ao ser presa no acampamento mantido por bolsonaristas em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília, Tatiane Marques é uma empresária de 41 anos e manteve apoio contínuo nas redes sociais ao ex-presidente Jair Bolsonaro desde 2019, início do primeiro ano de mandato dele. Um amigo, no entanto, contou à BBC Brasil que Tatiane se identificou e apoiou o então deputado federal desde 2018.
Ela chegou até mesmo a se candidatar a cargos políticos por meio das siglas que Bolsonaro se filiou, o PSL e o PL: em 2018, tentou conquistar uma vaga de deputada federal e, em 2020, de vereadora. Ambas as corridas eleitorais não tiveram sucesso.
Durante a pandemia da covid-19, Tatiane reproduziu o discurso de Bolsonaro sobre a doença ser uma “gripezinha” e apoiou o uso da cloroquina, remédio comprovadamente ineficaz para combater o vírus. Depois, ela passou a encher os grupos de Whatsapp que participava com notícias falsas sobre uma suposta insegurança das eleições e as urnas.
De acordo com um áudio enviado por Tatiane para a família e obtido pela BBC, a comerciante afirma que não participou da invasão do Congresso, mas estava no quartel general no momento do ataque. O plano era a caravana do Rio Grande do Sul, da qual ela fazia parte, se revezar entre o QG e a Esplanada. “Já mando informações de lá da Esplanada, mas o quebra-quebra foi grande; arrancaram a porta do gabinete do cabeça de ovo (em alusão ao ministro do STF Alexandre de Moraes) e trouxeram para a rua", diz ela na mensagem de voz.
Depois de presa, Tatiane disse que “o Exército nos entregou” e afirmou que o tratamento na detenção temporária dos bolsonaristas, na Academia Militar da Polícia Federal, era “desumano”, além de chamar o local de “campo de concentração do Lula”.
Daywydy da Silva Firmino
Natural do Rio Grande do Norte, Daywydy vive em São Paulo e, de acordo com as redes sociais, é comissário de bordo desde 2016. Nas redes sociais, ele mantém um apoio ferrenho a Bolsonaro, com presença contínua em acampamentos e manifestações bolsonaristas de São Paulo desde novembro de 2022.
No entanto, a postura de Daywydy é recente: antes de setembro de 2022, mês em que começou a compartilhar as publicações pró-Bolsonaro e contra as instituições democráticas, o comissário usava as redes para compartilhar um diário de cuidados com a alimentação e atividades físicas.
Mesmo nos conteúdos amenos, Daywydy mostrava condutas peculiares, no mínimo: em uma foto compartilhada nas redes sociais, tirada em frente a um espelho de um elevador, ele mostra o abdômen e o pênis — a parte do órgão masculino foi censurada para a postagem das redes.
Em 2021, o potiguar chegou a publicar uma foto em que recebia a vacina contra a covid-19 e escreveu uma legenda de incentivo à imunização. “A melhor vacina está disponível pra você, não escolha!”, escreveu com a hashtag “vacinas salvam”. Depois de setembro de 2022, quando compartilhou a primeira notícia falsa sobre uma suposta fragilidade do sistema eleitoral, Daywydy não voltou atrás e, ao receber críticas de amigos nas redes sociais, pedia para que parassem de segui-lo.
Frederico Rosário Fusco Pessoa de Oliveira - médico da SES/DF
Médico da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES/DF), Frederico Rosário Fusco é um dos denunciados que serão julgados pelo STF em abril. De acordo com o Portal da Transparência do Governo do Distrito Federal (GDF), o servidor tem remuneração bruta de R$ 28.341,98. Com os descontos, o salário desce para R$ 18.893,87.
Apoiador de Bolsonaro, o perfil no Instagram que mantinha era alimentado por vídeos recebidos em grupos de apoiadores do ex-presidentes, com notícias falsas e apoio aos militares. A página, no entanto, não está mais no ar.
No site Reclame Aqui, um paciente atendido por Frederico em julho de 2020, auge da pandemia da covid-19, relata que o médico não solicitou o teste da doença, mesmo com o relato dele de que teve contato com três pessoas com resultado positivo para a doença.
“Fui muito mal atendido pelo Dr Frederico Rosário Fusco. Apesar de relatar o contato com pessoas infectadas e já estar com alguns sintomas, o médico não fez um pedido ou relatório onde demonstrasse a necessidade de realizar o teste do COVID. Não precisa ser médico para saber que os sintomas aparecem com alguns dias após o contato”, escreveu o paciente no site que busca pedir reparação a empresas. Ele afirmou que o atendimento foi feito em um hospital particular.
“Hoje, dia 15/07/20 estou com febre, tosse, dores e tive meu exame negado pelo plano de saúde pois não foi relatado pelo médico uma real necessidade de realizar o exame. Tenho dois filhos pequenos, uma esposa e uma vida para viver, mas a negligência, falta de respeito, falta de trato com paciente, falta de amor ao próximo, falta de tudo que um médico deve ter, pode colocar minha vida em risco”, acrescentou.
Na época da prisão, em 9 de janeiro, a SES-DF informou à imprensa que os servidores seriam identificados e responsabilizados “no rigor da lei”.
Confira abaixo a lista dos 100 primeiros acusados:
- Ana Cláudia Rodrigues de Assunção
- Ana Flavia de Souza Monteiro Rosa
- Ana Maria Ramos Lubase
- Ana Paula Neubaner Rodrigues
- Anderson Zambiasi
- André Luiz Barreto Rocha
- Andrea Baptista
- Andrea Maria Maciel Rocha e Machado
- Angelo Sotero Lima
- Anilton da Silva Santos
- Antonio Carlos de Oliveira
- Antonio Cesar Pereira Junior
- Antonio Fidelis da Silva Filho
- Antonio Marcos Ferreira Costa
- Barquet Miguel Junior
- Belchior Alves dos Reis
- Bruno Guerra Pedron
- Bruno Ribeiro dos Santos Maia
- Calone Natalia Guimaraes Malinski
- Carlo Adriano Caponi
- Carlos Alberto Horstmann
- Carlos Alexandre Oliveira
- Carlos Eduardo Bom Caetano da Silva
- Carlos Emilio Younes
- Carlos Rubens da Costa
- Cezar Carlos Fernandes Da Silva
- Charles Rodrigues dos Santos
- Cibele da Piedade Ribeiro da Costa Mateos
- Cirne Rene Vetter
- Claudia de Mendonça Barros
- Claudio Augusto Felippe
- Clayton Costa Candido Nunes
- Cleodon Oliveira Costa
- Cleriston Oliveira da Cunha
- Cristiano Roberto Batista
- Daiane Machado de Vargas Rodrigues
- Davi Alves Torres
- David Michel Mendes Mauricio
- Davis Baek
- Daywydy da Silva Firmino
- Deise Luiza de Souza
- Denise Dias da Silva
- Deusamar Costa
- Diego Eduardo de Assis Medina
- Diego Haas
- Diogo Deniz Feix
- Dirce Rogério
- Djalma Salvino dos Reis
- Douglas Ramos de Souza
- Dyego dos Santos Silva
- Eder Parecido Jacinto
- Edilson Pereira da Silva
- Edlene Roza Meira
- Edson Goncalves de Oliveira
- Edson Medeiros de Aguiar
- Eduardo Zeferino Englert
- Edvagner Bega
- Elisangela Cristina Alves de Oliveira
- Eric Prates Kabayashi
- Ezequiel Ferreira Luis
- Fabiano André da Silva
- Fabio Jatchuk Bullmann
- Fabricio de Moura Gomes
- Fatima Aparecida Pleti
- Fatima de Jesus Prearo Correa
- Felicio Manoel Araujo
- Felipe Feres Nassau
- Fernando Kevin da Silva de Oliveira
- Fernando Placido Feitosa
- Francisca Hildete Ferreira
- Frederico Rosario Fusco Pessoa de Oliveira
- Geissimara Alves de Deus
- Gelson Antunes da Silva
- Gesnando Moura da Rocha
- Gleisson Cloves Volff
- Horacir Gonsalves Muller
- Marco Tulio Rios Carvalho
- Marcos Soares Moreira
- Maria Jucelia Borges
- Mateus Viana Maia
- Mauricio Maruiti
- Sheila Mantovanni
- Tatiane da Silva Marques
- Thiago Queiroz
- Vera Lucia de Oliveira
- Viviane Martimiani Nogueira
- Yuri Luan dos Reis