Os fantasmas do 8 de janeiro que provocaram, na quarta-feira, a demissão do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias — conhecido como G.Dias —, também são responsáveis por assombrar a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), órgão que opera sem comando definitivo desde o início do ano.
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a diretoria-geral da agência, Luiz Fernando Corrêa ainda não assumiu porque a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) decidiu não sabatiná-lo, como manda a Constituição, até que dois membros da atual diretoria sejam afastados.
O nome mais polêmico é o do diretor adjunto, Alessando Moretti, que foi secretário executivo de Anderson Torres na Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal entre 2018 e 2021. O outro servidor que está no centro das críticas é Paulo Maurício Fortunato Pinto, que era diretor do Departamento de Contrainteligência da Abin até 2008 e ocupa, agora, o cargo de secretário de Planejamento e Gestão.
Atualmente, a Abin é comandada interinamente pelo oficial de inteligência Saulo Moura da Cunha — ex-diretor de Contraterrorismo do órgão —, uma indicação do ex-ministro G.Dias, que tentou efetivá-lo no cargo.
Moretti, indicação de Corrêa, foi nomeado para o cargo em março pelo presidente Lula. Quando Anderson Torres assumiu o comando do Ministério da Justiça a convite do então presidente Jair Bolsonaro, Moretti foi alçado à Diretoria de Inteligência Policial da Polícia Federal.
Segundo o Correio apurou, a relação dele com a gestão Bolsonaro é considerada inadmissível para senadores da base governista. Por isso, o presidente da CRE, senador Renan Calheiros (MDB-AL), cancelou a sabatina de Corrêa, marcada para a sessão de 30 de março, e não há previsão para uma nova data.
No caso de Paulo Maurício Fortunato Pinto, nomeado no último dia 4, o passado que o assombra está mais distante, remonta à Operação Satiagraha, da Polícia Federal. A força-tarefa, deflagrada em 2004, descobriu a participação da Abin em um esquema de escutas ilegais que atingiram ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como Gilmar Mendes, e senadores. Em 2008, na CPI das Escutas Clandestinas, Fortunato negou participação no escândalo, porém um grupo de senadores liderado por Renan Calheiros não admite que ele permaneça no cargo atual.
"Não vamos sabatinar o segundo nem o terceiro da Abin (Moretti e Fortunato), mas esses informes são importantes para o andamento da própria sabatina. A responsabilidade do Senado Federal é total, nós precisamos saber quem são essas pessoas", alertou Calheiros, na sessão de 30 de março, ao justificar a decisão de cancelar a sabatina de Corrêa.
Calheiros chegou a receber Corrêa duas vezes, em seu gabinete no Senado. Apesar dos argumentos de que não há nada que pese contra sua reputação, o parlamentar nada fez para remarcar a sabatina e ainda o alertou sobre a inconveniência da nomeação dos dois diretores.
Outro fator que não contribui para a aprovação de Corrêa é o fato de que, desde a sua indicação, nenhum parlamentar se dispôs a defender publicamente sua posse no comando da Abin.
Procurado pela reportagem, Corrêa não quis comentar o impasse que se estabeleceu por causa dos diretores que indicou para a Abin. Na Casa Civil, o assunto é tratado com discrição pelo ministro Rui Costa, que espera uma decisão de Lula para definir o futuro do comando da Abin — próximo alvo do processo de desbolsonarização de órgãos estratégicos do governo.
A expectativa é de que o impasse seja superado neste fim de semana, durante a visita de Estado do presidente a Portugal e à Espanha. Calheiros é um dos convidados do chefe do Executivo na comitiva brasileira e esse é um dos temas que os dois tratarão, de forma privada, na viagem.
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