Na véspera do 59º aniversário do golpe que instaurou a ditadura militar no Brasil, a Comissão de Anistia promoveu, ontem, a primeira sessão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após mais de quatro anos de perda de protagonismo do colegiado criado para identificar violações de direitos e reparar vítimas do regime de exceção. Para marcar a retomada do objetivo original, a comissão pautou para análise quatro casos considerados simbólicos.
Abertura foi marcada por discursos de repúdio ao autoritarismo e muitas referências às gestões de Michel Temer e Jair Bolsonaro, que esvaziaram a comissão. Segundo o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), cerca de 95% dos processos de pedidos de reparação avaliados pela comissão nos dois últimos governos foram negados.
O ex-ministro de Direitos Humanos Nilmário Miranda, hoje assessor especial do MDHC, lembrou que a retomada dos trabalhos se dá "no dia da chegada de quem destruiu essa comissão" — referência a Bolsonaro, que, horas antes, desembarcara em Brasília vindo dos Estados Unidos.
Já o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, fez um vigoroso discurso de repúdio à ditadura. "Não esqueceremos. Estamos aqui por respeito à Constituição Federal, às leis deste país e aos tratados internacionais que o Brasil é signatário. Aos que veem nessa iniciativa revanchismo ou tentativas de dividir a nação brasileira, eu diria que é justamente o contrário. Nenhuma nação se manteve coesa sem olhar para suas fraturas irreparáveis. Aliás, não existe nação sem fraturas, sem confronto", afirmou.
A presidente da comissão, Eneá de Stutz e Almeida, disse que, nos últimos anos, o colegiado atuou "em modo negacionista: negava o golpe de Estado, negava a ditadura, a perseguição política". Conforme adiantou, agora o trabalho se dará no sentido de "desfazer os retrocessos que aconteceram desde 2017" e consolidar a comissão como um órgão de Estado, não mais sujeito ao governo da vez.
A comissão também incorpora a tarefa de pedir desculpas aos perseguidos políticos e seus parentes, além de passar a aceitar processos coletivos — sem reparação financeira — de grupos e coletivos atingidos pela ditadura, como negros, indígenas, população LGBTQIA , sindicalistas e movimentos sociais, por exemplo.
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Recursos
Para quem teve a reparação financeira (de R$ 100 mil) negada nos últimos anos, Almeida aconselhou que entre com recurso para revisão da decisão. É o caso dos quatro processos que foram avaliados nessa primeira audiência da comissão: do deputado federal Ivan Valente (PSol-SP), do líder sindical José Pedro da Silva, da professora Cláudia de Arruda Campos e do jornalista Rogério Schettino.
Em julgamentos promovidos entre 2018 e 2022, os membros da comissão (nomeados pelo governo Bolsonaro) justificaram que essas pessoas participaram de movimentos ilegais contra o então regime. Ivan e Cláudia chegaram a ser chamados de terroristas por conselheiros que julgaram os pedidos de reparação.
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