Com a aprovação de 100% dos líderes da Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), enviou, ontem, ao presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ofício no qual questiona, de forma incisiva, o ato — com aval de todos os líderes do Senado — de retomada imediata das comissões mistas, que analisam medidas provisórias (MPs).
"Solicito que Vossa Excelência se digne a convocar sessão do Congresso Nacional, a fim de que a matéria seja formal e devidamente suscitada e decidida, facultando-se, dessa forma, o contraditório com a participação ampla de senadores da República e também deputados federais, com igual dignidade, e também de recorrer às respectivas Comissões de Constituição e Justiça, se for o caso", enfatizou no ofício, obtido pelo Correio.
A decisão de Pacheco foi anunciada na quinta-feira. Ele aceitou a questão de ordem apresentada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), um dia antes, que solicitava a volta das comissões mistas. Calheiros é inimigo político de Lira.
"Do ponto de vita constitucional, esse procedimento tolheu o direito regimental de deputados e deputadas federais de contraditar a questão de ordem e recorrer da decisão de Vossa Excelência", sustentou o presidente da Câmara. "O procedimento correto, inclusive já adotada por esta casa em situações análogas, seria remeter a questão de ordem para decisão em sessão do Congresso Nacional."
Na questão de ordem, Calheiros justificou que as comissões deveriam voltar porque acabou a pandemia. Durante a crise sanitária, o Supremo Tribunal Federal determinou que as propostas deveriam ser votadas diretamente no plenário, sem passar pelos colegiados.
Na prática, o formato "delegou" mais poder a Lira, já que as MPs começam a tramitar pela Câmara — com a prerrogativa, o presidente passou a escolher, por meio de negociações com os pares, os relatores das proposições.
No ofício, Lira rebateu o argumento sobre a pandemia. "A Espin (Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional) foi encerrada em 22 de maio de 2022 (...) e a calamidade pública em 31 de dezembro de 2020 (...). Assim sendo, não parece justificável, um ano depois, que se altere unilateral e monocraticamente o regime de tramitação de medidas provisórias em vigor com base em tais argumentos", frisou.
Segundo o líder do PSB, Felipe Carreras (PE), na quinta-feira, houve alinhamento entre Lira e os caciques partidários da Casa para que o documento fosse enviado.
A avaliação de senadores, entretanto, é de que Lira, por não ser membro da Mesa Diretora do Congresso, não tem força para mudar a decisão "tomada à luz da Constituição Federal".
Legitimidade
Apesar de Lira reivindicar uma sessão do Congresso para analisar o ato de Pacheco, há divergências sobre a legitimidade dessa convocação.
Ao Correio, o senador Plínio Valério (PSDB-AM) apontou que a aprovação de medidas fora do rito obrigatório gera insegurança jurídica, uma vez que a tramitação está à revelia dos requisitos previstos na Constituição. "Estamos fora da lei, correndo o risco, inclusive, de ter os projetos de lei vindos de MPs sendo questionados no Judiciário."
Também do PSDB, o senador Alessandro Vieira (SE) — que chegou a ir ao STF solicitando a retomada obrigatória dos colegiados, mas retirou o mandado de segurança após o ato de Pacheco — define as reiteradas contestações do presidente da Câmara como "desejo de permanência de concentração de poder".
Até o fechamento desta edição, Pacheco não havia se pronunciado. Parlamentares entendem, porém, que existe uma posição de discricionariedade de o senador optar por considerar ou não os argumentos de Lira.
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