Após dar os primeiros passos ainda em 2022 com a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Transição, os primeiros 60 dias oficiais do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foram marcados por uma forte ação de enfrentamento a uma tentativa de golpe em 8 de janeiro e por discursos desalinhados na área econômica.
Recentemente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, entraram em uma discordância pública sobre impostos nos combustíveis. Haddad venceu a queda de braço e foi apresentada uma medida provisória que retoma a cobrança de impostos federais sobre a gasolina e o etanol. Gleisi foi contrária à medida e usou o Twitter para se posicionar. O movimento da deputada foi visto como uma desautorização ao ministro.
Segundo integrantes da oposição, o governo petista não tem um plano de governo e por isso as discordâncias internas estão ocorrendo. O deputado federal Ricardo Salles (PL-SP) aponta contradições no discurso petista, como em relação ao Banco Central. O ex-ministro do Meio Ambiente da gestão de Jair Bolsonaro afirma que Lula e integrantes do PT foram para cima do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para diminuir juros “na canetada”, enquanto editavam a MP dos Combustíveis, que reintegrará tributos a gasolina e ao etanol.
“Acho que o governo entrou sem projeto, sem norte por onde caminhar. Economicamente, mora uma série de declarações contra a autonomia do BC, para baixar juros na canetada e ao mesmo tempo foi obrigado a reconhecer que a responsabilidade fiscal é importante. O PT tinha um projeto de poder, de tirar o Bolsonaro, mas não tinha projeto de país e isso está se revelando justamente em uma ausência de ações em vários campos. Eles estão batendo cabeça”, disse Salles.
Outro ponto de críticas foram os casos dos ministros Juscelino Filho, das Comunicações — que recebeu diárias pagas pelo governo e pegou voo da FAB em um fim de semana que participou de leilões de cavalos — e Daniela do Waguinho, do Turismo — por suposto envolvimento com milicianos.
- Ministro das Comunicações usou voo da FAB e diárias para ir a leilão de cavalos.
- "Lula conhece minha índole. Estou 100% focada no trabalho", diz ministra do Turismo.
O deputado federal Evair de Melo (PP-ES) afirmou que existe uma falta de unidade além da questão Haddad-Gleisi. Na avaliação do deputado, a falta de entrosamento também é vista de forma geral nos demais quadros do governo. “Não tem governo. Não tem unidade entre ministros e orientação clara de onde o governo quer ir. O governo tenta se justificar na questão social. A Tebet e o Haddad continuam sem se falar e se forem se falar não se entendem, porque os dois não são do ramo. Eu acho que o governo está perdido e desorientado. Sorte deles que a arrecadação, fruto do passado, ainda está bem”, criticou.
Destaque na área social, nas reforças e nas relações internacionais
Entre os aliados do governo, um dos pontos ressaltados para elogiar a gestão Lula III se dá na prioridade em efetivar a reforma tributária. O presidente do MDB, deputado federal Baleia Rossi (SP), afirmou otimismo com o futuro do Brasil e apontou que a priorização da reforma tributária no Congresso Nacional dá uma força muito grande ao governo nos primeiros 60 dias.
“A priorização da reforma tanto na Câmara quanto no Senado, a participação do ministro Haddad, priorizando a pauta da reforma da uma força muito grande, já que a gente tem apoio do Arthur Lira e do Rodrigo Pacheco. A proposta está bastante madura, é discutida desde 2019, acho que nós temos uma grande perspectiva que, depois de 30 anos, o parlamento entregue uma reforma tributária que vai simplificar o sistema gerando emprego e renda. Vejo com grande otimismo a gente avançar com essa pauta que é a mais importante hoje no parlamento e no país”, diz.
Sobre as discordâncias recentes dentro do PT e demais questões criticadas geradas pela oposição, Baleia disse que começo de governo “sempre tem ajustes” e as questões polêmicas serão superadas conforme a agenda dentro do parlamento evolua para um crescimento econômico. “Esses ajustes vão ser feitos ao longo da caminhada e isso não prejudica”, conclui Baleia.
O líder da Federação PSOL/Rede, deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP), disse que “não tem comparação” do governo Lula para a gestão Bolsonaro. Boulos citou a resposta aos ataques golpistas de 8 janeiro, a retomada do Minha Casa Minha Vida e a presença de Lula nas tragédias no Litoral Norte, em comparação com o fato de Bolsonaro ter mantido as férias em situações semelhantes durante o último mandato.
“O Brasil hoje tem um governo que olha pelos mais pobres, mesmo em um prazo ainda muito curto para se avaliar qualquer coisa”, diz Boulos.
Na esteira dos elogios dos aliados e das críticas dos opositores, o professor de ciência política Valdir Pucci avalia o governo Lula como mediano, e diz que daria “nota cinco” à gestão petista. Entre os pontos positivos, ele cita a reinserção do Brasil no cenário internacional e evoluções em pautas ambientais e humanas, como a atenção dada à causa ianomâmi e a presença de Lula nas tragédias no litoral norte de São Paulo.
“A postura do Lula na questão das enchentes no litoral Norte de São Paulo também é algo visto como positivo, em especial o diálogo com o governador Tarcísio Freitas, que compõe a oposição. Essa volta do diálogo em relação ao último governo é algo positivo”, diz.
Já nos lados negativos, ele cita justamente a questão econômica, e afirmou que as dificuldades do governo nessa área já eram esperadas. “O governo Lula III não é igual ao governo Lula I, em 2003, onde se tinha uma condição econômica favorável no mundo", diz.
O especialista condenada também as "brigas internas" do PT. "Em especial essa tentativa de fritar Haddad nas pautas econômicas, na questão dos juros e da briga do PT com o Banco Central”, disse.
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