O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chega aos seus 50 dias de governo acumulando agendas que passam por entregas de programas sociais, fortalecimento de sua base no Congresso, desgaste da imagem do ex-chefe do Executivo Jair Bolsonaro (PL), exoneração de militares e reposicionamento do Brasil internacionalmente. O período marca metade dos chamados 100 dias — expressão presente em todos as gestões que assumem as chefias do Poder Executivo. Hoje, o petista visita as regiões do litoral de São Paulo afetadas por fortes chuvas. A tragédia deixou dezenas de mortos e centenas de desabrigados.
A próxima viagem deve ser em 3 de março, quando o petista se dirige a Mato Grosso, terra do agronegócio. A informação foi obtida pelo Correio e confirmada pela assessoria de imprensa de Lula. O presidente, que até o momento priorizou compromissos em estados onde venceu nas eleições de 2022, à exceção de São Paulo, vai desembarcar em território cuja preferência de eleitores no pleito do ano passado foi pelo bolsonarismo. Os compromissos foram, respectivamente, em SP, Roraima, Rio de Janeiro, Bahia e Sergipe. Lula mantém os olhos fitos nas entregas que irão ocorrer. A chamada "agenda de futuro" — que envolve desde a reestruturação de políticas públicas à diplomacia com países da América do Sul, América do Norte e Ásia — é também prioridade do terceiro mandato.
No interior paulista, em Araraquara, Lula prestou solidariedade às vítimas dos danos causados por forte chuva no estado. Em Roraima, a pauta destinou-se especificamente ao conhecimento internacional do desastre humanitário contra os povos ianomâmis, negligenciados pela gestão de seu antecessor. A ida ao estado nortense teve como desfecho ações integradas entre ministérios, com entrega de pelo menos quatro toneladas de alimentos a aldeias locais, prioridade da vacinação contra covid-19 e investigação da gestão Bolsonaro, por parte da Polícia Federal. Na sequência, Lula foi à cidade baiana de Santo Amaro para a entrega de 2.745 unidades do Minha Casa, Minha Vida, que havia tido a nomenclatura convertida para Casa Verde Amarela no governo anterior.
Na ocasião, o presidente retomou a faixa 1 da ação, um marco de seu primeiro governo, e anunciou 2 milhões de moradias do tipo até 2026. Com o Minha Casa, Minha Vida, o petista objetiva chegar positivamente, também, à construção civil. A aposta é potencializar as áreas envolvidas no setor, para além das famílias de baixa renda em todo Brasil. Em Sergipe, Lula anunciou o segundo reajuste do salário mínimo, que vai, a partir de maio próximo, para R$ 1.320. No Orçamento da União de 2023, o valor ficou em R$ 1.302. O aumento vai acontecer apesar de ressalvas da equipe econômica.
A promessa de isenção de Imposto de Renda a pessoas físicas, dentro da tributária, também foi anunciada. A nova faixa terá o limite de R$ 2.640. O presidente confirmou ainda que o novo Bolsa Família passa a viger em março, com o valor de R$ 600, adicionado de R$ 150 às famílias a cada criança com até seis anos. Houve, ainda, o anúncio do aumento das bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
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Ansiedade
Lula espera que, nos próximos 50 dias, as ações encaminhadas mostrem resultados concretos, como redução da pobreza e melhoras nos indicadores econômicos. O controle da inflação e da taxa de juros é a área em que tende a haver maior resistência e levar mais tempo para que a população sinta as mudanças no bolso. "Vocês sabem que um pé de jabuticaba, a gente planta ele e não começa a chupar jabuticaba no dia que a gente plantou. É preciso ter sol, ter água, para que, depois de um certo tempo, a gente possa comer a jabuticaba antes dos marimbondos ou dos passarinhos. O nosso pé de jabuticaba foi plantado, e nós vamos começar a comer o resultado do nosso trabalho", disse Lula em um dos eventos da gestão.
Embate com o BC
Uma das investidas do presidente para alcançar apoio, ainda que indireto, na realização de suas promessas, foram as críticas, no início deste mês, ao Banco Central (BC), presidido por Roberto Campos Neto. Lula partiu para cima da inflação e da Selic (taxa básica de juros), esta de grande valia para investimentos do mercado interno e externo no país. Campos Neto é tido como próximo de Bolsonaro. Ambos estariam juntos em pelo menos um grupo de WhatsApp. A estratégia rendeu uma promessa de convocação do gestor à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. À reportagem, o ainda presidente da comissão, senador Otto Alencar (PSD-BA), disse que não há data definida, mas que o convite vai ser formalizado após o carnaval.
Campos Neto, após as falas do petista, passou a falar em responsabilidade do Banco Central para com a área social do país, feito inaugural para o perfil do economista após se tornar presidente do BC. Lula vem também pondo fim a raízes bolsonaristas no novo governo. A exoneração de militares, desde os primeiros dias de seu terceiro mandato, sobretudo após o 8 de janeiro, é um dos principais marcos. Até o momento, pelo menos 74 nomes das Forças Armadas que estavam à disposição da gestão Bolsonaro foram retirados. Cerca de 55 são só do Exército. Na Polícia Rodoviária Federal (PRF) foram aproximadamente 125 exonerações desde 1º de janeiro.
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Apoio
No Congresso, o êxito na construção de uma aliança ampla fragilizou a expectativa de oposição forte ao "lulismo", tanto na Câmara quanto no Senado. Ao lado de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, Lula conseguiu construir acordos para celeridade na reforma tributária, incluindo mudanças na âncora fiscal; destinação de emendas parlamentares de R$ 13 milhões a deputados eleitos em 2022, que não foram contemplados via orçamento com os recursos; e presidências de comissões cruciais, como a de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Dos 23 partidos da Casa, apenas o Novo pode ser visto oficialmente, no momento, como oposição radical ao governo. Deputados do PL, PP e Republicanos têm falado em oposição responsável. Siglas como Podemos ainda não definiram suas estratégias.
Aliado de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, Lula trabalhou fortemente pela recondução do parlamentar ao posto. Ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT) selou acordos para a reeleição do senador e arquitetou uma força-tarefa para desconstruir fake news espalhadas por extremistas contra Pacheco. A costura de Padilha foi feita junto a Paulo Pimenta (PT), ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social. Pacheco venceu e, assim, também levou por água abaixo as chances de uma oposição radical na Casa. Constituídos como minoria, PL, PP e Republicanos somam 22 senadores do total de 81. Os senadores Sérgio Moro (União Brasil-PR), Rogério Marinho (PL-RN), Hamilton Mourão (Republicanos-RJ) e Damares Alves (Republicanos-DF) são alguns dos nomes para se manterem vivas as críticas a Lula, ainda que corram o risco de serem alijados pelas suas próprias legendas.
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