Um dos assuntos mais comentados nas redes sociais sobre a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) são as roupas usadas por Rosângela da Silva, a Janja. A primeira-dama escolheu duas produções de estilistas brasileiras para a solenidade e festividades pós-cerimônia.
Durante os protocolos de posse — que são o desfile em veículo presidencial, a entrega da faixa, o discurso do presidente, entre outros —, Janja usou um terninho em seda, produzido pela estilista Helô Rocha, a mesma que criou o vestido de noiva usado pela primeira-dama no casamento com Lula em maio de 2022. O look foi desenhado pela designer em parceria com as bordadeiras de Timbaúba dos Batistas, no Rio Grande do Norte.
Assim como no casamento, Janja buscou dar evidência à moda nacional, em especial o trabalho da Casa das Bordadeiras, que carrega elementos naturais e valoriza o nordeste brasileiro. Os detalhes da confecção do look deixam clara intenção dar destaque à brasilidade: o terninho possui modelagem em alfaiataria com uma calça pantalona, colete e, de sobreposição, um blazer, todos em seda vintage tingidos naturalmente com caju e ruibarbo — uma planta medicinal.
O blazer tem ainda uma leve cauda e é todo contornado por folhas bordadas, assim como o colete. Por dentro da peça, tem um bordado com o nome de Janja e a data da posse, uma espécie de recordação do momento especial. Para confeccionar o bordado as artesãs usaram, ao invés de linha tradicional, palhas brasileiras e capim dourado. Nos acessórios, a brasilidade igualmente se fez presente. Janja escolheu usar um par de brincos da designer de joias Flávia Madeira, chamado pitangão, em referência à pitanga, uma fruta brasileira. Nos pés, ela usou os mesmos sapatos do casamento, confeccionados manualmente em couro, por artesãs, e assinados por Juliana Bicudo.
Além da valorização do trabalho manual, do artesanato, da economia criativa e dos elementos brasileiros, a roupa escolhida por Janja representa uma quebra de protocolo. Historicamente, as esposas dos presidentes usaram vestidos nas cerimônias de posse e em eventos oficiais, vestimenta tipicamente feminina. Ao vestir calças e colete, a primeira-dama optou por um visual atribuído à masculinidade, lembrando um smoking, que representa poder e comunica seriedade e sofisticação.
Vestido azul com capa
Mais tarde, depois da cerimônia de posse, Janja trocou de roupa e vestiu um look com um ar mais leve e descontraído. Para a recepção, um jantar, no Palácio do Itamaraty, a primeira-dama escolheu um vestido azul todo plissado com uma capa de manga bufante.
O vestido tem tamanho max-midi — ou longuete, que é um pouco acima do tornozelo —, e carrega um leve decote transpassado em “V”. Para deixar mais feminino, a roupa tem ainda uma faixa na cintura. Como sobreposição, a capa tem modelagem reta, manga comprida e acompanha o tamanho da peça principal. Nos pés, Janja calçou um sapato vermelho, a cor do Partido dos Trabalhadores (PT).
Novamente a socióloga optou por uma estilistas brasileiras para idealizar a roupa, a designer de moda Rafaella Caniello, proprietária da marca Neriage, em collab com Helô Rocha, profissional queridinha de Janja. Caniello também foi responsável por criar o look que Janja usou na diplomação de Lula.
O tom de azul escolhido por elas para a segunda produção comunica segurança, confiabilidade e seriedade. O tecido leve, de origem sustentável, tem caimento fluido que transmite feminilidade, proximidade e leveza. As escolhas fazem jus ao discurso de Lula, que tem priorizado a sustentabilidade e o meio ambiente. Diferente da solenidade, em que Janja apareceu com um rabo-de-cavalo, no segundo momento ela soltou o cabelo, recentemente repaginado em um corte repicado com franja moderna e tingido em tom de loiro.
De modo geral, Janja usou a moda para se comunicar e se posicionar. A escolha do terninho vai ao encontro da postura assumida por ela desde o início da campanha, a de assumir protagonismo, não se contentar com o típico papel de primeira-dama e que pretende inovar o significado deste cargo. As produções mostram que todos os elementos foram pensados nos mínimos detalhes para estar de acordo com tudo que ela quer representar e com as promessas de Lula.
Interesse pela moda nacional
Desde que passou a receber holofotes, intensificados pelo casamento com Lula no início do ano passado e pela campanha presidencial, Janja mostrou que tem forte interesse pela moda. A primeira-dama passou a usar, em momentos estratégicos e de grande evidência, a moda como ferramenta de comunicação política.
Em entrevista à revista Vogue, Janja assumiu que, na posse, o interesse era vestir algo que tivesse significado e transmitisse uma mensagem. “Queria vestir algo que tivesse simbolismo para o Brasil, para os estilistas, para as cooperativas e para as mulheres brasileiras”, disse. “A moda não é só um aspecto muito importante da cultura brasileira como é um motor da economia. Estou conhecendo mais sobre esse assunto. Tenho conversado com estilistas, aprendido bastante”, confessou à revista.
Janja apareceu com roupas confeccionadas por estilistas brasileiros na entrevista para o programa Fantástico, da Rede Globo, na visita ao presidente de Portugal, entre outros momentos. No dia-a-dia, a socióloga é adepta ao jeans e, em diversos momentos, usa camisetas com dizeres políticos como forma de protesto em prol do que acredita.
Na maioria das vezes em que é vestida por estilistas brasileiras, além de escolher a valorização nacional, Janja opta por evidenciar o trabalho de mulheres. Na vista à Portugal, por exemplo, ela usou uma saia vermelha plissada, desenhada pela mesma designer que criou o vestido azul usado neste domingo (1º/1). Mas o trabalho dos homens não fica de fora do radar da primeira-dama, na entrevista para o Fantástico, ela usou uma camisa de seda brasileira branca com estampas vermelhas, que remetem à cor do tingimento do pau-brasil, desenhada pelo estilista Airon Martin, da Misci.
“Fiz questão de usá-la porque carregava um simbolismo, tanto da história de vida do estilista como da cultura popular, da produção da seda nacional, que é usada na França e a gente nem sabe”, ressaltou. “Quero carregar os estilistas brasileiros aonde for. Mostrar para o mundo, abrir portas de comércio, de oportunidades. Se puder contribuir, vou ajudar”, garantiu Janja em entrevista à Vogue.
No ensaio para a revista, mais uma vez, Janja pensou na moda nacional. De acordo com Vogue, ela pediu para que todas as roupas usadas fossem de estilistas brasileiros e a revista atendeu ao pedido colocando somente estilistas mulheres.
Universo fashion não ignorou a representatividade
A postura e escolhas de Janja não passaram despercebidas por estilistas, designers, consultores de imagem e admiradores do universo da moda. Nas redes sociais, internautas elogiaram o posicionamento da primeira-dama e ressaltaram a importância de valorizar a moda brasileira e o artesanato.
“É muito importante que a moda brasileira seja enaltecida, a cadeia têxtil, que emprega muitas pessoas, é a minha área de formação e atuação. Com tanta roupa da china e do Paraguai é urgente a valorização da nossa moda, nossos criadores”, disse a estilista Gisele Sinegalia por meio do Instagram.
A quebra de protocolo na cerimônia de posse também foi vista como positiva e importante para ressignificar o papel feminino na política. “Muito do vestuário dito feminino dentro do espaço político vai ser quebrado por Janja e, para a #PosseDoPovo, o look vai ser o marco dessa era”, opinou o influenciador de moda Felipe Vasconcelos, em publicação no Twitter.
“A julgar pelo que vimos hoje, tudo indica que a moda nacional deve receber, além de destaque, uma atenção a tanto tempo reivindicada”, indicou Gabriel Fusari, jornalista de moda.
Além do look de Janja, outros foram elogiados pelos internautas. A esposa do vice-presidente Geraldo Alckmin, Lu Alckmin, apesar de ter escolhido uma roupa alinhada ao tradicionalismo esperado das mulheres em cerimônias oficiais, também evidenciou o trabalho de brasileiros. Ela usou um vestido branco minimalista, criado pela estilista Glória Coelho.
Já o influenciador PCD Ivan Baron, que subiu a rampa do Planalto ao lado de Lula e esteve na entrega da faixa presidencial, usou um conjunto de calça e blazer de alfaiataria branco, estilizado com frases, acessórios e retalhos. As peças são verdadeiras obras de arte em forma de protesto, criadas pelo artista brasileiro Victor Hugo Souliver, que, inclusive, é de Brasília, e por Juliana Gomes da Silva, também artista. Entre as palavras de ordem escritas n o blazer, estão “Inclusão”, “Acessibilidade” e as frases “Parem de nos excluir”, “Acolher quem é desacreditado” e “Ressignificar o destino”.
Veja a repercussão:
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