A presença do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Conferência do Clima das Nações Unidas — COP27 —, em Sharm el-Sheikh, no Egito, é vista com bons olhos por especialistas porque, além de recuperar o protagonismo do país na área ambiental, é uma oportunidade para o petista se encontrar com líderes globais. A reunião de cúpula começou na semana passada e vai até sexta-feira. Além de Lula, participam do evento a ex-ministra do Meio Ambiente e deputada eleita Marina Silva (Rede-SP), e a senadora Simone Tebet (MDB-MS), que devem assumir posições de destaque no futuro governo.
A simples vitória de Lula nas eleições de outubro já fez com que a Noruega e a Alemanha sinalizassem para a retomada do fundo de proteção da Amazônia, que ficou com os recursos parados durante todo o governo de Jair Bolsonaro (PL), taxado de destruidor das florestas pelos europeus. A expectativa de fontes próximas ao PT é que Lula sinalize, no Egito, a possibilidade de indicar Marina Silva ao comando de uma agência reguladora na área ambiental, que será criada no terceiro mandato do petista.
De acordo com o diplomata Rubens Ricupero — ex-ministro da Fazenda e do Meio Ambiente —, a presença de Lula na COP27 é "extremamente favorável" para Lula e "muito positiva" para o evento e para o mundo.
"Ele já tinha anunciado a intenção de viajar antes da posse, como tinham feito Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves pela mesma razão: ajudar a passar o período tenso e perigoso antes da posse e não fornecer pretextos para atos golpistas", destaca Ricupero.
Agora, na avaliação dele, com o convite do Egito para Lula comparecer à COP27, a viagem adquire aspecto de viagem presidencial, de estadista, de alguém que ainda não tomou posse, mas já é visto como a fonte para onde deriva o verdadeiro poder no Brasil.
"Celso Lafer chamou a viagem de Tancredo antes da posse que não houve de 'o momento presidencial de Tancredo'. A expressão pode igualmente ser aplicada à atual viagem de Lula: será o seu primeiro 'instante presidencial', lhe oferecerá a oportunidade de tratar com chefes de governo e chefes de Estado e de ser tratado como um deles", explica o ex-ministro.
Na avaliação de Ricupero, o sinal que Lula precisa dar ao mundo na viagem ao Egito, em companhia da ex-ministra Marina Silva, é demonstrar que a Amazônia e o meio ambiente serão a coluna mestra de sua política exterior. "Durante os dois mandatos anteriores de Lula, a questão ambiental ainda não ocupava a posição central que hoje ocupa na agenda mundial. Naquela época, Lula era valorizado lá fora sobretudo pela sua ação social. Hoje, no entanto, a temática ambiental adquiriu uma premência e uma importância central que ofuscam os demais aspectos", destaca. Para ele, o tema pode render mais dividendos a Lula e ao Brasil em termos não só de imagem, "mas, também, de financiamentos, investimentos, iniciativas econômicas para aproveitar o potencial do país nos inúmeros aspectos construtivos do meio ambiente, como mercado de carbono, pagamento por serviços ambientais, reflorestamento, recuperação de áreas degradadas, conquista de mercados para produtos com selo ambiental.
"Pode-se afirmar que, para Lula e para o Brasil, o meio ambiente é uma espécie de tema dos sonhos: produz enorme retorno e não acarreta nenhum custo ou ônus, a não ser o combate às atividades criminosas de grileiros, madeireiros e garimpeiros ilegais", disse o diplomata.
Governança ambiental
Dawisson Belém Lopes, professor de política internacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisador da Universidade de Oxford, no Reino Unido, também considera uma "boa notícia" a ida de Lula e Marina Silva ao Egito. "Essa viagem deixa claro que a ênfase do governo que virá será em temas ambientais e na governança ambiental global, que é uma questão importantíssima nos tempos atuais", avalia. "Lula terá a oportunidade de ser tratado como presidente antes mesmo de assumir, o que é muito bom, porque antecipa o processo e o acesso aos líderes globais", acrescente.
O consenso entre analistas é que, em termos de diplomacia e política ambiental, haverá uma guinada de 180 graus no país com o novo governo. Não à toa, as representações diplomáticas do país no exterior estão percebendo o interesse de reatar as conversas com o governo brasileiro. Fontes do Ministério das Relações Exteriores estimam um número de presidentes e chefes de Estado maior do que o da posse de Bolsonaro, que teve 10 líderes presentes. Autoridades do Chile, que não tem mais nem embaixador desde a posse do novo presidente, o socialista Gabriel Boric, em março, sinalizaram que o chefe do Executivo chileno virá para a posse de Lula em 1º de janeiro.
Em entrevista ao Correio, o embaixador do Brasil no Chile, Paulo Pacheco, contou que, com a mudança do governo, a tendência é de as relações políticas e diplomáticas entre os dois países ficarem mais fluidas.
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