Centro da crise política do país nos últimos anos, o Judiciário pode voltar a ter uma relação harmônica com o Executivo a partir de 2023. Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito presidente da República, tem o desafio de recuperar a paz institucional entre os Poderes e indicar os novos nomes que estarão à frente dos tribunais superiores. Segundo fontes ouvidas pelo Correio, o petista tem ouvido sua equipe técnica até decidir seus indicados.
No Supremo Tribunal Federal (STF), Lula poderá indicar dois ministros para substituir Rosa Weber e Ricardo Lewandowski — que vão se aposentar em 2023 devido à idade. Segundo apurou o Correio, até o momento, os nomes citados pela equipe do presidente eleito foram: Pedro Serrano, Lenio Streck, Cristiano Zanin e Silvio de Almeida. Entre as mulheres, são cotadas Dora Cavalcanti e Flávia Rahal.
De acordo com aliados do presidente, Lula ainda não bateu o martelo sobre a decisão. Ele vai aguardar os conselhos de sua equipe técnica. O objetivo é indicar pelo menos um magistrado com o perfil de Lewandowski — que foi indicado pelo petista em 2006. Caso suas duas próximas indicações sejam aprovadas, ele vai seguir tendo indicado 4 dos 11 ministros da Corte.
No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Lula também terá direito de indicar um nome. Ainda no primeiro ano de governo, o chefe do Executivo terá duas indicações ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Corte é composta por 33 ministros nomeados pelo presidente da República, após sabatina do Senado.
Fora dos tribunais, Lula também irá indicar o nome do próximo procurador-geral da República, chefe do Ministério Público Federal (MPF). Porém, a tendência é que ele respeite a tradição de acatar a lista tríplice elaborada pelos procuradores do órgão. Com exceção do TSE, os indicados são submetidos a uma sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
Na avaliação do professor de estudos brasileiros da Universidade de Oklahoma (EUA) Fabio de Sá e Silva, os envolvidos vão precisar de ponderação para retomar a relação institucional. "Lula precisará ser moderado nas escolhas para a PGR e o Ministério da Justiça; ao mesmo tempo, o Judiciário e o Ministério Público terão que demonstrar autocontenção e resistir à tentação de criminalizar a política", destacou.
"Esses órgãos ainda terão que lidar, de maneira inteligente e estratégica, com o passivo de violações legais de Bolsonaro e seu governo, bem como com a tarefa de enfrentar o extremismo político, o maior desafio hoje para o restabelecimento da normalidade democrática no país", apontou Silva.
Na avaliação do advogado Cristiano Vilela, especialista em direito público, Lula deve apostar na diversidade. "Há uma tendência de que os nomes a serem indicados pelo Presidente para a atuação na esfera jurídica, tanto na administração direta como para a indicação aos tribunais, sejam de figuras com bom trânsito entre os poderes e com o favorecimento de critérios de diversidade", destacou.
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Desafios
Com uma agenda extensa, Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou na última semana em Brasília, onde se reunião com os presidentes do STF e TSE: Rosa Weber e Alexandre de Moraes, respectivamente. À imprensa, o petista afirmou que vai trabalhar para o restabelecimento da harmonia e que é "plenamente possível recuperar a normalidade da convivência".
O posicionamento difere do que o presidente Jair Bolsonaro (PL) — derrotado nas urnas no dia 30 de outubro — manteve nos últimos anos. Ele alimentou uma relação conflituosa com o Judiciário desde que assumiu o mandato. Além de acusar o STF de agir com ativismo, no auge da campanha eleitoral também defendeu publicamente o aumento de ministros, de 11 para 16.
A última vez em que o número de magistrados da Suprema Corte foi alterado foi durante a ditadura militar, onde passou a ter 15 integrantes. Bolsonaro já indicou dois integrantes da Corte: Nunes Marques e André Mendonça, que costumam votar reiterados com o Executivo.
Para o jurista e cientista político Enrique Carlos Natalino, Lula também terá momentos de discordância com o Judiciário. A diferença será no trato institucional. "Eu acredito que a relação entre Lula e os Poderes da República será pautada por uma relação mais republicana, mais respeitosa do que foi com o governo Bolsonaro", disse.
"Não quer dizer que ele não terá problemas com a relação com o Supremo Tribunal Federal, até porque com a judicialização da política, que acaba levando a uma maior tensão entre os poderes. Mas chegamos em um nível de tensão muito alta. Lula, pela sua experiência, pela sua trajetória, terá uma postura diferenciada", observou.
O coordenador do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, afirmou estar positivo com as mudanças. "O presidente sempre respeitou a independência entre os Poderes e dialogou. Sempre foi um defensor das instituições. A expectativa é dos lados. De Lula, é que ele tenha reciprocidade e do Judiciário é de respeito", disse.