ENTREVISTA

"Pacificação não é esquecimento", diz Boulos sobre novo governo em 2023

Membro da equipe de transição, Boulos vê espaço para retomada de propostas sociais

Guilherme Peixoto - Estado de Minas
Bertha Maakaroun - Estado de Minas
postado em 10/11/2022 12:22 / atualizado em 10/11/2022 12:22
 (crédito: Reprodução/Youtube @Lula)
(crédito: Reprodução/Youtube @Lula)

O papel do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de pacificar a sociedade brasileira, combater a intolerância e a violência política não deve ser confundido com anistia a crimes eleitorais, contra as instituições democráticas e de corrupção.

A opinião é do deputado federal eleito Guilherme Boulos (Psol-SP), que conquistou 1.001.472 votos, mais votado de São Paulo, o que reforça a sua disposição de concorrer, com o apoio do PT, à prefeitura municipal de São Paulo em 2024.

“Queremos dialogar, e será papel do presidente Lula, que tem esse viés unificador, pacificar os ânimos da sociedade brasileira. Mas isso não significa nenhum tipo de anistia”, declara em entrevista ao Estado de Minas, referindo-se às denúncias envolvendo o presidente Jair Bolsonaro (PL) e sua família, que devam ser apuradas.

Convidado para integrar a equipe de transição de Lula, Boulos sustenta que, apesar da frente ampla, em defesa da democracia, que respaldou a candidatura presidencial petista, a esquerda, representada por seu partido, não vai abrir mão de sua agenda para o país.

Lula e a frente ampla que o apoiou venceu as eleições. Mas há um movimento golpista nas ruas que pede intervenção militar. Como a esquerda vai lidar com essas pessoas que estão nas ruas, numa espécie de transe?
Em primeiro lugar, temos de estabelecer a realidade factual. Lula ganhou as eleições, teve mais de 60 milhões de votos e se tornou o presidente com a maior votação da história da democracia brasileira. Teve vitória incontestável, diante de todos os observadores internacionais. Não há o quê se falar sobre a lisura e legitimidade do processo eleitoral brasileiro. Esses questionadores vivem numa realidade paralela, e por mais que façam barulho nas ruas, não expressam nem de longe a maioria do povo brasileiro e não representam sequer a maioria que votou no Bolsonaro. É um grupo de pessoas extremistas, golpistas, com uma agenda antidemocrática, querendo pautar a agenda pública do país. Não vão pautar. Queremos dialogar, e será papel do presidente Lula, que tem esse viés unificador, pacificar os ânimos da sociedade brasileira. Combater a intolerância, a violência política. Agora, isso não significa abrir mão da agenda que ganhou as eleições. E isso não significa nenhum tipo de anistia. Estou entre aqueles que acham que Jair Bolsonaro e seus filhos vão ter de responder pelos crimes que cometeram. A pacificação do país não significa esquecimento nem passar pano em atitudes criminosas. A partir de 1º de janeiro de 2023, quando ele não terá mais foro especial, isso passará pelas acusações criminais em primeira instância, como qualquer cidadão. Ele terá de responder. Não vai haver mais sigilo de 100 anos.

Ao não repudiar as manifestações de rua que pedem intervenção militar, em sua avaliação, Jair Bolsonaro se fortalece como liderança da oposição ao governo Lula?
Se ele quer se cacifar como liderança de oposição ao Lula, cometendo mais crimes, são mais crimes que entram na ficha corrida que ele terá de responder. Porque o que ele faz, ao não reconhecer os resultados das eleições, ao orientar a Polícia Rodoviária Federal a prevaricar, como aconteceu, é também crime. Agora, francamente, não estou preocupado com as manifestações. Estão se dissolvendo, são grupos cada vez mais caricatos. É lógico que o bolsonarismo vai seguir na força de oposição a Lula, mas essa disputa vai se dar no Congresso Nacional.

Frentes amplas costumam ser bons mecanismos para ganhar eleições, mas para governar o desafio é sempre maior. Quais são as propostas objetivas do Psol para contemplar os setores populares nessa frente ampla?
Há várias propostas, mas vou citar três principais. A primeira é revogar medidas de retrocesso aprovadas no governo Temer e no governo Bolsonaro. Aqui estou falando do teto de gastos; que seja firmado outro marco fiscal, que permita investimento social. E em particular a reforma trabalhista, que precisa ser revista para garantir a trabalhadores e trabalhadoras, aí incluindo os que atuam na chamada economia de plataforma. Uma segunda questão, é uma política de retomada do investimento público, aumento real do salário mínimo, retomar investimento em moradia popular, saneamento básico, infraestrutura, que cumpre papel de estimular a geração de emprego e renda. Precisamos fazer investimento público acontecer em obras essenciais, em educação, em ciência e tecnologia. E um terceiro ponto, que o presidente Lula já sinalizou, é uma agenda ambiental ousada. Esses são alguns pontos que o Psol levará para o debate da transição.

A eleição nacional teve grande foco em Minas e o governador Romeu Zema foi um dos principais cabos eleitorais de Bolsonaro no segundo turno. Como será a relação de Lula com Zema após tanto acirramento?
Minas Gerais é o segundo estado mais populoso do país, um estado muito importante. Acredito que Lula terá relação institucional com os governadores. Agora, não podemos deixar de notar o oportunismo eleitoral do governador Zema. Faltou da parte dele uma atitude mais equilibrada nesse processo. Ainda assim, o presidente Lula ganhou em Minas e no Brasil.

O senhor é candidato a prefeito de São Paulo em 2024?
Sim, tenho disposição de ser candidato a prefeito em São Paulo. Fui candidato em 2020, mesmo tendo cinco candidaturas no campo progressista. Mesmo tendo 17 segundos na televisão, chegamos ao segundo turno e quase ganhamos a eleição da maior cidade da América Latina. Fizemos acordo, compromisso público de o PT nos apoiar em 2024. Então, pretendo, sim, ser candidato a prefeito, mas antes disso vou cumprir a missão no Congresso em 2023.

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