O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chega hoje a Brasília com um a agenda carregada, na qual constam reuniões com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber. Do ponto de vista prático, isso significa que está operando a transição de governo junto aos demais Poderes, o que deve esvaziar ainda mais o poder do presidente Jair Bolsonaro nos dois meses que lhe restam de mandato. Indagado sobre as tensões políticas pós-eleitorais, um ministro do Supremo que dialoga com os dois lados minimizou a importância dos protestos realizados por bolsonaristas no fim de semana: "Lula já assumiu o vértice do sistema de poder", ou seja, a alta burocracia federal já o pera a transição político-administrativa como deve ser.
O presidente Jair Bolsonaro, a propósito, continua sem agenda relevante e digerindo o resultado das eleições. Suas declarações são de líder da oposição. Até hoje não reconheceu formalmente a derrota nem cumprimentou o presidente eleito. Em seu pronunciamento após a eleição, deixou claro que considera seu grande legado a formação de uma direita organizada no Brasil. É a primeira vez que um político na Presidência da República se assume como um líder de direita. Líderes da antiga UDN, por exemplo, que eram a expressão da direita golpista durante a guerra-fria, jamais assumiram essa condição. Todos se diziam liberais, como Eduardo Gomes, Carlos Lacerda e Magalhães Pinto.
Os encontros com Lira e Pacheco são importantes para a construção da base parlamentar no novo governo e a viabilidade das medidas dos primeiros 100 dias de governo. O Orçamento de 2023 é uma bomba de efeito retardado, porque não prevê recursos para o Auxílio Brasil e para as políticas públicas. Por exemplo, verbas para a campanha de vacinação contra a Covid-19, que já dá sinais de que está voltando. Essa negociação é crucial, mas depende também de decisões sobre a equipe econômica do novo governo. A incorporação dos economistas André Lara Resende, Persio Arida e Guilherme Melo na equipe de transição descontentou os economistas do PT, que tinham expectativa de que o ex-senador Aloizio Mercadante fosse anunciado para comandar a política econômica do novo governo.
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Governabilidade
A conversa de Lula com o vice-presidente, Geraldo Alckmin, coordenador da equipe de transição e responsável pela incorporação dos economistas do Plano Real, ontem, pode ter resultado na indicação do futuro ministro da Fazenda (ou da Economia, se for mantida a nomenclatura atual). É preciso pôr fim às especulações no mercado, que estão provocando instabilidade no câmbio e nas ações da Bovespa. Por exemplo, no caso da Petrobras, havia uma quase certeza no mercado financeiro de que a empresa seria privatizada, caso Bolsonaro fosse eleito. Essa possibilidade está descartada, mas ainda permanecem grandes dúvidas quanto à política de preços e as prioridades de investimentos da petroleira.
Pelo acordado durante o fim de semana, Lula deve se reunir com a equipe amanhã para definir uma solução para a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, na tentativa de acomodar a extensão do Auxílio Brasil de R$ 600 para 2023. As conversas de Lula com Pacheco (PSD-MG) e Lira (PP-AL) são fundamentais para a governabilidade do novo governo. No caso de Pacheco, a relação é fundamental para o êxito do governo Lula, porque é uma Casa revisora e que sempre cumpriu um papel relevante no sentido de garantir a governabilidade. Além disso, Pacheco é o mais importante representante do PSD no Congresso, legenda que já negocia, por meio de seu presidente, Gilberto Kassab, sua participação no governo. Partido de centro-direita , a legenda tem 11 senadores e 42 deputados.
Uma conversa estratégica é com Arthur Lira, que controla o Orçamento da União. Seu partido foi a viga mestra da base de sustentação do governo, sob comando do presidente da legenda, Ciro Nogueira, o ministro da Casa Civil e responsável pelo diálogo entre o atual governo e os integrantes da equipe de transição de Lula. O caminho crítico da relação entre Lula e Lira é a eleição para a Presidência da Câmara, chave para os dois primeiros anos de mandato de Lula. Hoje, o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, deve revelar se a legenda do presidente Jair Bolsonaro lançará candidato a presidente da Câmara ou apoiará Lira.
Outro elemento complicador na relação com o Congresso é a posição do MDB, cujo presidente Baleia Rossi (SP), foi adversário de Lira na sucessão de Rodrigo Maia, em 2020. O Renan Calheiros, por cacique da legenda e adversário de Lira, já critica Lula, porque estaria cedendo demais às exigências do Centrão. Com 42 deputados e dez senadores, o MDB saiu muito fortalecido da eleição. Sua candidata, Simone Tebet, foi decisiva para a eleição de Lula e deve integrar o novo governo. O MDB discute com o PSDB o Cidadania e o Podemos a formação de uma frente parlamentar no Congresso e, talvez, uma federação das quatro legendas.
Para aprovar a tal PEC da Transição, Lula precisará contar com o apoio de 219 deputados e 14 senadores que não foram reeleitos.
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