NOVO GOVERNO

Equipe de transição define os três eixos que vão nortear os trabalhos no CCBB

Economia, desenvolvimento social e defesa da democracia serão os principais temas que serão debatidos, a partir de hoje, pela equipe de Lula no CCBB. O início dos trabalhos terá como base um documento de cerca de 450 itens

Vinicius Doria
postado em 07/11/2022 06:00
 (crédito: Gabriela Ornelas/CB/D.A.Press)
(crédito: Gabriela Ornelas/CB/D.A.Press)

Entre as promessas de campanha e a realidade do país há um abismo a ser transposto, a partir desta segunda-feira (7/11), pela equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e do vice, Geraldo Alckmin (PSB), que vai comandar o time que começa a trabalhar na sede do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Setor de Clubes Sul da capital federal. Ao longo da semana, o Diário Oficial da União trará os nomes dos políticos e técnicos que vão preencher os 50 cargos provisórios destinados pela legislação à equipe do governo eleito.

O início dos trabalhos terá como base um documento — ainda não divulgado — de cerca de 450 itens, que se tornará o plano de governo de Lula e Alckmin, a partir de janeiro. O documento recebeu mais de 13 mil sugestões de entidades e organizações da sociedade civil e de pessoas que participaram da consulta pública digital promovida pelo PT.

A equipe que vai trabalhar no CCBB será divida em três grandes núcleos, subdivididos em grupos setoriais. Os eixos principais são economia, desenvolvimento social e defesa da democracia, com foco no que internamente é chamado de "reconstrução do Estado brasileiro", cujo objetivo é fortalecer as instituições e dar mais transparência aos atos de governo.

Esse time será liderado pelo ex-ministro Aloísio Mercadante, que foi o coordenador das Diretrizes para o Programa de Reconstrução de Transformação do Brasil, registrado no Tribunal Superior Eleitoral como base do programa de governo da chapa Lula-Alckmin.

Ministros e Congresso

A articulação política para a montagem da equipe do futuro governo, como a indicação de ministros e altos dirigentes da administração pública, se dará em São Paulo, no escritório do presidente eleito, com a participação da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e do vice, Geraldo Alckmin. A ideia é não ter entra e sai no CCBB de nomes "cotados" para assumir cargos, o que não significa que, dentre os membros da transição, não saia um "nomeado".

O maior desafio será adequar as promessas de campanha às restrições orçamentárias para 2023, que não contemplam sequer despesas básicas de políticas públicas em curso, como Farmácia Popular, merenda escolar e campanhas de vacinação. Para isso, entra em campo o terceiro time da transição, o político, responsável pela negociação com partidos no sentido de oferecer saídas legais, viáveis e negociadas para enfrentar a falta de recursos. Apesar de ter defendido a revogação da Lei do Teto de Gastos, que condiciona o aumento das despesas às receitas da União, o presidente eleito Lula já deu aval a saídas alternativas.

A manutenção de alguma âncora fiscal é defendida por economistas que apoiaram a eleição de Lula. A tese ganhou força na reunião da semana passada entre Alckmin, Hoffmann e Mercadante com o relator-geral do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI). Em vez da proposta de revogar o teto de gastos, está sendo negociada uma saída para excepcionalizar despesas para cobrir os aumentos do Bolsa Família para R$ 600 (que voltará a ter esse nome, depois de rebatizado pelo governo Bolsonaro como Auxílio Brasil) e do salário-mínimo, que terá reajuste acima da inflação no ano que vem.

"Tecnicamente, o mais viável é manter a regra do teto de gasto com algumas exclusões", disse ao Correio um dos especialistas que devem ser nomeados para trabalhar no CCBB. Essa alternativa também é defendida pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, um dos nomes mais cotados para assumir o Ministério da Economia em janeiro, e pelos economistas que criaram o plano Real Pérsio Arida e André Lara Resende, convidados por Lula para integrar a transição.

A conta da mudança de governo será alta. Levantamento preliminar da equipe de campanha da chapa Lula-Alckmin aponta que serão necessários, pelo menos, R$ 150 bilhões para fazer frente às despesas contratadas pelo presidente eleito. Além da manutenção do Bolsa Família em R$ 600 e do aumento real de 1,3% a 1,4% para o salário-mínimo — que custarão R$ 52 bilhões e R$ 6,1 bilhões, respectivamente —, ainda serão necessários mais R$ 18 bilhões para assegurar o pagamento adicional de R$ 150 por criança atendida pelo programa de transferência de renda; R$ 7 bilhões para renegociação de dívidas de estados e municípios; R$ 1,2 bilhão para o Farmácia Popular; R$ 10 bilhões para zerar a fila do SUS; R$ 21 bilhões para aumentar a faixa de isenção do Imposto de Renda para R$ 5 mil; e R$ 25 bilhões para investimentos no Minha Casa, Minha Vida, que será um dos carros-chefe da política de retomada de investimentos públicos para reativar a economia. Fora os recursos para educação e meio ambiente, duas prioridades do governo eleito.

Investimentos

Um dos pontos críticos que serão avaliados pelo staff do gabinete provisório será a limitação orçamentária para investimentos. Além da PEC da Transição — ou de uma medida provisória, que também está sendo negociada — outras alternativas estarão em debate. Uma delas é lançar mão da prerrogativa constitucional para compra de títulos públicos do Tesouro pelo Banco Central. O artigo 164 da Carta Magna, que define a exclusividade da autoridade monetária para emitir moeda em nome da União, contempla a possibilidade de o Banco Central "comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, com o objetivo de regular a oferta de moeda ou a taxa de juros". Com a regulamentação desse disposto constitucional, a dobradinha entre Tesouro e BC poderia viabilizar o aporte adicional de recursos para ampliar a capacidade de investimentos. "É o governo se endividando com o próprio governo", explicou uma das fontes ouvidas pelo Correio.

A equipe de transição também vai se debruçar na preparação de medidas que serão implementadas nos primeiros dias de janeiro, como a retomada das operações de repressão ao garimpo ilegal, à grilagem e ao tráfico de drogas e armas na Amazônia, e a revisão de todos os decretos do presidente Bolsonaro que facilitaram o acesso a armas e munições, devolvendo ao Exército o papel de fazer a fiscalização e o rastreio desse armamento.

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NÚMERO

R$ 52 bilhões
Custo estimado para a manutenção dos R$ 600 do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família, no ano que vem

Ciro Nogueira é contra crédito extraordinário

O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, criticou neste domingo a possibilidade de abertura de crédito extraordinário pelo futuro governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para dar continuidade ao pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600.

"Os técnicos em finanças públicas entendem que, para abrir um crédito extraordinário da forma tradicional prevista na Constituição, como exceção ao teto de gastos, precisa-se justificar a urgência e imprevisibilidade. Como fazer isso para uma despesa continuada, como o Auxílio Brasil? Eles apontam que não parece que o simples fato da falta de recursos seja justificativa suficiente para respaldar a edição de um crédito extraordinário", afirmou Nogueira, em mensagem de WhatsApp enviada aos seus contatos nesta manhã.

O ministro lembra ainda que os créditos extraordinários do auxílio emergencial tiveram respaldo em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). "Os mesmos técnicos apontam que o TCU, órgão de assessoramento do Poder Legislativo, não pode tornar o Poder Legislativo um órgão acessório ao TCU, pois feriria a Constituição", completa Nogueira.

A abertura de crédito extraordinário tem sido tratada pela equipe de transição do governo eleito como uma alternativa, um plano B, à Proposta de Emenda à Constituição (PEC), chamada de PEC da transição, que deixaria as promessas de campanha fora do teto de gastos — regra que limita o crescimento das despesas do governo à inflação do ano anterior. O senador eleito Wellington Dias (PT-PI) afirmou, na sexta-feira, que a equipe estaria "fixada" na PEC.

"Ainda estamos na organização de duas frentes. Uma, primeiro, diz respeito à redação da PEC. Temos essa alternativa da PEC. O Tribunal de Contas da União tem também essa alternativa do crédito extraordinário. Porém, nós estamos fixados aqui no diálogo que temos tido com o presidente do Senado, o presidente da Câmara, a Comissão de Orçamento, o relator, senador Marcelo Castro, todas as equipes técnicas estão trabalhando para que a gente tenha muita segurança e, a partir daí, a redação desse projeto de emenda constitucional", declarou Dias, após uma reunião do PT no Senado na sexta-feira.

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