Em meio aos trabalhos da transição entre o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) e o terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que fazem a nova administração federal começar a tomar forma, ganham corpo as primeiras conversas a respeito da escolha dos ministros de Estado. A fim de não perder aliados, Lula evitou durante toda a campanha apontar nomes de chefes de setores importantes, como a economia. Agora, depois da vitória nas urnas, interlocutores do PT e aliados de outros partidos admitem possibilidades. De Minas Gerais, ao menos dois nomes são listados por fontes ouvidas pelo Estado de Minas para eventuais cargos no governo.
Um deles é o deputado federal Reginaldo Lopes (PT); o outro, o senador Alexandre Silveira (PSD). O petista é aventado para o Ministério da Educação, enquanto Silveira é citado para um possível cargo na área da infraestrutura federal – a favor dele, pesa o fato de já ter sido diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).
Reginaldo encabeçou o comando da campanha de Lula em Minas Gerais. No segundo turno, passou a ter a companhia de Silveira, que assumiu a coordenação política do grupo. Embora seja economista de formação, o deputado do PT tem trajetória ligada à educação. Foi, inclusive, o representante da coalizão lulista em uma sabatina sobre o tema promovida pela Folha de S.Paulo em setembro. Reginaldo é ligado, também, à ciência e tecnologia, setor que, sob Bolsonaro, tem ministério próprio, desvinculado da pasta que cuida do ensino público.
A percepção de aliados sobre a possibilidade de Reginaldo emplacar posto de primeiro escalão na Educação ou na Ciência e Tecnologia vai ao encontro da boa relação do deputado com Lula. Líder do PT na Câmara dos Deputados, o parlamentar ensaiava uma pré-candidatura ao Senado e liderava pesquisas sobre a disputa, mas abriu mão para apoiar a campanha de Silveira à reeleição. O movimento proporcionou a união da federação formada por PT, PCdoB e PV a Alexandre Kalil (PSD), que se candidatou ao governo e abriu o palanque a Lula.
"Atitude histórica"
À época da saída de Reginaldo do páreo pelo Senado, o então presidenciável chamou o gesto do correligionário de “atitude histórica”. “Reginaldo, da forma mais extraordinária, solidária e fraterna que um ser humano pode ser, resolveu retirar a candidatura dele ao Senado e se colocar à disposição, a pedido meu e de Gleisi Hoffmann, para ser o coordenador de minha campanha em Minas”, festejou Lula na época.
Silveira, por sua vez, tem o nome ligado ao comando do Dnit, mas aliados também citam a chance de ele assumir alguma pasta fruto do desmembramento do Ministério do Desenvolvimento Regional. Da divisão, devem ser recriados, por exemplo, os ministérios das Cidades e da Integração Nacional. As duas pastas estão relacionadas ao papel que o senador teve na campanha de Lula em Minas.
Bem relacionado com prefeitos, ele foi escalado para conter a ofensiva que Bolsonaro e o governador Romeu Zema (Novo) fizeram para tentar atrair o apoio de lideranças municipais. Nas urnas, embora tenha crescido mais de seis pontos percentuais em relação ao primeiro turno, o candidato à re- eleição perdeu a disputa final para Lula no estado por 50,2% a 49,8%.
Silveira mergulhou na campanha de Lula mesmo após perder a reeleição para Cleitinho Azevedo (PSC). O empenho do senador, citado, também, para a pasta de Minas e Energia, é valorizado pelo PT. Se o provável embarque do PSD à base de Lula for concretizado, o partido deve ter a chance de indicar nomes para a administração federal. Ben-quisto pelo presidente da sigla, Gilberto Kassab, o parlamentar mineiro poderia ser um dos escolhidos para a cota partidária.
Reeleição do correligionário
Sob reservas, um interlocutor ligado à coalizão de Lula apontou que a possível escolha de Silveira para ocupar uma das vagas destinadas ao PSD, além de contemplar a legenda, levaria um nome de Minas Gerais à Esplanada dos Ministérios. O senador mineiro vai receber uma recompensa indireta pelo esforço pró-Lula se o PT apoiar a recondução de Rodrigo Pacheco (PSD) ao Congresso Nacional. Segundo soube a reportagem, a reeleição do correligionário é uma das prioridades de Silveira.
A necessidade de ter um nome mineiro no governo, aliás, é um dos pontos que podem auxiliar Reginaldo Lopes. Isso porque, embora a senadora Simone Tebet (MDB-MS) também seja cotada para a cadeira de chefe da Educação, o deputado teria o apoio dos diretórios mineiros do PT, PCdoB e PV em eventual concorrência pela vaga. O estado foi o único das quatro unidades federativas do Sudeste que Bolsonaro não arrematou no segundo turno.
O deputado ganhou protagonismo também no núcleo responsável pela passagem de bastão entre os governos. Ele é um dos responsáveis por construir a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, articulada pela base lulista para abrir espaço fiscal no Orçamento de 2023 e tentar garantir, por exemplo, a continuidade de pagamentos mensais de R$ 600 de auxílio.
O deputado estadual Cristiano Silveira, presidente do PT em Minas Gerais, diz estar “otimista” sobre a presença de representantes do estado em assentos importantes do terceiro governo de Lula. “Um ministério tem de ser convite do presidente. Minas tem bons quadros e pode colaborar no governo Lula”, afirma, listando não apenas Reginaldo e Silveira, mas, também, Alexandre Kalil. “Lula, se precisar, poderá contar com esses personagens”, garante o dirigente.
Janones entre os mais cotados
A campanha de Lula também teve a importante participação de outro mineiro: o deputado federal reeleito André Janones, do Avante. Conselheiro do presidente eleito para assuntos ligados às redes sociais, ele abriu mão de candidatura própria ao Palácio do Planalto para apoiar o petista. Reservadamente, há quem especule cenário em que Janones assuma o Ministério das Comunicações. Essa conjuntura, contudo, ainda é tratada de forma incipiente, visto que Lula não fez convites oficiais aos integrantes de seu futuro time.
A avaliação é que Janones poderia replicar, no governo, as táticas que usou para minar os efeitos da estratégia digital bolsonarista. O deputado travou embates digitais com figuras como Nikolas Ferreira (PL), apoiador do presidente derrotado. Na reta final do segundo turno, a coligação de Bolsonaro pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que os perfis do parlamentar do Avante nas redes sociais fossem suspensos. A solicitação, contudo, acabou negada.
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Ainda no Avante, quem também pode ganhar impulso com a vitória de Lula é Luis Tibé, deputado federal por Minas e presidente nacional da agremiação. Tibé articula uma candidatura ao Tribunal de Contas da União (TCU), em eleição a ser realizada pela Câmara. A expectativa é que, após o apoio do partido ao PT na corrida ao Palácio do Planalto, os deputados petistas endossem a empreitada de Tibé. Ele deseja ocupar o assento que vai ser deixado após a aposentadoria da ministra Ana Arraes. O pleito para a corte de Contas é secreto e não tem data marcada – a responsabilidade cabe a Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara.
Tradição mineira na Esplanada
Se indicar mineiros para compor o governo federal, Lula vai dar continuidade à tradição de ter representantes do estado em postos estratégicos de sua gestão. O deputado federal Patrus Ananias (PT), por exemplo, foi ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome entre 2004 e 2010. O também petista Nilmário Miranda, por sua vez, foi o chefe da Secretaria Especial dos Direitos Humanos.
Atualmente filiado ao PSB, o ex-emedebista Saraiva Felipe ocupou o Ministério da Saúde entre 2005 e 2006. Quem também representou Minas no governo Lula foi Walfrido dos Mares Guia, um dos principais interlocutores do presidente eleito no estado. Em Brasília (DF), Walfrido foi ministro do Turismo entre 2003 e 2007. No mesmo ano, foi o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República.
A relação entre ele e Lula se fortaleceu e a amizade entre os dois persiste. Sob a gestão de Dilma Rousseff (PT), houve espaço para Fernando Pimentel, do mesmo partido, que comandou os trabalhos no setor de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Em 21 de outubro, durante a última passagem por Minas Gerais, Lula concedeu entrevista exclusiva ao Estado de Minas, à TV Alterosa e ao Portal Uai. Na conversa, ele evitou cravar o tamanho do espaço destinado ao estado no primeiro escalão do Planalto, mas valorizou a importância da política mineira. “Não é possível cravar um número porque, antes das eleições, se você ficar nomeando ministro, você termina perdendo mais amigo do que conquistando amigo”, disse. Segundo o presidenciável, os mineiros “nunca tentam desrespeitar a pessoa” e estão “sempre querendo conversar”. “De conversa em conversa, o mineiro vai ganhando espaço”, emendou.
Neste ano, ao escolher Geraldo Alckmin (PSB) como parceiro de chapa, Lula seguiu um “roteiro” que já havia utilizado em 2002, quando chamou José Alencar (1931-2011) para ser seu candidato a vice-presidente. Fundador da empresa têxtil Coteminas, Alencar, nascido em Muriaé, na Zona da Mata, ajudou o PT a quebrar a resistência demonstrada por setores refratários às ideias do partido. Alencar tinha feito carreira no MDB, mas à época Lula alojou Alencar em uma legenda de sua base aliada – o antigo Partido Liberal (PL). Vinte anos depois, Alckmin viveu situação semelhante e, após deixar o PSDB, foi se abrigar no PSB, posicionado do centro à esquerda.
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