Sêneca, filósofo estoico que viveu durante o auge do Império Romano, ficou conhecido por suas inúmeras cartas. Textos que serviam como uma espécie de direção na vida, um rumo a tomar diante de contextos difíceis e decisões complexas.
Mas tenhamos calma com as comparações: ele não era uma espécie de coaching do mundo antigo. Era apenas um pensador que advogava a premissa da filosofia como instrumento para viver melhor.
Afinal, se a natureza (ou Deus, para alguns) nos proporcionou o pensamento, e isso nos diferencia dos outros viventes, devemos usá-lo como instrumento de melhoramento existencial. Uma vida bem refletida nos previne de erros advindos de uma existência ignorante. A reflexão filosófica seria, nesse caso, a melhor vacina contra o sofrimento.
Sim, caro leitor, havia um tempo em que a filosofia não era um compêndio de textos herméticos, circunscritos aos eleitos agraciados pelo dom divino da fala difícil e escrita ininteligível. Ela era vista como uma espécie de medicina da alma e servia somente para isso.
As cartas do nosso filósofo serviam como receituário para uma vida mais feliz. Indico, para esse momento de nosso País, duas em especial: Sobre a Ira e Sobre a Brevidade da Vida.
Faço um exercício além: fico a imaginar o pensador estoico escrevendo para nós, brasileiros e brasileiras que acabamos de passar pelo pleito, com um país dividido, famílias em litígio e amizades desfeitas.
E aqui vai um detalhe importante, Sêneca foi senador durante o império de Calígula e tutor de uma criança que também dominaria Roma, Nero. Sobrevivendo ao primeiro tirano, sucumbiu ao segundo, que o obrigou ao suicídio. Com mania de perseguição, característica típica de todo autocrata, o Imperador suspeitava de uma traição por parte de seu professor e conselheiro.
Nesse contexto, não é difícil imaginar Sêneca escrevendo uma carta para o povo brasileiro, com o título: Sobre Ganhos e Perdas.
Vejamos:
“Caros amigos,
A vida nada mais é arte de suportar as coisas. E política é apenas uma organização social que nos ensina a suportar o outro. Engana-se quem espera nela alguma forma de felicidade. A Ciência do Estado não possui essa finalidade. Apenas a filosofia pode nos salvar, a única capaz de viver em liberdade diante das paixões ideológicas e dos ímpetos autoritários.
Como arte de tolerar o diferente e não sentir vontade de eliminá-lo, a Política só existe para que a violência deixe de ser o princípio regulador da relação entre os homens, legitimando a linguagem, a palavra, como elemento de consenso entre seres diferentes. É político aquele que aprende a agir pela força da razão, e não em razão da força.
Então, o maior ensinamento que a vida na pólis nos oferece é a possibilidade de resistir diante da adversidade: afinal, o mundo é uma máquina preparada para destruir nossa autoestima. Ganhamos algumas vezes, mas perdemos a quase todo momento: nossas células, nossa juventude, nosso dinheiro, nossa saúde e, também, nossas aspirações políticas.
É por isso que viver em sociedade é, antes de tudo, aprender a perder sem sofrimento, vencer sem arrogância e a reagir sem violência. Assim como toda vitória não passa de uma ilusão diante da instabilidade que configura a realidade, pois as decisões humanas são terreno fértil para a vaidade, corrupção da alma, a derrota também não pode ser uma autorização para legitimar atos de destruição.”
Assinado: Sêneca, do tempo em que Governantes tinham Filósofos como conselheiros.
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