O Ministério Público do Trabalho (MPT) investiga suspeita de assédio eleitoral praticado em evento realizado no pátio da empresa Líder Interiores, nesta quarta-feira (19/10), em Carmo do Cajuru, no Centro-Oeste de Minas. A notícia de fato foi instaurada a partir de denúncia registrada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) do município.
O presidente da legenda, o vereador Anthony Rabelo, denunciou o caso antes do horário previsto para o início do evento, após ter conhecimento do convite mobilizando empresários e colaboradores para uma palestra sobre “conscientização eleitoral”.
Na denúncia foi anexado um áudio do governador Romeu Zema (Novo) que teria sido encaminhado ao dono da empresa, além de um vídeo do prefeito da cidade Edson Vilela (PSB) pedindo votos abertamente ao candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL).
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Na gravação de três minutos e 27 segundos, Zema parabeniza a empresa pelo evento, dando a entender que já foram realizados outros, crítica o governo PT e incentiva a “trabalhar” para manter o atual mandatário no cargo. “Temos que trabalhar para que aquilo que deu certo continue lá em Brasília”, afirma em um trecho.
O governador inicia o áudio destacando o envolvimento da empresa.
“Aurélio, boa tarde. Gostaria muito de estar aí com vocês no evento que eu já tive a oportunidade de participar no passado. Fico satisfeito de você e todo mundo aí da Líder de Carmo do Cajuru de estarem envolvidos, em um momento tão importante, que é o momento que vai fazer uma diferença muito grande na nossa vida”, afirmou.
Em seguida, Zema faz críticas ao governo PT no mandato do ex-governador Fernando Pimentel.
“Sempre saliento que o governo PT, em Minas Gerais, foi lastimável, trágico. Quem tem filho em escola estadual sabe como era a merenda no governo PT e como ela melhorou nestes últimos quatro anos. Quem é funcionário público sabe que o governo PT também não pagava salário em dia, parcelava o 13º salário em 10 meses, não dava assistência médica aos funcionários públicos. Tudo isso foi corrigido com trabalho e seriedade. Então, nós temos que continuar com essa seriedade em Minas. Fomos eleitos e agradeço a todos que acreditaram em nossas propostas. Temos que trabalhar para que aquilo que deu certo continue lá em Brasília”, salientou.
A reportagem entrou em contato com a assessoria de Romeu Zema e aguarda o posicionamento.
O convite
O convite para o evento no pátio da empresa foi compartilhado por meio de aplicativo de conversa. Ele também anuncia a presença do senador e deputado estadual eleitos, os irmãos Cleitinho Azevedo e Eduardo Azevedo, respectivamente, ambos do PSC.
No convite, assinado pelo Movimento Brasil Acima de Tudo, é informado ainda que o ato é direcionado principalmente para os indecisos e aqueles que estão pensando em votar branco ou nulo.
Vídeos compartilhados nas redes sociais mostram a área de produção da empresa vazia durante o horário do evento, por volta das 14h.
Cleitinho não participou. Já o irmão dele, que também é vereador em Divinópolis, esteve no local, onde foi um dos palestrantes. Nas redes sociais, chegou a compartilhar: “Hoje vamos falar a verdade para centenas de colaboradores na empresa Líder”. Na mesma postagem diz: “Não iremos descansar até o último segundo dessa batalha”.
Eduardo Azevedo disse ter participado a convite da direção da empresa para manifestar o “posicionamento político” dele “no segundo turno das eleições”.
“Falei exatamente quem eu apoio e todo mundo já sabe muito bem, a favor do presidente Bolsonaro. E foi só isso. Um posicionamento político que eles me pediram para dar dentro da empresa. Essa questão aí de assédio, isso é conversa fiada”, afirma.
Ele nega qualquer tipo de coação. “Inclusive não estavam todos os funcionários. A empresa não obrigou a irem até o momento da palestra. A empresa deixou livre. Foi quem quis. Se fosse uma forma de assédio a empresa teria coagido os funcionários a comparecer”, argumenta.
Promoção de eventos
A Justiça Eleitoral também recebeu denúncia via aplicativo protocolada pelo PT. Um oficial de justiça esteve no local para fiscalizar com base no artigo 30 da resolução 23.607/2019 que trata sobre a “promoção de eventos”.
De acordo com o Cartório Eleitoral, o oficial, até o início da tarde desta quinta-feira (20/10), não havia concluído o relatório. O juiz responsável aguarda o documento para poder se manifestar.
O evento foi suspenso pelos organizadores por recomendação do setor jurídico da empresa. O Cartório Eleitoral informou que não determinou a suspensão, já que se tratava apenas de uma fiscalização, prática rotineira a partir do recebimento de denúncias.
O ato que contava com centenas de funcionários, uniformizados, foi interrompido antes da veiculação do vídeo encaminhado pelo prefeito de Carmo do Cajuru.
O prefeito Edson Vilela não participou do evento, pois estava em São Paulo onde ministraria palestra sobre o projeto Cidades Inteligentes.
No vídeo, que tem a foto e o número de urna de Bolsonaro, Vilela cumprimenta o senador eleito Cleitinho e menciona o governador Romeu Zema, dizendo não ter certeza sobre a presença dele. Em quase quatro minutos, diz levar uma “mensagem” e cita o candidato à reeleição.
“Já falei em outras oportunidades, eu não sou fã de carteirinha do Bolsonaro, pode ter certeza que eu concordo com muitas coisas que ele faz, mas também discordo de outras coisas. Mas o que o nosso país está passando hoje, é necessário que a gente dê continuidade, neste ritmo, neste trabalho que está acontecendo”, afirma.
Depois, pede voto aos presentes e cita nomes de outros políticos.
“Gostaria de pedir, encarecidamente, a cada um de vocês que agora, dia 30, depositem esse voto de confiança no 22, no Bolsonaro. Pode ter certeza que o Cleitinho que está aí, que é senador e tantos outros deputados, deputado Domingos Sávio, que é do PL, que foi reeleito, estará, sim, fazendo essa base para que nosso município não perca esse caminho de desenvolvimento”, pede.
Edson Vilela, que no primeiro turno manteve-se neutro, confirmou ter gravado o vídeo a pedido de pessoas da empresa. Afirmou que tratou-se apenas de um “posicionamento” e que não tem “poder de obrigar” ninguém a votar.
“Não estou sugestionando a ponto de falar em obrigar as pessoas a votarem. Estou colocando um posicionamento meu, pessoal e o que eu já passei em relação a situação com o ex-governador Fernando Pimentel. Acho que não tenho esse poder de obrigar as pessoas a votarem, mas eu posso passar o que vivi. Isso é a coisa mais normal”, argumenta.
Assédio eleitoral
Para o presidente do PT em Carmo do Cajuru, o vereador Anthony Rabelo, os vídeos e depoimentos de colaboradores comprovam que o evento tinha o intuito de manipular os funcionário. “Um ato de assédio moral grave, latente, evidente que a empresa está tentando manipular, assim como outros empresários, forçá-los a votarem no candidato Jair Bolsonaro”, enfatiza. Ele ainda diz haver depoimentos de colaboradores de coação em horário de serviço.
“Estão tentando coagir com discurso do tipo, se o Lula ganhar vai haver demissão, redução de salário. Várias testemunhas nos relataram de momentos que aconteceram dentro da empresa. O intuito da reunião de ontem era justamente para isso, mas felizmente a justiça agiu a tempo e coibiu que mais um caso de assédio ocorresse”, relata.
A Lider Interiores enviou nota ao Estado de Minas afirmando que apenas cedeu a quadra esportiva nas dependências da empresa para o Movimento Brasil Acima de Tudo (MBAT), que fez a solicitação de uso do espaço. Segundo a nota, o espaço foi aberto à comunidade e "foi franqueada a participação da população civil em geral, incluindo funcionários da companhia e de outras empresas, caso interessados em acompanhar citado evento". A participação dos funcionários da empresa, assim como de toda a população, prossegue a nota, "ocorreu voluntariamente, sem ingerência ou manifestação de qualquer diretor da empresa."
Veja a íntegra da nota da Lider Interiores
A Lider Interiores esclarece que a reunião dodia 19 de outubro, nas dependências de quadra esportiva mantida pela Companhia paraatividades sociais, ocorreu por cessão do espaço físico e por solicitação exclusiva do Movimento Brasil Acima de Tudo (MBAT), sendo aberta à toda comunidade da cidade de Carmo do Cajuru. Sendo tal espaço aberto à comunidade, foi franqueada a participação da população civil emgeral, incluindo funcionários da Companhia e de outras empresas, caso interessados emacompanhar citado evento. A participação dos funcionários da Companhia, assim como detoda a população, ocorreu voluntariamente, sem ingerência ou manifestação de qualquerdiretor da Empresa.Ademais, o departamento jurídico já foi acionado para tomar as medidas cabíveis frente aveiculação e disseminação de eventuais “Fake News”. A Companhia manifesta repúdio a qualquer ato que viole liberdades individuais e o direitode escolha de qualquer cidadão, reforçando o compromisso e respeito com seuscolaboradores, clientes e com a comunidade, bem como o zelo por sua história.
Atenciosamente, Lider Interiores
*Amanda Quintiliano especial para o EM
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