Uma vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na eleição presidencial de 2022 parecia "inevitável", mas não é mais possível dizer isso depois dos resultados eleitorais deste primeiro turno, avalia o brasilianista Brian Winter, editor-chefe da revista Americas Quarterly.
"Ainda acredito que uma vitória de Lula parece provável, mas inevitável? De jeito nenhum", diz Winter, em entrevista à BBC News Brasil.
Ex-correspondente da agência Reuters e especializado em América Latina há mais de 20 anos, Winter viveu no Brasil entre 2010 e 2015, voltando ao país regularmente. Ele acompanhou os resultados deste domingo (2/10) a partir de Nova York.
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"Fiquei muito surpreso", diz Winter. "Cheguei a dizer publicamente que era importante manter um ceticismo em relação às pesquisas eleitorais, mas não esperava um resultado tão apertado."
Na véspera do primeiro turno, as pesquisas Datafolha e Ipec mostravam ambas uma distância de 14 pontos percentuais entre Lula e Bolsonaro. Com mais de 99%% das urnas apuradas, a distância entre os dois candidatos era de pouco menos de 5 pontos percentuais, com Bolsonaro superando os 40% de votos, o que também não havia sido previsto pelos principais institutos de pesquisa.
'Segundo turno competitivo é surpresa'
"Não é uma surpresa que teremos segundo turno, mas é uma surpresa que será um segundo turno competitivo", diz Winter.
Segundo ele, as pesquisas sugeriam que a vitória de Lula era apenas uma questão de tempo. Mas o que ficou claro é que os levantamentos não são precisos, então não é possível saber o que vai acontecer.
"Está claro que o Brasil, assim como os Estados Unidos, tem um eleitor conservador que não aparece de forma adequada nas pesquisas. Como na Itália, Suécia, Estados Unidos e Reino Unido, há uma população conservadora muito energizada que a mídia e outros consistentemente subestimam."
Nos EUA, em 2020, lembra ele, as pesquisas eleitorais davam ao democrata Joe Biden uma vantagem muito mais ampla sobre Donald Trump do que mostrou o resultado nas urnas.
"Essa sensação de sentar em frente à TV, observar a divulgação de resultados e ficar surpreso com o número de votos conservadores é um déjà vu que passamos dez vezes ao longo dos últimos seis anos, desde a eleição de Trump [em 2016]", diz Winter.
Eleitores relutantes em dizer a verdade sobre seu voto
"Por alguma razão, nós repetidamente nos esquecemos de que as pesquisas eleitorais não são precisas", diz o brasilianista.
Segundo ele, nos EUA, isso parece estar relacionado à mudança na forma de comunicação das pessoas, com a revolução causada pelos smartphones. Mas também é fruto de eleitores conservadores que pensam que o sistema está contra eles e, por conta disso, são relutantes em dizer a verdade sobre em quem vão votar.
Para Winter, no Brasil, o erro das pesquisas pode também estar relacionado com a falta de um Censo desde 2010. Segundo ele, talvez por isso o voto evangélico tenha sido subestimado, já que não se sabe atualmente com precisão qual é o tamanho dessa parcela dos eleitores no país.
Diante da forte votação de candidatos conservadores para a Câmara de Deputados, Senado e governo dos Estados, o analista avalia que um eventual governo Lula enfrentará uma situação muito mais desafiadora do que em 2003, quando o petista assumiu a Presidência do país pela primeira vez.
"O Brasil é um país mais conservador do que era há 20 anos, quando Lula foi presidente pela primeira vez. É impossível contestar isso agora, então acredito que continuaremos a ter um Brasil muito polarizado e dividido", afirma.
Com resultados tão favoráveis a Bolsonaro, Winter avalia que a probabilidade de contestação dos resultados, caso ele venha a perder em segundo turno, se torna relevante novamente.
"Não prestarei atenção às pesquisas no segundo turno", diz Winter. "Acabou para mim."
De Nova York, Winter diz que ficará de olho nas campanhas e aguardará os resultados do dia 30.
"Qual é o instituto de pesquisa confiável para o qual podemos nos voltar agora? Eu não vejo nenhum, depois do que aconteceu hoje. Sei que essas são palavras fortes, mas basta ver as últimas pesquisas antes das eleições."
O analista ressalta que não acredita na teoria da conspiração bolsonarista de que há uma combinação dos institutos de pesquisa para "alimentar narrativas".
"Não acredito nisso nem um pouco. Mas acredito que, assim como em outros países, incluindo os EUA, algo está errado com as pesquisas atualmente."
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